0004537-75.2010.805.0001 - Procedimento Ordinário
Autor(s): Jose Pereira De Oliveira Junior
Advogado(s): Alessandro Ribeiro Couto, Carolina Lordelo Rodrigues Couto
Reu(s): Fundação Bahiana Para O Desenvolvimento Das Ciencias Escola Bahiana De Medicina E Saúde Pública
Advogado(s): Gaspare Saraceno
Sentença:
I - RELATÓRIO.
01 - JOSÉ PEREIRA DE OLIVEIRA JÚNIOR, solteiro, residente na rua Marieta Alves, 410 – Itaigara – Salvador – Bahia, requereu esta AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INENIZATÓRIA DE DANO MORAL, contra FUNDAÇÃO BAHIANA PARA O DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS – ESCOLA BAHIANA DE MEDICINA E SAÚDE PÚBLICA, sediada na rua Fr. Henrique, 8 – Nazaré – Salvador – Bahia, alegando, sumariamente, que é aluno do curso de medicina, juntamente com outros colegas, e que foi reprovado no curso regular das disciplinas PEDIATRIA – INTERNATO ROTATÓRIO e TOCOGINECOLOGIA – INTERNATO ROTATÓRIO; que, tentando recuperar as mencionadas disciplinas, foi impedido pela ré; que, por força de liminar, frequentou o curso de recuperação, sem qualquer falta às aulas; que, na matrícula do ano seguinte, as notas do curso de recuperação ainda não estavam à disposição no cadastro do requerente, tendo sido impedido de matricular-se; que foi informado pela ré que tinha sido reprovado na recuperação das matérias referidas, pois frequentara apenas 5 das 8 semanas do curso; que sua nota lançada ao final foi ZERO; que, sentindo-se coagido, foi obrigado a matricular-se nas duas matérias em apreço, do quinto ano; posteriormente, , em janeiro de 2009, tomou ciência de que obtivera nota 8,15 na matéria Tocoginecologia – Internato Rotatório; que, questionando sobre a outra matéria, lhe foi dito que, sendo a recuperação de 2 meses, somente poderia ter cursado uma matéria; que, tal atitude da ré viola seu próprio regimento. Pediu tutela antecipada. Juntou os documentos das folhas 14 a 96. Nas folhas 98 a 99 foi concedida a antecipação da tutela. Na folha 104, informação da ré de que a medida foi devidamente cumprida. Juntou o réu os documentos das folhas 106 a 109. Nas folhas 113 a 119, cópia de agravo de instrumento interposto contra a decisão de tutela antecipada. Nas folhas 120 a 126, o réu contestou o feito, juntando os documentos das folhas 127 a 148. Alegou, em seu favor, na contestação, que o autor não pode se matricular no sexto ano, tendo sido reprovado em uma matéria do quinto ano; que, tal ocorrendo, seria um verdadeiro vilipêndio à autonomia da ré além de um total desarranjo na organização do programa curricular. Alega que não ocorreu qualquer dano moral ao autor. Nas folhas 149 a 151, decisão proferida no Agravo de Instrumento, negando-lhe efeito suspensivo e requisitando informações a este Juízo. Pela decisão da folha 160, a decisão de tutela antecipada foi mantida. Replicando, o autor disse, nas folhas 161 a 170, que o réu não cumpriu a obrigação de lançar a nota da disciplina pediatria. Quanto ao mais, reiterou o pedido exordial. Nas folhas 194 a 203, cópia da decisão proferida no Agravo de Instrumento, que o julgou improvido. Também cópia da decisão que rejeitou embargos declaratórios contra a decisão referida, folhas 201 a 202. Realizada audiência de tentativa de conciliação, folhas 206 a 207, esta restou infrutífera. Nas folhas 247 a 248 o autor informa mais uma vez dentre tantas o descumprimento da ré em informar as notas obtidas pelo autor no estágio da matéria pediatria. Chega ao ponto de pedir a oitiva das professoras da matéria, ante a omissão do réu.
I - FUNDAMENTAÇÃO.
02 – Apesar de muitos papéis desnecessários neste feito, é sucinto e de pequena indagação jurídica. O “meritum causae” se cinge ao fato de ter ou não obtido nota suficiente o autor na matéria prática de pediatria para cursar o ano seguinte, sexto ano do curso de medicina ministrado pela ré. No início da demanda pendia também a informação derredor da matéria Tocoginecologia – Internato Rotatório. Veio aos autos a informação de que o autor obteve média suficiente para lograr êxito na dita matéria e isto não se discute mais. O cerne da demanda é a matéria PEDIATRIA – INTERNADO ROTATÓRIO. Isto porque, como se vê na folha 21, documento colacionado pela própria ré, o autor obteve média final de 8,15 na matéria em apreço, GINECOLOGIA/OBSTERÍCIA. Na folha 20 há o Boletim de recuperação do autor, na matéria PEDIAATRIA, 5º ano, onde está informado que obteve avaliação teórica de 7,50 e nota ZERO na avaliação prática. Por mais que se tenha insistido, o réu se esquivou de apresentar informação derredor da avaliação do autor quanto á parte prática da matéria de pediatria. Entanto, dessume-se com meridiana clareza que quem obtém nota 7,50 na avaliação teórica é óbvio que também se desvencilha bem da parte prática. Obter avaliação ZERO na prática é o mesmo que não comparecer a nenhuma das aulas práticas. É ausência total da prática da disciplina. O documento da folha 215, apesar de assinado apenas pelo professor da matéria, milita contra as informações da própria ré. Extrai-se dali, desarmando-se o espírito de maldade, que o aluno aqui autor efetivamente frequentou o curso prático de pediatria, pois, segundo aquele documento, ele não cumpria horários. Logo, quem não cumpre horários não está deixando de comparecer ao compromisso, mas apenas chegando atrasado. Aquele documento é prova cabal de que o aluno frequentou o curso de pediatria em sua parte prática. O documento da folha 216 não está assinado. Não possui valor probatório. Assim, percebe-se que a ré criou uma barreira intencional com o objetivo de reprovar o aluno, omitindo-se de informar, circunstanciadamente, sobre sua vida curricular prática na cadeira de pediatria. Sua renitência para informar sobre o assunto há de se resolver no âmbito das astreintes, já arbitradas. Ademais, milita conta ela ré a omissão, que é quem detém dito documento. Se voluntariamente não o apresenta, há de se presumir que o autor logrou êxito na matéria, tanto em sua parte teórica, como documentado, quanto em sua parte prática, como omitido pela ré. O que não pode é este feito permanecer, por omissão da ré, como uma Espada de Dâmocles para o autor. Assim, assiste razão ao autor neste feito, devendo ser julgada procedente esta ação.
03 - Como se não bastasse, salta aos olhos que esta ação já perdeu o seu objeto, pois o autor já colou o grau de médico e se inscreveu no órgão de sua classe, o CREMEB – Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia, como se vê nos documentos das folhas 255 e 256. Entanto, para jogar uma pá de cal sobre o assunto, é necessário o julgamento do mérito da causa.
04 – Decidindo o pedido de dano moral, entendo que a ré é culpada, enquadrando-se seu ato no art. 186 c/c o art. 927 do Código Civil. Para que se responsabilize civilmente a ré, são necessárias as existências concomitantes de três indispensáveis requisitos, a saber: a) existência de uma ação, comissiva ou omissiva, que se apresenta como um ato ilícito; b) ocorrência de um dano, moral ou patrimonial e c) nexo de causalidade entre o dano e a ação, pois a responsabilidade civil não poderá existir sem o vínculo entre a ação e o dano. Entendo que o autor sofreu dano material. Fundamentarei porquê. A atitude da ré impingiu ao autor verdadeiro calvário espiritual pois, concluindo o curso de medicina, tentou a ré obstar sem motivo plausível, o desiderato do autor. Criou-lhe vários embaraços, o que configura um dano moral, pois em tal situação compunge-se a alma, constrange-se o homem perante a sociedade, aniquila-se o espírito e refugia-se no mais recôndito da incerteza. Nada disto seria necessário. O ato da ré causou ao autor um verdadeiro dano moral, posto que presentes seus requisitos ensejadores.
A responsabilidade civil neste caso é objetiva, pois a simples atitude do réu, omitindo-se a fornecer a nota da avaliação prática, configurou um dano moral. Segundo Maria Helena Diniz, em sua obra Curso de Direito Civil Brasileiro, 7º volume, Responsabilidade Civil, 6ª edição, página 66, “O dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo”. Na mesma obra a autora, na página 68, ao definir o que seja Dano moral direto e indireto, diz “in verbis”, que “O dano moral direto consiste na lesão a um interesse que visa a satisfação ou gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade (como a vida, a integridade corporal, a liberdade, a honra, o decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem) ou nos atributos da pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de família). A prova do dano moral, neste processo, é fartamente documental. Sua responsabilidade é, portanto, objetiva, independentemente de culpa, bastando nexo causal entre o fato e o dano~(TJRJ – 8º Gr. Cs. Civis – Elnfrs. 240/99 na Ap. 11.350/98 – Rel. Nilson de Castro Dião – j. 24.06.1999 – Bol. AASP 2.163/287). Ante tais considerações é evidente que o réu deve indenizar o autor, entanto em valor menor do que o pretendido. Resta, então, saber qual o valor do dano, que deve ser arbitrado por este Juízo em favor do autor.
05 - A indenização por dano moral não pode ser tão pouca que não a sinta seu causador nem tanta que enriqueça ilicitamente a vítima. Não é este o objetivo da lei. Partindo deste princípio entendo que a ré é econômica e financeiramente forte o suficiente para suportar a indenização. Trata-se de uma instituição particular de ensino superior. O autor, um concluinte do curso de medicina, neófito na profissão de médico. O moral não tem preço, não é aquilatável o sentimento dos seres viventes; não é mensurável. Cada um tem os seus sentimentos e nunca se conhecerá sua extensão. Ninguém conhece a gradação do sentimento humano. Por isto, é cediço que a indenização por dano moral tem a intenção apenas de aliviar a dor, corporal ou espiritual, sofrida pela vítima. Para seu causador a indenização por dano moral visa à punição pecuniária, para que se corrija e evite causar outros danos. Pensando assim, decido por arbitramento, posto que outra forma não há em processos desta natureza. Entendo que o autor deve ser indenizado, mas não com a quantia pretendida. Seguindo a tendência da jurisprudência dos nossos Tribunais, e ante as peculiaridades deste caso, entendo que 10.000 (dez mil reais) são suficientes para indenizar a vítima pelo dano moral sofrido.
III - DECISÃO.
06 - Isto posto, e pelo mais que nos autos consta, com fundamento no art. 269, I, do Código de Processo Civil, julgo procedente o pedido principal, e declaro apto o autor nas matérias motivo desta demanda, quais sejam PEDIATRIA – INTERNATO ROTATÓRIO e TOCOGINECOLOGIA – INTERNATO ROTATÓRIO, para matricular-se no ano letivo seguinte, como requerido. Quanto ao dano moral, com fundamento nos artigos 186 e 927 do Código Civil, julgo procedente, em parte, o pedido, para condenar o réu a indenizar o autor no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), acrescido de juros legais a partir da citação e correção monetária pelo INPC a partir do trânsito em julgado desta decisão. Quanto às astreintes, cuja execução o autor já requereu por descumprimento do réu, certifique o Cartório o período de descumprimento, de sua fixação à data da prolatação desta sentença, e encaminhe-se ao Setor de Cálculos. Como já decidido em audiência, Termo das folhas 206 a 207, extraia-se cópia deste processo e encaminhe-se ao Ministério Público para a análise do que entender de direito. Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e em honorários advocatícios, que arbitro em 20% sobre o valor da condenação.
07 - Certificado o trânsito em julgado, dê-se baixa no tombo do processo e arquive-se
Juíza MARIA DO CARMO TOMMASI COSTA CARIBÉ
16ª Vara Cível de Salvador
Fonte: Diário de Justiça da Bahia