O Direito do Trabalho e a tragédia em Mariana

Publicado por: redação
11/12/2015 07:28 AM
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As últimas semanas foram de choque para população brasileira, que se viu diante do maior desastre ambiental de nossa história. O rompimento da barragem da mineradora Samarco no município de Mariana (MG) trouxe morte, destruição, desalento e desespero para inúmeras pessoas além de ter causado um prejuízo imensurável para o meio ambiente.

Mas em que ponto a tragédia toca em questões trabalhistas?

Comecemos pelos trabalhadores que perderam suas vidas. Obviamente, suas famílias terão a receber da mineradora, além das respectivas verbas rescisórias, indenizações pela perda de seus entes queridos, e que deverão tomar por base, além da gravidade do fato (perda de uma vida), a idade, o salário e a expectativa de vida de cada um dos mortos. E não se trata aqui de perquirir se houve dolo ou culpa por parte da mineradora no desastre. Trata-se, por óbvio, de responsabilização objetiva, pois quem criou o risco da tragédia foi a própria mineradora com a construção da barragem e, portanto, deve arcar com os danos causados pelo acidente independentemente de culpa.

Já quanto aos habitantes locais atingidos, que trabalham para diversos empregadores (alguns também atingidos pelo desastre), surgirão algumas questões.

Pensemos inicialmente na hipótese de um morador que perdeu tudo o que possuía e que trabalhava em local mais distante, não atingido pela tragédia. Nesse caso, seu trabalho continua, seu posto na empresa está no seu aguardo e suas funções precisam ser desenvolvidas. Contudo, sua situação não lhe permite ir ao trabalho, na medida em que precisa dar continuidade ao restabelecimento de sua dignidade como um todo, conseguindo novos documentos, estabelecendo-se em algum local fixo, tentando conseguir o que vestir e até mesmo, enterrando parentes ou amigos. A ausência desse cidadão de seu trabalho naturalmente não se configurará como ‘abandono de emprego’, mas, por outro lado, não lhe será devido o pagamento pelos dias em que faltar. Portanto, a menos que esse cidadão tenha tido problemas de saúde, justificando sua ausência ao trabalho por essa razão, o período não trabalhado não será remunerado, o que agrava ainda mais a situação já desesperadora. Obviamente, o valor que o empregado deixar de perceber em razão dessa circunstância deverá ser alvo de cobrança da mineradora que deu causa ao fato, ainda que na seara cível.

Vejamos agora a hipótese em que o empregado não foi atingido, mas o empregador sim (fosse ele um pequeno bar, uma casa de família, creche etc.). O empregado não tem mais como trabalhar, já que o local de trabalho foi destruído.

A rigor, o empregador deverá efetuar ao empregado o pagamento das veras rescisórias como na dispensa sem justa causa. Vale dizer que nesse caso a mineradora não possui legitimidade para figurar como ré em eventual reclamação trabalhista ou mesmo ação de cobrança por parte do empregado que perdeu seu emprego. Ou seja, o empregado deverá receber do empregador seus valores rescisórios que, por sua vez, deverá se voltar contra a Samarco para ser ressarcido.

Ainda existe a possibilidade em que ambos, empregado e empregador, tenham sido atingidos pelo desastre. Nesse caso, tal como no parágrafo anterior, recairá sobre o empregador a incumbência de pagar as verbas rescisórias como em uma dispensa imotivada, restando a este último o ressarcimento dessa quantia por parte da Samarco.

Para que fosse possível acesso imediato dos atingidos às suas contas de FGTS, em 13/11/2015, foi publicado o polêmico Decreto 8.572/15, que alterou o Decreto 5.113/04, equiparando aos desastres naturais, aqueles decorrentes do rompimento ou colapso de barragens que ocasionem movimento de massa, com danos a unidades residenciais. Isso possibilita que os atingidos nesse desastre possam efetuar o levantamento de suas respectivas verbas fundiárias. As críticas vieram porque, ao equiparar o rompimento de barragens a desastre natural, há receio de que a mineradora se utilize disso para atenuar sua responsabilidade no evento. De toda forma, aqueles que por ventura venham a se valer de seus recursos fundiários deverão também requerer o ressarcimento desses valores junto à mineradora.

Fato é que o Estado tem demorado para tomar providências. Possibilitar acesso ao FGTS é quase nada, levando-se em consideração a urgência e a gravidade da situação. É claro que os empregadores atingidos não terão condições de, em curto prazo, efetuar os pagamentos rescisórios aos funcionários (como mencionado acima, falamos de empregadores domésticos, pequenos bares, creches etc.). Há de se agir rápido com um plano de contingência eficaz que permita acesso a recursos mínimos que contemplem, ao menos, a possibilidade de pagamento das verbas rescisórias aos empregados e que possibilitem aos empregadores a possibilidade de sobreviverem dignamente até que consigam se restabelecer.

Daniel de Castro Magalhães - Mestre em Direito do Trabalho pela Universidade de Roma II – Tor Vergata, Coordenador da área trabalhista do Escritório Portugal Murad – Direito de Negócios (LEXNET Belo Horizonte)

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