O STF e o esperado julgamento da desaposentação

Publicado por: redação
28/10/2014 03:31 AM
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A análise do sistema previdenciário brasileiro deve passar, aprioristicamente, por seu axiológico fim, quer seja, adequar a planejada e constitucional essência eminentemente protetiva a seus destinatários, razão maior da Seguridade Social. De fato, como técnica de proteção que é, a Previdência prescinde de constante instrumentalidade para sedimentar seus valores constitucionais.

Neste ínterim, valiosa é a análise ampla que se deve ter o intérprete do direito ao tão comentado instituto da Desaposentação, um verdadeiro utilitário de acesso ao pacote de proteção em sua plenitude, sobretudo para tentar galgar melhores condições de vida.

Em lição conceitual esclarecedora, destacamos na obra “Desaposentação – Aspectos teóricos e práticos” sobre o instituto em comento:

“Urge ainda mencionar que a Desaposentação visa autenticamente o aprimoramento e concretização da proteção individual, não tendo o condão de afetar qualquer preceito constitucional, pois, jamais deve ser utilizada para a desvantagem econômica de quem quer que seja. Também é fato, que, por meio da Desaposentação, o indivíduo, diante de realidades sociais e econômicas divergentes, almeja em si, tentar superar as dificuldades encontradas, pugnando pela busca incessante por uma condição de vida mais digna”. (AGOSTINHO, Theodoro Vicente/ SALVADOR, Sérgio Henrique. Desaposentação – Aspectos Teóricos e Práticos. 1ª Ed. São Paulo: Ltr, 2012. pg.38/39.)

Logo, desde já, fácil aferir que o instituto visa uma renúncia vinculada, ou seja, um ato jurídico de desfazimento do benefício existente, para somá-lo as novas contribuições pós-inatividade e constituir uma nova prestação previdenciária.

De outro giro, sabido que a Desaposentação detém tormentosa discussão jurídica acerca de sua aceitação. Neste aspecto, discute-se amplamente o nevrálgico aspecto da devolução ou não do benefício a ser desfeito. E mais, toda a ótica processual de sua proclamação, de igual forma, demanda imenso debate a respeito.

A Corte Suprema, como derradeira instância jurisdicional, ante a atual análise que se faz no cenário jurídico vigente desse instituto, já se prepara para abordar o assunto, gerando em todo o contexto previdenciário uma especial expectativa.

Não obstante a tão esperada análise pelo Tribunal Constitucional, o fato incontroverso é que seu pronunciamento certamente afetará uma grande massa de aposentados que continuam inseridos no mercado formal de trabalho, vertendo contribuições ao Sistema, abrigados assim, por uma proteção previdenciária que a Desaposentação procura justificar e instrumentalizar.

Curioso, que recentemente houve a notícia de que o Governo alocou uma reserva financeira para suprir eventual decisão favorável aos aposentados pelo Excelso Tribunal. A expectativa e as projeções da Sociedade são diversas acerca da problemática, o que acaba por traduzir a importância do assunto e sua notável característica de alto relevo jurídico.

Neste ínterim, o Jornal Gazeta do Povo, em sua edição digital, traz uma advertência econômica acerca do esperado posicionamento do tema perante a Suprema Corte,

“Hoje, conforme dados do governo, aproximadamente 500 mil aposentados continuam trabalhando e contribuindo com a Previdência Social. Se todos pedirem para ter os benefícios recalculados, os custos para o financiamento do regime previdenciário aumentarão em R$ 2,7 bilhões por ano. Mas esse impacto será maior, argumentam técnicos do governo, porque a decisão servirá de estímulo para todo contribuinte. O trabalhador se aposentará por tempo de serviço e terá uma renda garantida. Como ainda não estará em idade avançada, continuará trabalhando e contribuindo com a Previdência. E como o fator previdenciário, usado para o cálculo do benefício, eleva o valor do benefício quanto maior for o tempo de contribuição e a idade do beneficiário, esse terá direito anualmente a uma aposentadoria maior”. (http://www.gazetadopovo.com.br/economia/conteudo.phtml?tl=1&id=1047694&tit=STF-comeca-a-julgar-possibilidade-de-desaposentacao - 17/09/2010)

Portanto, com a pretensão de exaurir a análise da Desaposentação e seus vários efeitos, a Corte Suprema há de lançar sua posição a respeito, que, certamente, será um norte jurídico para a consolidação ou não do instituto. Em setembro de 2010, o Colendo Tribunal iniciou este aguardado debate constitucional, onde, o Ministro Relator do caso concreto se posicionou francamente favorável a sua possibilidade jurídica.

Neste caso específico levado a Corte Suprema, a discussão se iniciou com uma decisão contrária à possibilidade da Desaposentação, tanto na instância primária quanto no Regional Federal. De lá, o processo subiu para o STF. Como central fundamento, a contribuinte contesta a constitucionalidade do trecho da lei que determina que "o aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ela retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade".

Assim, neste caso concreto, no RE: 381367/RS que tem como relator o Min. Marco Aurélio, em 16.09.2010, a casa maior da Justiça Brasileira iniciou o necessário debate sobre a Desaposentação, valendo conferir, em nota comentada, o conteúdo do voto favorável,

“Desaposentação” e Benefícios Previdenciários – 1 O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se questiona a constitucionalidade do art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91 (“§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social - RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado.”). No caso, aposentada pelo RGPS que retornou à atividade pleiteia novo cálculo de proventos, consideradas as contribuições de período referente a esse regresso. Alega que o mencionado dispositivo legal estaria em confronto com o art. 201, § 11, da CF (“§ 11. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.”), haja vista que, mesmo contribuindo como segurada obrigatória na qualidade de empregada, teria direito apenas às prestações de salário-família e de reabilitação profissional. O Min. Marco Aurélio, relator, proveu o recurso. Consignou, de início, a premissa segundo a qual o trabalhador aposentado, ao voltar à atividade, seria segurado obrigatório e estaria compelido por lei a contribuir para o custeio da seguridade social. Salientou, no ponto, que o sistema constitucional em vigor viabilizaria o retorno do prestador de serviço aposentado à atividade. Em seguida, ao aduzir que a previdência social estaria organizada sob o ângulo contributivo e com filiação obrigatória (CF, art. 201, caput), assentou a constitucionalidade do § 3º do art. 11 da Lei 8.213/91, com a redação conferida pelo art. 3º da Lei 9.032/95 (“§ 3º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata a Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, para fins de custeio da Seguridade Social.”). Assinalou que essa disposição extinguira o denominado pecúlio, o qual possibilitava a devolução das contribuições implementadas após a aposentadoria. Enfatizou que o segurado teria em patrimônio o direito à satisfação da aposentadoria tal como calculada no ato de jubilação e, ao retornar ao trabalho, voltaria a estar filiado e a contribuir sem que pudesse cogitar de restrição sob o ângulo de benefícios. Reputou, dessa forma, que não se coadunaria com o disposto no art. 201 da CF a limitação do § 2º do art. 18 da Lei 8.213/91 que, em última análise, implicaria desequilíbrio na equação ditada pela Constituição. Realçou que uma coisa seria concluir-se pela inexistência da dupla aposentadoria. Outra seria proclamar-se, conforme se verifica no preceito impugnado, que, mesmo havendo a contribuição — como se fosse primeiro vínculo com a previdência —, o fenômeno apenas acarretaria o direito ao salário-família e à reabilitação profissional. Reiterou que, além de o texto do examinado dispositivo ensejar restrição ao que estabelecido na Constituição, abalaria a feição sinalagmática e comutativa decorrente da contribuição obrigatória. Em arremate, afirmou que ao trabalhador que, aposentado, retorna à atividade caberia o ônus alusivo à contribuição, devendo-se a ele a contrapartida, os benefícios próprios, mais precisamente a consideração das novas contribuições para, voltando ao ócio com dignidade, calcular-se, ante o retorno e as novas contribuições e presentes os requisitos legais, o valor a que tem jus sob o ângulo da aposentadoria. Registrou, por fim, que essa conclusão não resultaria na necessidade de se declarar a inconstitucionalidade do § 2º do art. 18 da Lei 8.213/91, mas de lhe emprestar alcance consentâneo com a Constituição, ou seja, no sentido de afastar a duplicidade de beneficio, porém não o novo cálculo de parcela previdenciária que deva ser satisfeita.” (Informativo do Supremo Tribunal Federal de 09/2010)

Por assim já se manifestar a respeito, o Supremo Tribunal, em voto do próprio Relator do caso em exame, dá amostras de que seguirá o posicionamento que faz o Superior Tribunal de Justiça sobre o instituto, onde, em reiterados julgados, aceita plenamente a viabilidade da Desaposentação. Entretanto, tal aferição há de ser vista com extrema cautela, considerando um certo lado conservador e pró-governista que caracteriza do Sodalício Supremo em sua atual composição, ante o questionado princípio da governabilidade.

Questão necessária a trazer reflexão é que o voto do Relator não exauriu, como se esperava, a problemática da restituição ou não dos valores antes auferidos pelo inativo, no período precedente ao pleito da Desaposentação, o que, certamente, propiciará uma discussão mais calorosa e ponderada do assunto, esticando, no tempo, a tão esperada resposta do Tribunal da Pacificação Social.

Entende-se que este voto condutor do Relator que aferiu tão somente a validade do instituto não o condicionou a devolução das quantias recebidas do pretérito benefício, presumindo-se assim de observância obrigatória para a convalidação da Desaposentação.

Por certo, que a questão na Excelsa Corte ainda não restou definitivamente decidida, já que apesar de ocorrido a devolução dos autos pelo Ministro Toffoli, até a presente data não colocada em discussão no plenário.

Entretanto, em recente pronunciamento advindo deste debate constitucional, profunda novidade permeia a discussão no Guardião Constitucional, em outro inconformismo extraordinário, o de número: RE 661256.

Ocorreu que, recentemente a Corte Nacional conferiu repercussão geral ao assunto, nos moldes do artigo 543-A do CPC, dada a envergadura do instituto em toda a ordem jurídica.

Tal reconhecimento, confirma a notória importância que reveste o instituto, devendo assim ser aferido de forma harmônica dentro de todo o sistema jurídico, já que se vê pautado na discussão do Tribunal Maior.

Assim, a divulgação pelo próprio domínio eletrônico do Excelso Tribunal (http://www.stf.jus.br/portal/geralverimressão.asp – 09.12.2011).

Evidente, que a atual formação do Excelso Tribunal, implica no reconhecimento do princípio da governabilidade, cujo Pode Executivo dita as regras do Ministério da Previdência Social e tem, diariamente, de maneira ferrenha, negado qualquer possibilidade da Desaposentação.

Entretanto, espera-se que o Sodalício Constitucional confira a esperada pacificação jurídica no trato desta quaestio, compreendendo que não há nenhuma contradição da convalidação do instituto com ditames constitucionais, aliás, totalmente harmônicos, como bem frisou o voto do eminente Ministro Relator.

O otimismo deve reinar, sobretudo pela esperança de que o Guardião Constitucional há de, mais uma vez, demonstrar o seu papel, viabilizando um instituto jurídico que nada mais almeja senão convalidar diversos preceitos constitucionais, dentre eles, a própria Previdência Social enquanto técnica protetiva.

Ora, a permanência do aposentado em regular e lícito mercado de trabalho formalizado, evidente que o conduz a condição jurídica de segurado do sistema previdenciário.

Esta a ótica e o ápice maior da discussão.

De fato, como não estender direitos e o plano de proteção previdenciária, para aquele que continua juridicamente tutelado!!!

Ademais, as contribuições vertidas devem repercutir no plano de previdência!!!

Logo, como proteger, sem aplicar? Evidente, que esta deve ser a discussão reinante, reafirmando, ainda mais, que inexiste qualquer fundamento razoável para ordenar a restituição, tendo em vista que não pode o pronunciamento estatal através do comando sentencial ser impraticável quanto a atividade jurisdicional entregue pelo Estado, pois, como reconhecer o direito e ao mesmo tempo, inviabilizar a sua concretização!

Oportuno, de novo, ressaltar que os Tribunais Superiores, endossando o á consagrado posicionamento do Tribunal da Cidadania, continuam entendendo que nada há a restituir, senão vejamos:

“PREVIDENCIÁRIO. RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO DE VALORES RECEBIDOS A MAIOR A TÍTULO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ. Consoante orientação jurisprudencial desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça, os valores pagos indevidamente a título de benefício previdenciário não são passíveis de restituição, quando recebidos pelo segurado de boa-fé, mormente na hipótese de erro administrativo”. (TRF da 4ª Região, Proc. 5005922-09.2011.404.7208-SC, 5ª T., Rel.: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, j. em 05/02/2013, D.E. 06/02/2013).

Assim, que essa tão esperada discussão constitucional traga os esperados frutos para o bem-estar dos sujeitos protegidos do constitucional planejamento, cuja tutela jurisdicional previdenciária presta efetiva contribuição.

Theodoro Vicente Agostinho é mestre em Direito Previdenciário pela PUC de São Paulo, coordenador e professor dos cursos de pós-graduação em Direito Previdenciário do Complexo Jurídico Damásio de Jesus, escritor pelas Editoras Conceito, LTr e RT

Sérgio Henrique Salvador é Especialista em Direito Previdenciário pela Escola Paulista de Direito (EPD), professor do Instituto Brasileiro de Estudos Previdenciários (IBEP).

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