Supremo adia decisão sobre terceirização para atividade-fim

Publicado por: redação
09/11/2016 11:21 PM
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O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou a decisão sobre o futuro da terceirização nas relações trabalhistas. Estava na pauta da Corte Superior desta quarta (09) o julgamento que possibilitaria que a terceirização seja estendida para toda e qualquer atividade desenvolvida pelas empresas do setor privado. Hoje, a terceirização não é admitida nas atividades-fim das empresas. Porém, a sessão do STF foi encerrada sem que os ministros apreciassem o caso. Ainda não foi marcada uma nova data para a retomada do julgamento.
advogado Roberto Caldas, especialista em Direito do Trabalho e sócio do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, estava no Supremo e acredita que o adiamento ocorreu “por conta da falta de tempo em uma sessão que estava sendo disputada como uma solenidade de homenagem ao ex-presidente da Corte, Cezar Peluso, que tomou metade da sessão. Além disso, o plenário não estava completo, estava com o quórum mínimo”.
Roberto Caldas também esclareceu que “o adiamento é importante tendo em vista que outro processo a tratar do tema relacionado à terceirização nas atividades-fim, a saber, a ADPF nº 324/DF, não seria julgada em conjunto com o Recurso Extraordinário nº 958.252/MG, que estava pautado para hoje. Sempre que existem matérias iguais e processos idem devem ser reunidos e julgados em conjunto, pois isto amplia a importância dos atores sociais que vão estabelecer o debate. Essa, sem dúvidas, foi uma razão muito importante”.
Ontem, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), o Sindicato Nacional dos auditores fiscais do Trabalho (SINAIT), que figuram como amicus curiae, e centrais sindicais, representadas por Caldas, haviam pedido a presidente do Supremo, Cármem Lucia, o adiamento do julgamento. 
O especialista acredita que a liberação da terceirização em todas as atividades, pois poderia significar a precarização do trabalho no Brasil. “O Supremo, como guardião da Constituição e dos direitos sociais do trabalhador brasileiro, deverá preservar as bases legais e sólidas de relações de trabalho no Brasil”, avalia.
Roberto Caldas argumenta que a terceirização ilimitada afigura-se contrária aos princípios da proteção ao trabalhador, da tutela da relação de emprego e da função social da empresa, previstos na Constituição Federal. “A terceirização ilimitada contraria essência de todas as leis que zelam pela proteção ao trabalhador”, defende.
doutor e mestre em Direito do Trabalho Ricardo Pereira de Freitas Guimarães entende que a discussão no Supremo tem que ter como ponto central o texto constitucional, ou seja, deve ser firmada na questão humana da sociedade e não na questão econômica da empresa. “É importante também que o STF mantenha razoável distância entre a possibilidade de terceirizar e a estabilidade dos direitos já conquistados pelos trabalhadores. Além da possibilidade de reivindicação desses mesmos direitos do efetivo tomador de serviços na cadeia produtiva”, avalia.
Regulamentação
Já na visão do advogado Danilo Pieri Pereira, especialista em Direito do Trabalho e sócio do Baraldi Mélega Advogados, a regulamentação da terceirização pelo Congresso Nacional traria uma maior segurança jurídica aos trabalhadores e às empresas. 
“A terceirização regulamentada garantiria a efetividade dos direitos trabalhistas dos empregados das empresas especializadas. A norma deve prever que a contratante não poderá usar os trabalhadores terceirizados para tarefas distintas das que estão previstas em contrato e a lei obrigará as contratadas a manterem e comprovarem que possuem condições financeiras de funcionar e realizar regularmente o pagamento de salários e outros benefícios, determinando ainda que as empresas contratantes fiscalizem de perto o cumprimento das regras previstas na CLT e se a contratada está em dia com salários, férias, vale-transporte, FGTS e outros direitos trabalhistas”, afirma.
Entenda a terceirização
1)   O que é terceirização? Como ela funciona nos setores público e privado? 
A terceirização é o processo pelo qual uma empresa deixa de desempenhar diretamente certas atividades e serviços e contrata outra empresa para fazê-lo em seu lugar. Nessa relação, a empresa contratante figura como a “tomadora de serviços” enquanto a empresa contratada é denominada “prestadora de serviços”.
Os trabalhadores utilizados pelas prestadoras de serviços no desempenho das atividades contratadas não manterão, em regra, vínculo empregatício com as tomadoras, mas sim com aquelas primeiras, de modo que são as prestadoras as responsáveis pela disponibilização e pela gestão da mão-de-obra a ser empregada nas referidas atividade. Nisso reside, exatamente, o maior atrativo da terceirização para as empresas do setor privado e para a Administração Pública que, por intermédio de tal processo, liberam-se do pagamento de uma série de obrigações trabalhistas e de encargos sociais.
Essencialmente, o processo de terceirização funciona de modo similar na iniciativa privada e no setor público. As empresas particulares e a Administração Pública contratam firmas, em tese, especializadas na prestação de determinados serviços (Por exemplo, atendimento ao público, asseio, conservação, manutenção predial, etc.) e transferem a estas o desempenho de tais atividades. A principal diferença reside no fato de que a contratação de firmas prestadoras de serviços por parte da Administração Pública, ao contrário do que ocorre no setor privado, é submetida aos procedimentos estabelecidos nos regimes federal, estadual e municipal de licitações e contratos administrativos.   
2) O que está em votação no STF? O que argumentam os dois lados?
O STF apreciará a possibilidade de que a terceirização seja estendida para toda e qualquer atividade desenvolvida pelas empresas do setor privado. Hoje, a terceirização não é admitida nas atividades-fim das empresas, à luz da jurisprudência sedimentada há muitos anos no TST.
O setor empresarial defende tal possibilidade sob os argumentos de que a contratação indiscriminada de empresas terceirizadas encontra respaldo no art. 5º, II, da Constituição e de que sua implementação implicaria redução de custos com pessoal e, assim, impactaria positivamente no nível de emprego do País. 
As entidades representativas dos trabalhadores argumentam, por sua vez, que a terceirização ilimitada afigura-se contrária aos princípios da proteção ao trabalhador, da tutela da relação de emprego e da função social da empresa, previstos nos artigos 7º, caput, inciso I, e 170 da Constituição, e que sua implementação indiscriminada ampliará, certamente, a precarização das condições de trabalho, gerando maior adoecimento ocupacional e acidentes de trabalho, conforme já vem ocorrendo, por exemplo, entre os atendentes de telemarketing e os operadores bancários, além de redução do nível salarial dos trabalhadores em geral. Também haverá diminuição da produtividade das empresas, em decorrência do maior número de afastamentos do trabalho e da alta rotatividade dos trabalhadores terceirizados. Por fim, como o trabalhador terceirizado é mais frequentemente impelido à prestação de horas extras, haverá redução do nível de emprego no País.
3) Existe alguma lei que regulamenta a terceirização no país? O que diz a Constituição?
Não existe uma norma geral a regulamentar a terceirização para todas as atividades econômicas. As únicas normas existentes a respeito do tema tratam da terceirização no trabalho temporário voltado para o atendimento de necessidades transitórias das empresas (Lei nº 6.019/1974) e na contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102/1983). 
Após julgar sucessivos casos referentes ao tema, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula nº 331 que veda a terceirização nas atividades finalísticas desempenhadas pelas empresas (Por exemplo,  o trabalho dos comandantes e comissários de bordo em uma companhia aérea ou o trabalho dos bancários em um banco), permitindo-a somente naqueles serviços que não são inerentes às atividades essenciais das empresas, as chamadas atividades-meio (Por exemplo, o serviço de limpeza em um banco ou o serviço de refeitório em uma empresa metalúrgica). 
A Constituição de 1988 não faz menção expressa à terceirização. No entanto, há em seu texto vários dispositivos que protegem o trabalhador dos efeitos prejudiciais inerentes à terceirização, tais como o art. 7º, caput e seu inciso I, que preconizam a “melhoria das condições sociais dos trabalhadores” e a “proteção do vínculo empregatício”, e o art. 170, que condiciona a atuação econômica das empresas ao cumprimento de sua função social, a envolver, necessariamente, a geração de empregos aptos a conferir aos trabalhadores condições adequadas e dignas de vida e de trabalho.      
4) Quais são os impactos sociais que a liberação total terceirização pode provocar no país?
Com a implementação indiscriminada da terceirização muitas empresas tendem a não contratar diretamente os trabalhadores necessários para o desempenho de suas atividades corriqueiras, valendo-se, ao invés disso, da contratação das firmas prestadoras de serviços que oferecerem, no mercado, os preços mais atraentes e que, consequentemente, acabarão pagando os salários mais baixos, ao mesmo tempo em que oferecerão as condições mais precárias de trabalho.
Muitos destes trabalhadores mal remunerados, pouco treinados e submetidos a condições precárias de vida e de trabalho serão indiscriminadamente designados para o desempenho de tarefas complexas, perigosas, insalubres ou penosas, o que acabará impactando, invariavelmente, no aumento do número de acidentes de trabalho e de doenças ocupacionais. 
Essa situação representará um ônus maior para a Previdência Social, que terá de arcar com uma quantidade maior de benefícios acidentários (Por exemplo, aposentadoria por invalidez e auxílio-doença acidentário) e também para o Sistema Único de Saúde.  
Além disso, a precarização das condições de vida e de trabalho ocasionadas pela terceirização refletirá negativamente na economia do País. À medida que os salários pagos aos trabalhadores terceirizados são, em geral, mais baixos, a renda média da população não será suficiente para sustentar o consumo e a produção em níveis suficientes para fomentar a atividade econômica. Por fim, a arrecadação para a Previdência Social será menor, já que a base de cálculo (salário) será reduzida.
5) O que é atividade-fim e atividade-meio?
As atividades-fim são aquelas que integram o núcleo do processo produtivo a que se dedicam as empresas. Nesse sentido, a atividade-fim de um banco seria a prestação de serviços bancários à população, enquanto a atividade-fim de uma siderúrgica seria a produção de aço para o setor industrial. 
As atividades-meio compreendem serviços que não são inerentes aos processos produtivos que caracterizam as finalidades econômicas das empresas. Por exemplo, a atividade de limpeza seria uma atividade-meio em uma indústria metalúrgica, ao passo que a manutenção do refeitório seria uma atividade-meio desempenhada no âmbito de uma transportadora de valores.  
6) Quais são os principais setores que serão afetados de imediato com a decisão do STF?
Com a eventual liberação generalizada da terceirização, todos os setores econômicos poderão contratar empresas prestadoras de serviços tanto nas atividades-fim, quanto nas atividades-meio. 
De imediato, a terceirização passaria a ser ainda mais difundida em setores nos quais ela já vem sendo utilizada há algum tempo, como, por exemplo, nas empresas de teleatendimento e nos bancos, assim como nas concessionárias públicas prestadoras de serviços, tais como as operadoras de telefonia móvel e fixa, as distribuidoras de energia elétrica, de água, de gás, entre outras. 
Com o decurso do tempo, mesmo os segmentos econômicos que não têm se valido da ampla terceirização de atividades, tais como a indústria de base, as companhias aéreas, as empresas transportadoras, entre outros, passarão a buscar empresas prestadoras de serviço para atuarem em suas atividades-fim, como já vem acontecendo em outros países, e assim ampliarem suas margens de lucro, às custas do nível salarial dos trabalhadores brasileiros.    
7) Qual a segurança jurídica que dispõe um trabalhador terceirizado?
O trabalhador terceirizado não é considerado, a princípio, empregado da empresa tomadora de seus serviços. Por essa razão, o cumprimento das obrigações trabalhistas fica a cargo da empresa prestadora de serviços terceirizados, que figura em sua carteira de trabalho como empregadora.  
Conforme a jurisprudência atual do TST, apenas se a empresa prestadora de serviços não arcar com as dívidas trabalhistas é que a empresa tomadora deverá ser chamada a honrar o passivo. Como isto quase nunca ocorre espontaneamente, o trabalhador se vê na contingência de buscar a Justiça do Trabalho para obter seus direitos, o que somente ocorrerá ou no fim do processo, quando a empresa tomadora não mais poder apresentar recursos, ou se as partes chegarem a um acordo.    
Lamentavelmente, a realidade tem demonstrado que muitas empresas prestadoras de serviços terceirizados fecham as portas sem honrar as obrigações assumidas com os trabalhadores, deixando para estes últimos o ônus de buscar, na Justiça do Trabalho, a responsabilização da empresa tomadora ou da Administração Pública pelo adimplemento de seus direitos.   
8) Como a Justiça vem enxergando a terceirização?
De modo geral, a Justiça do Trabalho vem apreciando o fenômeno da terceirização à luz da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho. Desse modo, quando as empresas tomadoras de serviços terceirizam atividades-fim, os contratos de terceirização tendem a ser anulados e há o reconhecimento de vínculo de emprego dos trabalhadores diretamente com a empresa tomadora. 
A Justiça do Trabalho só vem reconhecendo a validade da terceirização nas chamadas “atividades-meio”, assim compreendidas aquelas que não integram as atividades corriqueiras e finalísticas das empresas tomadoras de serviços, até mesmo porque há muitos casos de fraude, em que o verdadeiro empregador é a empresa tomadora de serviços. 
Fontes: Gustavo Ramos e Paulo Lemgruber, especialistas em Direito do Trabalho e sócios do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados

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