E depois das prisões?

Publicado por: redação
18/02/2018 09:25 AM
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Léo Rosa de Andrade *

No senso comum, lei é “a prescrição escrita que emana da autoridade soberana de uma dada sociedade e impõe a todos os indivíduos a obrigação de submeter-se a ela sob pena de sanções” (Houaiss).
Ainda conforme o dicionário, moral: “conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada” (Aurélio).

Seguindo, ética. Há dois conceitos distintos para ética: um, como ciência que estuda a moral: “...investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam ou orientam o comportamento humano...” (Houaiss).
Dois, ética como juízo de apreciação referente à própria conduta, ou de um grupo social a que se pertença, considerando os valores declarados. Seja: avaliação de si por si diante da tábua de valores professada.
É claro que a produção das leis decorre de grande variação de interesses comumente não confessados. E depois de produzida, no Brasil particularmente, a lei não se oferece como certeza simples ao entendimento.

Mas, de toda forma, conseguimos formar opinião crítica e medir as consequências da desobediência às normas. Todos temos noção de que o Estado pode nos alcançar e nos punir se fugimos da legalidade.
Já, diante de questões morais nos complicamos um pouco. Não percebemos a materialidade da moral, não fazemos contas sobre ela, mas valoramos os fatos a partir da moral circulante que nos alcança e constitui.
Toda moral pertence a uma coletividade; não existe moral individual. Desobediências morais não sofrem castigos estatais, mas constrangimentos advindos de famílias, grupos, ou de parcela significativa da Sociedade.
A moral é acachapante, mas não é universal. Não obstante a presença de importantes exortações e interdições valorativas em qualquer realidade social, sempre há margem para a circulação de variações morais.
A moral, todavia, não é relativa. Para um indivíduo ou grupo, a moral vigente deve viger com caráter de universalidade. Se alguém relativiza as regras de conduta que considera válidas, age com imoralidade.

Então, um problema ético: Como devo atuar diante de mim mesmo, considerando minhas medidas? Tenho licença para descumprir meus próprios valores declarados por conveniência própria ou de meu grupo?
A lei tem caráter impositivo; se a traio, o Estado me castiga. A moral me coage; se a abjuro, a Sociedade me penitencia. Eu, diante de mim mesmo, se arranjo pretextos para me por incoerente, estou aético.
Em sociedade, minha responsabilidade para comigo extrapola de mim, pois meus atos têm efeito para fora de meu foro. No Brasil, parece, relaxamos a consistência moral e nos permitimos uma postura ética flexível.
Estamos em flagrante corrupção. Havidas mais ou menos contrafações no passado, jamais se explicitaram tantas práticas corruptas como hoje. Quanto à agressão à lei e à moralidade pública, todos estão acordes.
Entretanto, interesseiros desonestos fazem ginástica ética para se justificar e justificar seus corruptos prediletos. Alargam as margens de manobra para aprovar os seus, a ponto de traírem-se inteiramente.

Kant jamais teria sucesso em nos pedir observação ao seu imperativo categórico: “Age sempre de acordo com uma máxima tal que possas querer ao mesmo tempo que se converta em lei universal”. Não somos assim.
Preferimos política de afetos. Criamos uma moral permissiva conduzida por uma ética de compadrio. Somos relativos: a lei vale para o meu inimigo; a moral discursada não se aplica a mim ou aos meus.
Bem, ou seguimos com isso, ou nos voltamos para nós mesmos em reflexão honesta de juízo íntimo. O que em nós queremos recusar? O que de nós queremos aproveitar? Que vida social queremos construir?
Ao poupar os nossos, cometemos traição ética. Ao contorcer fatos, ludibriamos a moral. Extraordinariamente, estamos nos nivelando pela lei. Com alguns excessos, mas com aplicação bastante geral.
Isso não me soa de todo bom, pois não estamos nos cuidando como Sociedade, nem moral, nem eticamente. Estamos sob prescrições legais e cadeia. Nos regozijamos com os castigos dos políticos. Só.
E depois das prisões? Confiram-se as pesquisas eleitorais: muitos políticos bem indicados são mais que meros suspeitos. Ah, claro, são os “nossos” suspeitos, então tudo bem. E começa tudo outra vez.


  • Doutor em Direito pela UFSC.
    Psicólogo e Jornalista.
    Professor da Unisul.

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