Lan Chile condenada em R$ 20 Mil por danos morais, sentença da juiza Licia Fragoso Modesto, da 30ª Vara Cível de Salvador

Publicado por: redação
20/06/2011 07:30 AM
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Inteiro teor da decisão:

 

0007484-44.2006.805.0001 - INDENIZATORIA (REPARACAO DE DANOS)

Apensos: 1340020-5/2006

Autor(s): Luciola Cruz Ramos

Advogado(s): Zenira Maria Ramos Araújo Oab/Ba 11.400

Reu(s): A Lan Chile

Advogado(s): Maria Suzete Santos de Lima Ribeiro Oab/Ba 14.309

Sentença:  Vistos, etc.

1. RELATÓRIO.
LUCIOLA CRUZ RAMOS, já qualificada nos autos, propôs a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS PATRIMONIAIS E MORAIS contra A LAN CHILE, apresentou em síntese o seguinte:
Informa que iniciou uma viagem saindo de Coolangata (Austrália) com destino ao Brasil, e o primeiro bilhete teve que ser mudado por erro da agência de turismo australiana, o que ocasionou uma emissão de um segundo bilhete apenas com alteração do trecho Sydnay/Santiago. Tendo despachado sua malas em Coolangata, onde fora informada que só precisaria apanhá-las em Salvador.
Aduz que no trecho Santiago/São Paulo, houve um atraso no vôo, e que no momento do desembarque foi informada que precisaria pegar as suas malas para despachar no vôo doméstico, e após esperar a suas malas a serem despachadas, foi informada do atraso destas, quando foi informada que os seus objetos ainda se encontravam em Sidney e só chegariam a Salvador no dia seguinte.
Diz que no dia 27/11/2005, a Autora ligou para confirmar a chegada da bagagem e foi informada que a mesma estava em Los Angeles, e só chegaria a Salvador 02 (dois) dias depois.
Salienta que recebeu a sua bagagem através de uma funcionária da Varig, que trouxe os seus objetos para a Salvador, com a alegação de a empresa Ré, A Lan Chile não tinha filial em salvador.
Afirma que quando recebeu a bagagem, a Autora percebeu que um dos volumes estava totalmente danificado. Razão pela qual recusou a recebê-las, mas foi pressionada a aceitá-las, sob a alegação da Varig, de que se assim não fosse, a bagagem seria reenviada a São Paulo, pois não teria um representante da Ré, em Salvador. Dessa forma recebeu as malas, e ao chegar em casa sentiu falta de vários objetos, tendo inclusive verificado diferença no peso, pois ao embarcou pesava 26kg e quando recebeu pesava 20kg.
Argumenta que ao entrar em contato com a Ré, para fazer a reclamação, foi informada que seria necessário que fosse feita uma listagem dos objetos furtados.
Ao final requereu a indenização dos objetos constantes das bagagens e desaparecidos, listados as fls. 05/06, e que fosse condenada a Ré ao pagamento de indenização por danos morais e patrimoniais no valor de R$ 70.565,22 (setenta mil, quinhentos e sessenta e cinco reais e vinte e dois centavos), além das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 20% do valor da condenação. Juntados e observados documentos as fls. 08/17.
Devidamente citado o Réu, apresentou contestação às fls. 23/50, arguindo no mérito o seguinte:
Defende que as bagagens foram devolvidas a Autora, tão somente, três dias de seu desembarque, e estava da mesma forma quando foi entregue para embarque.
Argumenta que a Autora afirmou que seus objetos foram furtados apenas por represália ao atraso de suas bagagens.
Sustenta que não cometeu ato ilícito, e não causou dano patrimonial nem moral a Autora, ficando desta forma isenta de qualquer responsabilidade para com a mesma, e, consequentemente da obrigação de repará-la.
Salienta que não há nos autos, nenhuma prova de que as mercadorias relacionadas pela Autora efetivamente encontravam-se no interior das malas, e muito menos que não foram entregues com as mesmas, sequer requerendo a inversão do ônus da prova.
Cita que quando a Autora desembarcou em Salvador, foi orientada a preencher um formulário denominado de “parte de irregularidad e equipaje”, aonde deveria discriminar todos os objetos relevantes contidos na bagagem, o que não foi feito pela Autora.
Impugnou os valores estipulados pela Autora, a título de indenização por danos morais e materiais.
Requereu, ao final que os pedidos formulados pela parte Autora fossem julgados improcedentes, condenando-as ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Com a defesa foram acostados documentos de fls. 51/84.
A Autora apresentou réplica às fls. 87/98, combatendo as alegações da Ré e ratificando a inicial.
Em audiência de conciliação às fls. 117, presentes as Partes, devidamente acompanhadas de seus Patronos. Informaram sobre a impossibilidade de realização de acordo, e pugnaram pelo julgamento antecipado da lide.
É o relatório essencial.
Posto isso decido.

2. DISCUSSÃO.
No caso vertente, a Autora descreveu o fato, invocou o direito e pediu a procedência da ação com a condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais e materiais causados pela parte Ré, além das custas e honorários advocatícios.
Assim sendo, a presente demanda deve ser analisada sob a égide do CDC, instituído pela Lei nº 8.078/90, que define como consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Isso pelo fato de que, por analogia, no caso presente restou caracterizada a relação de consumo travada entre os litigantes.
Concorrem, inquestionavelmente, no caso “sub judice”, os pressupostos processuais e as condições da ação. Adentro, pois, ao “meritum causae”, com a seguinte motivação:
A Autora colacionou nos autos, documentos que comprovam a sua relação de consumo com a Ré, e mais, demonstrou que a sua bagagem com documentos foram extraviados por falta de cuidado do Réu.
A Autora relacionou uma lista de objetos que foram extraviados, objetos, esses de uso pessoal, que são peças do vestuário que ordinariamente são levados quando qualquer indivíduo viaja, ainda mais, quando se trata de viagem ao exterior. Também, os valores dos serviços relacionados, não extrapolam os limites da razoabilidade, tendo em vista que se trata de serviços básicos, quando ocorre um fato parecido com qualquer pessoa.
A parte Ré, quando em sede contestatória, pugnou que “se realmente fosse verdade o alegado pela Autora, teria ela lavrado o boletim de ocorrência. (...)”. Com essa declaração, esqueceu-se a Ré de observar o documento de fls. 15/17, que consta reclamação feita pela Autora no Departamento de Aviação Civil, sob o nº de protocolo C. Aer 07-12/2773/2005, que apresenta o relato do fato ocorrido, bem como a listagem dos bens desviados. Prova contundente, de que buscou os meios necessários para apuração do ocorrido, não podendo ser descaracterizada pela ausência de registro de boletim de ocorrência.
As fls. 14, pode-se verificar a informação escrita por preposto da Ré em 29/11/2005: “OBSV. CLIENTE RECEBEU VOLUMES NO LL RG 02 VOL SENDO QUE UMA CX ESTA DANIFICADA”.
Nesse diapasão, não há nenhuma dúvida quanto ao transtorno causado pelo desvio da bagagem e danificação das malas, pois a própria Ré, confessa em várias partes da defesa, que ocorreu o extravio e que os volumes da Autora, encontravam-se danificados.
E mais, as fls. 25 afirma que “as bagagens foram a ela devolvidas após, tão somente, três dias (...)”. Ora, se nas malas da Autora estavam seus pertences de uso pessoal, não poderia a Ré, apreende-las e achar razoável o prazo de 3 (três) dias.
Sendo assim, diante dos documentos colacionados no processo, há como condenar ao pagamento de indenização por danos materiais, com base na robusta prova colacionada ao caderno processual.
A responsabilidade de que trata o Código de Defesa do Consumidor é objetiva, porquanto baseada na teoria do risco do empreendimento.
Por ela, todo aquele que exerça uma atividade no mercado de consumo assume o dever de responder por eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa; tudo isso, em decorrência do dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem assim aos critérios de lealdade, perante os bens e serviços ofertados.
Nestes casos, a responsabilidade surge diante da violação do dever jurídico correspondente.
Sobre o dano moral, está cristalino o dever de indenizar, por configuração de defeito na prestação de serviços pelo Réu, e que contraria o dispositivo do Código consumerista no seu art. 14 do CDC:

gO fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.

A eminente doutrinadora Maria Helena Diniz afirma que:

gA responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causados a terceiros, em razão de ato por ela mesmo praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”.

Esta definição demonstra que, para que haja a efetiva responsabilidade, é necessária a coexistência de três requisitos: a culpa do agente, o dano e o nexo causal entre a culpa do agente e o dano, o que está comprovado no caso em discussão. Sendo inclusive acumuláveis os pedidos de dano moral e material como preconiza a Súmula 37 do STJ: “SÃO CUMULAVEIS AS INDENIZAÇÕES POR DANO MATERIAL E DANO MORAL
ORIUNDOS DO MESMO FATO.”
A violação a honra e a imagem de outrem, afrontam diversos princípios constituionais, entre eles a dignidade da pessoa humana, e ainda, o artigo 5º, inciso X da Constituição Federal diz que: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”

O artigo 6º do CDC, aplicável ao caso, determina que:
São direitos básicos do consumidor:
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
Ainda sobre o dano material é perfeitamente cabível no caso em discussão, tendo em vista que foram frustados por defeito na falha de prestação de serviços do Réu, ao extraviar indevidamente a bagagem.
A maioria dos Tribunais já decidiram acerca do assunto, corroborando com o entendimento adotado:

EMENTA: Apelação - Extravio de .bagagem - Dano material e moral - Cabimento - O extravio de bagagem em transporte aéreo acarreta indenização por dano material e moral, cujo valor deve ser arbitrado conforme a prova dos autos - Recurso parcialmente provido. (TJSP – Apelação APL 7155355400 SP – 23ª Câmara Cível de Direito Privado – Des. Rel. José Carlos de França Carvalho Neto em 07/01/2009).
EMENTA - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - TRANSPORTE AÉREO - EXTRAVIO DE BAGAGEM - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - DANO MATERIAL E MORAL CONFIGURADOS - INDENIZAÇÕES DEVIDAS - RECURSO NÃO PROVIDO. (TJMS – Apelação Cível: AC 11083 MS 2008.011083-1 – 5ª Turma Cível – Des. Rel. Vladimir Abreu da Silva em 18/08/2009).
EMENTA: INDENIZAÇÃO - TRANSPORTE AÉREO INTERNACIONAL - EXTRAVIO DE BAGAGEM - APLICAÇÃO DA CONVENÇÃO DE VARSÓVIA PARA INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - ELEVAÇÃO DO MONTANTE - APELAÇÃO EM PARTE PROVIDA . (TJSP – Apelação: APL 7163383300 SP – 22ª Câmara de Direito Privado – Des. Rel. Matheus Fontes em 13/10/2008).
Como podemos observar nesta última decisão, acerca de extravio de bagagem internacional, deve ser aplicável o disposto no artigo 17 da Convenção de Varsóvia, e subsidiariamente o Código de Defesa do Consumidor, vejamos o que determina a Convenção:
2. O transportador é responsável pelo dano causado em caso de destruição, perda ou avaria da bagagem registrada, no caso em que a destruição, perda ou avaria haja ocorrido a bordo da aeronave ou durante qualquer período em que a bagagem registrada se encontre sob a custódia do transportador. Não obstante, o transportador não será responsável na medida em que o dano se deva à natureza, a um defeito ou a um vício próprio da bagagem. No caso da bagagem não registrada, incluindo os objetos pessoais, o transportador é responsável, se o dano se deve a sua culpa ou a de seus prepostos.
Diante das fartas exposições, não restam dúvidas que o dever de indenizar está caracterizado, no caso em tela.
Quanto ao valor da indenização dos danos morais será, sempre, fixado pelo juiz para abrandar o sofrimento anímico ou psíquico da vítima, decorrente da lesão ou trauma a ela infligido, com o devido cuidado para não lhe enriquecer sem causa, nem servir de estímulo à recidiva do ofensor, tudo devendo ser feito para que também represente papel pedagógico e reprimenda indelével a quem cometeu o desatino.
Já no que concerne ao dano material, serão valorados os objetos desviados, ou seja, que a Autora teve prejuízo, devendo o causador do dano, indenizá-lo.

3. CONCLUSÃO.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos autorais, ao tempo que condeno a Ré para indenizar a parte Autora pelos danos morais causados, na quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) devidamente corrigido, a partir desta data (Súmula 362 do STJ), acrescida de juros de mora deste a data do evento danoso (27/11/2005), e também condeno para que indenize por danos materiais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), este valor devidamente corrigido, também desta data e acrescido de correção monetária pelo INPC, a partir data acima gizada, além do pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 20% do valor da condenação, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20, § 3º do CPC.
Decorrido o prazo legal sem que tenha sido interposto o recurso cabível, certifique-se e arquive-se, com baixa na Distribuição.P.R.I.

 

Fonte: DJE BA