Petrobrás é condenada a pagar R$ 2,8 milhões por veicular matéria ofensiva contra juiz goiano

Publicado por: redação
26/06/2011 11:00 PM
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O juiz Ricardo Teixeira Lemos, da 7ª Vara Cível de Goiânia, condenou na sexta-feira (17) a Petróleo Brasileiro S/A (Petrobrás) a indenizar em 2,8 milhões, por danos morais, o magistrado Wild Afonso Ogawa, da 2ª Vara Cível de Inhumas e diretor do Foro local, por ter veiculado em 36 jornais do País matéria paga, de caráter ofensivo, apontando seu nome e o de vários colegas que atuam no Estado como integrantes de uma “máfia” ou “bando de piratas” especializados na obtenção de decisões judiciais (tutela antecipada) para levantar quantias em dinheiro da empresa. As publicações, divulgadas em 2001 e 2002 sob o título de “Pirataria Tributária”, começaram a ocorrer após liminar concedida por Wild Ogawa à Unip Brasileiro de Petróleo Ltda autorizando-a a retirar das contas da Petrobrás R$ 28.207.643,92, valor referente à diferença do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) pelos produtos (derivados de petróleo) vendidos.

Na sentença, Ricardo Lemos estipulou prazo de 15 dias, após o trânsito em julgado, para que a requerente efetue o pagamento e determinou ainda que a empresa pague as custas processuais e honorários advocatícios fixando-o em 10% sobre o valor da condenação. Ao deixar claro que o valor da indenização é justamente aquele gasto para dar publicidade ao anúncio divulgado nos meios de comunicação, o magistrado citou o artigo 5º da Constituição Federal que, embora assegure o direito à informação, também estabelece limites como a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, sob pena de indenização por dano material ou moral caso as normas sejam infringidas. “Não basta a ré invocar o direito, outrora dever, de informar. Sua responsabilidade é aquiliana ou extracontratual (subjetiva), ou seja, depende da apuração da culpa conforme os atos por ela praticados”, elucidou.

Na sua opinião, a alegação da Petrobrás de que a publicação se deu com fundamento no princípio da publicidade não se sustenta, já que o Código de Processo Civil (artigo 155), que dispõe sobre a publicidade dos atos processuais, deixa claro que nas causas de família ou interesse público a divulgação de informações implica a legalidade e a responsabilidade de quem a patrocinou. “Não há cunho informativo ou meramente público da matéria veiculada pela ré. A publicidade realizada pela requerida se deu com recursos privados e fins particulares da empresa, não guardando relação com o princípio da publicidade dos atos processuais”, frisou.

Ao estipular o valor da reparação em R$ 2,8 milhões, o juiz levou em consideração que a indenização foi arbitrada conforme a extensão do dano, além da aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade,  do caráter pedagógico e da condição das partes. “É razoável e proporcional o arbitramento de indenização ao valor correspondente a R$ 2,8 milhões em razão à extensão do dano. Também é suficiente para que a ré seja desestimulada a praticar outra conduta dessa natureza. Não constituindo quantia que poderá causar-lhe prejuízo ou desfalque tenho em vista de que a reparação deve ser efetiva diante do poderio econômico da requerida, sociedade de economia mista que somente no ano de 1999 apresentou capital social de R$ 13.033.249.063,68, bem como as qualidades e atributos do autor, magistrado que dignifica o Poder Judiciário goiano”,  ressaltou mencionando decisão semelhante, já transitada em julgado, na qual condenou a Editora Planeta Brasil Ltda a indenizar em R$ 1 milhão, também por danos morais, o deputado Ronaldo Caiado por ter publicado em uma das suas obras conteúdo inverídico sobre a vida do político.

Indução da opinião pública

A utilização de adjetivos e recursos linguísticos pejorativos contra o juiz e outros magistrados goianos como “argumentação totalmente falsa” “mentirosamente” e “inusitada rapidez”, induzindo, assim, a opinião pública para a defesa do interesse privado da ré, conforme apontou Ricardo Lemos, tornou a Petrobrás diretamente responsável pelos efeitos das notícias perante a sociedade. A seu ver, a empresa deveria ter usado a via judicial para questionar a decisão e jamais partir para o ataque à honra de qualquer magistrado. “A ré discutiu o mérito da ação fora do foro, através da imprensa goiana e nacional, visando mobilizar a opinião pública a seu favor. Por se tratar de uma sociedade de economia mista de grande envergadura econômica e política, ela sabia que a nomenclatura utilizada causaria impacto na opinião pública e intimidação aos magistrados no que se refere a prolação de outras tutelas antecipadas em seu desfavor”, asseverou.

Quanto à não observação do contraditório na matéria publicada, outro argumento usado pela ré, o juiz é enfático: “Será que a ré, por sua assessoria jurídica, não sabe que a lei permite ao juiz conceder liminares e antecipações de tutela sem ouvir a outra parte? Será que a Petrobrás nunca teve a seu favor uma decisão dessa natureza? A resposta é: basta observar o site dos tribunais. E mais, ao censurar a rapidez das decisões, obviamente ela fomenta a procrastinação da prestação jurisdicional”, indigna-se.

Por outro lado, Ricardo Lemos lembrou que o magistrado exerce o cargo desde 1993, ou seja, há mais de 18 anos, possui conduta ilibada e reputação sem máculas, conforme certidões emitidas pela Corregedoria-Geral da Justiça de Goiás (CCGJO) e escrivanias nais quais atuou, e ocupa ainda a função de presidente da 14ª Turma Julgadora Cível e Criminal dos Juizados Especiais da 14ª Região, além de ser professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (IEPC) e na época da Escola Superior da Magistratura de Goiás (Esmeg) e mestrando em Direito Público na Universidade de Franca (SP). “O autor, que concluía nesse período o mestrado em Franca, sofreu vários constrangimentos perante seus pares, conforme descrito nos autos, todos também profissionais do Direito e estudantes que tiveram conhecimento das publicações no calor dos fatos, sendo fato notório que a repercussão foi negativa no meio acadêmico do qual fazia parte. Os danos à sua imagem como professor de Direito Penal e Processual Penal nos cursos da Esmeg e IEPC, pois na condição de docente das  disciplinas que versam sobre a matéria criminal viu seu nome incluído no exto intitulado Pirataria Fiscal, sem discriminação de responsabilidades”, acentuou.

Danos materiais

Com relação aos danos materiais também requeridos pelo autor, o juiz entendeu que eles não ficaram configurados, uma vez que nesse sentido é preciso a demonstração da diminuição do patrimônio econômico da vítima, danos emergentes ou frustração da certeza de aumento deste patrimônio, lucros cessantes, em razão do ilícito praticado. Segundo o magistrado, embora tenha solicitado o pagamento de 100 vezes o valor de remuneração média mensal de um professor com Faculdade de Direito de Goiânia com o título de mestre, juntando aos autos provas de que foi aluno do curso de mestrado da Universidade de Franca e que lecionava no IEPC e Esmeg de 1996 a 1998, não demonstrou o valor da sua remuneração como docente. “Não foi juntado holerite ou declaração de remuneração de outro docentes nas mesmas disciplinas que aquelas lecionadas na Esmeg e IEPC. Também não ficou comprovado qual seria o pagamento de um professor em iguais condições numa das universidades públicas ou particulares desse Estado. Também não trouxe convite ou proposta de admissão como professor em uma faculdade ou universidade pública ou particular e prova da recusa posterior em razão da matéria publicada”, ponderou.

Quanto à pretensão do autor de ser reparado em danos materiais, com lucros cessantes,  pleiteando o pagamento da diferença da remuneração entre um desembargador e um juiz de entrância final, levando em conta a média de tempo que demoraria uma promoção ao Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), a ser apurado em liquidação de sentença, além de  requerer o quantum com a diferença entre os vencimentos de um ministro de qualquer tribunal superior e de um desembargador do tribunal goiano, Ricardo Lemos deixou claro que o autor não descreve o valor do subsídio à época, de um juiz  de entrância final ou de desembargador ou mesmo de um ministro dos tribunais superiores. “A inicial discorre sobre a possibilidade de progressão na carreira e indicação às cortes superiores narrando apenas a consideração acerca da reputação ilibada. Porém, a veiculação de matérias jornalísticas ou a opinião da imprensa constitui critério subjetivo ou objetivo para a promoção ou direito de acesso às cortes superiores”, observou.

Ementa

A ementa recebeu a seguinte redação: “Ação de Indenização. Danos Morais e Materiais. Falta do Interesse Processual. Publicação de Texto Denominado “Pirataria Tributária”. Imprensa Local e Nacional. Procedência Parcial. Dano Moral Fixado em R$ 2.800.000,00. 1 - A ausência do interesse processual é afastada quando presente a causa de pedir e o binômio necessidade/utilidade do processo. O direito de ação não está condicionado ao direito constitucional de resposta do autor, artigo 5º, inciso V da CRFB/1988. Alegação de ausência de provas e publicidade anterior do fato afeto ao mérito da causa, não preliminar. 2 - Não há direito de informação e livre manifestação do pensamento quando publicada matéria paga, pela Ré, com o intuito de induzir a formação da opinião pública contra atos judiciais que lhes foram desfavoráveis no processo. 3 - Publicação de texto intitulado “Pirataria Tributária” com inclusão do nome do autor (juiz de direito) na causa, induzindo que a celeridade dada ao processo o faria parte de “máfia fiscal” para lesar os cofres da Ré Petrobrás. IV - Dano moral reconhecido. VI - Dano material não provado nos autos. V - Dano moral reconhecido. VI - Indenização arbitrada conforme a extensão do dano, razoabilidade e proporcionalidade, caráter pedagógico e condição das partes no valor de R$ 2.800.000,00. VI - Sucumbência recíproca, art. 21 do CPC”.

Fonte: TJGO

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