Fungibilidade dos remédios jurídicos de defesa da liberdade individual de locomoção

Publicado por: redação
24/10/2014 01:05 AM
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Como é de sabença geral, a Constituição da República Federativa do Brasil garante a todas as pessoas o direito de obter da Justiça remédio jurídico para proteção da liberdade ambulatória violada ou ameaçada de violação.

Consequentemente, a transgressão dos direitos imprescindíveis ao cidadão acusado, denunciado ou réu, no transcurso da investigação policial ou instrução processual, ou mesmo fora delas, faz surgir a medida jurídica própria para fazer cessar qualquer tipo de restrição à liberdade de locomoção.
Nesse diapasão, a nossa Magna Carta, demonstrando grande preocupação com as prisões ilegais, injustas ou desnecessárias, sem embargo do direito de petição previsto no art. 5º, inciso XXXIV, alínea a, prevê um sistema de garantias fundamentais, elencando diversas medidas jurídicas no intuito de proteger o exercício dos direitos individuais.
Dentre os instrumentos jurídicos colocados à disposição dos indivíduos para a defesa da liberdade de locomoção, podemos destacar, nos termos do artigo 5º da Constituição Federal, os pedidos de habeas corpus (inciso LXVIII), relaxamento de prisão em flagrante (inciso LXV), liberdade provisória com ou sem fiança (inciso LXVI) e revogação de prisão preventiva e temporária, sendo o habeas corpus o mais importante e fundamental no âmbito do Direito pátrio.
Assim, quando precisamos elaborar uma petição na esfera criminal, para que nosso cliente (injustiçado, investigado, indiciado, acusado ou réu) se mantenha livre da prisão ou possa responder ao processo em liberdade, temos à nossa disposição, como já explicitado, os remédios jurídicos susomencionados a serem endereçados ao Juízo competente, cuja escolha vai depender da análise do caso concreto apresentado.
Com efeito, em decorrência da regularidade formal do processo, cada instrumento de defesa da liberdade individual de locomoção tem função e requisitos próprios, segundo a espécie de prisão impugnada, devendo ser utilizado de forma correta e adequada.
Entretanto, considerando que “a regra é a liberdade e a privação da liberdade é a exceção à regra”, a utilização despropositada de um remédio jurídico no lugar do outro, em prol de quem está sofrendo ou na iminência de sofrer violação no seu direito de ir e vir, não pode encontrar estorvo por parte do Poder Judiciário, devendo lançar mão da fungibilidade em respeito ao direito ambulatorial do indivíduo.
O princípio da fungibilidade, em verdade, consiste na ideia segundo a qual a interposição de um recurso por outro não o prejudica, salvo ocorrência de erro grosseiro, má-fé ou impossibilidade jurídica.
No entanto, não obstante a legislação adjetiva penal (art. 579, CPP) e a doutrina processualista tradicional tratarem da fungibilidade apenas em relação à matéria recursal, não vislumbramos óbice algum que impeça a aplicação deste princípio aos remédios jurídicos referenciados, haja vista tratar-se de garantias individuais que dispensam maior rigorismo formal, com ênfase aos princípios da instrumentalidade das formas, economia e celeridade processuais, assegurando-se a efetividade da tutela jurisdicional solicitada.
É óbvio que a regularidade formal, como regra, não pode ser desprezada a ponto de permitir o ajuizamento proposital de um instrumento jurídico completamente impertinente, existindo previsão legal expressa do adequado. Logo, havendo má-fé ou erro grosseiro na utilização do remédio jurídico destinado a proteger a liberdade ambulatorial, não se cogitará da aplicação do princípio da fungibilidade aos casos vertentes.
Não seria recomendável, por exemplo, substituir o habeas corpus pelo mandado de segurança, ou por qualquer dos pedidos supracitados, e vice-versa, já que possuem especificidade e requisitos próprios. Ademais, enquanto o habeas corpus constitui verdadeira ação penal popular que pode ser impetrada por qualquer pessoa, o mandado de segurança e os pedidos retromencionados são instrumentos jurídicos de utilização exclusiva do advogado.
Já em relação, especificamente, aos pedidos de relaxamento de prisão em flagrante, liberdade provisória e revogação de prisão preventiva, a substituição de um pelo outro não traria maiores dificuldades de ordem processual.
Em qualquer das hipóteses, contudo, o reconhecimento ou não da fungibilidade será aferido pelo magistrado competente em juízo de prelibação, realizado no caso concreto, priorizando sempre que possível o exercício dos direitos individuais, em homenagem ao sagrado direito à liberdade de locomoção do ser humano.
Na verdade, o tema envolvendo os instrumentos de defesa da liberdade ambulatorial deve ser tratado de forma mais profunda e individualizada, assim como exposto em nosso Vade-Mécum dos remédios jurídicos de defesa da liberdade individual de locomoção.
JOAQUIM DE CAMPOS MARTINS
é Advogado, graduado em Direito pela Universidade Brasília (UNB); Pós-Graduado pela Escola da Magistratura do Distrito Federal. Autor dos livros: “Manual da legislação específica do TJDFT”; “Vade-Mécum dos remédios jurídicos de defesa da liberdade individual de locomoção”, e de artigos jurídicos publicados em jornais, revistas e informativos especializados.

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