Cassada a decisão da 1ª Vara Cível de Camaçari por ordem da Desª Sara da Silva Brito do TJBA

Publicado por: redação
19/07/2011 03:30 AM
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Inteiro teor da decisão:

 

 

PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 0009832-62.2011.805.0000-0

COMARCA DE ORIGEM: CAMAÇARI

IMPETRANTE: ALESSANDRA SANTANA SOUZA

ADVOGADOS: Lívia Castro Araújo e outros

IMPETRADO: JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE CAMAÇARI

RELATORA: Desa. SARA SILVA DE BRITO

Vistos, etc.

Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por ALESSANDRA SANTANA SOUZA, contra ato do JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA CAMAÇARI.

A impetrante alega, em síntese, que é terceira interessada no Mandado de Segurança 0007710-56.2011.805.0039, uma vez que é arrendatária e possuidora do imóvel vindicado no referido processo, o qual foi invadido pelo Sr. Alexsandro Resende de Almeida, razão pela qual precisou se valer do desforço imediato, assegurado na lei, para afastar o esbulho praticado, sendo que os policiais que a acompanharam em tal desforço mantiveram-se não só do lado de fora do apartamento, mas do lado de fora fora do próprio prédio.

Salienta, ainda, a impetrante, que, ao deferir a medida liminar de reintegração requerida, pelo Sr. Alexsandro Resende de Almeida e Solange Pinto dos Santos, a autoridade apontada como coatora não decidiu com acerto, tendo em vista que se baseou, apenas, numa nota fiscal de fornecimento de energia elétrica, o qual, absurdamente, se encontrava em seu nome, e não no nome do suposto invasor.

Requer, assim, liminarmente, e em definitivo, a concessão da segurança, para que seja reintegrada no imóvel vindicado.

É o relatório.

Decido.

1. Defiro a assistência judiciária gratuita requerida, na forma da Lei 1.060/50, diante da declaração de insuficiência financeira.

2. Inicialmente, cumpre registrar que, segundo a prescrição constitucional, são pressupostos autorizadores da utilização do remédio heróico, a lesão ou ameaça a direito líquido e certo, perpetrada ilegalmente ou com abuso de poder por autoridade pública, ou por quem lhe faça as vezes, contra a qual não possa o ofendido voltar-se através de habeas corpus ou habeas data (art. 5º, LXIX, da CF/88).

O legislador infraconstitucional, ao editar nova lei a respeito do Mandado de Segurança, Lei nº 12.016/2009, repetiu, em seu art. 1º, caput, os pressupostos constitucionais, entretanto, na parte final do inciso II do seu art. 5º, implementou significativa mudança em relação à revogada Lei nº 1.533/51, ao estabelecer, verbis:

“Art. 5oNão se concederá mandado de segurança quando se tratar:

I – (...);

II - de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo;” (gn)

O antigo diploma que regulava a matéria, dispunha que era vedado a impetração em casos de decisão judicial passível de recurso ou que pudesse vir a ser modificada por via de correição.

A partir da modificação legislativa supracitada, introduzida pelo nova lei do mandado de segurança, reduziu-se a restrição ao writ, pois, agora, é possível a impetração do mandado de segurança contra decisão judicial ainda passível de recurso, desde que a este a lei processual não autorize a atribuição de efeito suspensivo.

Todavia, tal entendimento necessita de temperamentos, uma vez que não é admissível que um Mandado de Segurança possa se desdobrar ad infinitum em outros mandamus, ao se permitir que a parte irresignada com o deferimento ou indeferimento do pleito liminar possa impetrar sucessivas Ações Mandamentais.

Sobre a questão, veja-se o posicionamento dos Tribunais:

MANDADO DE SEGURANCA CONTRA INDEFERIMENTO DE LIMINAR EM OUTRA ACAO MANDAMENTAL - DESCABIMENTO. - Incabível e o mandado de segurança contra despacho que denega liminar em outro mandado de segurança. - Denega a segurança. (TJPR. I Grupo de Câmaras Cíveis. Rel. Osiris Fontoura. j. 03/12/1992)

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CABIMENTO.

Conforme o entendimento jurisprudencial do STJ, a liminar proferida em sede de mandado de segurança é decisão interlocutória que desafia agravo de instrumento. Precedentes. 2. Precedentes: REsp 1.189.139/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 1.7.2010; RMS 30.832/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 17.5.2010; REsp 1.124.918/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 7.12.2009; REsp 1.124.918/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 7.12.2009; AgRg no REsp 955.168/ES, 2ª Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 20.4.2009. 3. Recurso especial provido. (REsp 1190520/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/10/2010, DJe 10/11/2010)

PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA PARA DAR EFEITO SUSPENSIVO À APELAÇÃO INTERPOSTA CONTRA SENTENÇA CONCESSIVA DE SEGURANÇA. DESCABIMENTO. LEI 1.533/51. SÚMULA 626/STF. INAPLICABILIDADE. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. LEI 4.348/64. 1. A decisão concessiva do mandado de segurança, não obstante sujeita ao duplo grau de jurisdição, comporta execução provisória, ex vi do disposto no artigo 12, parágrafo único, da Lei 1.533/51, com a redação dada pela Lei 6.071/74. 2. O mandado de segurança não constitui via processual adequada para suspender a execução de liminar ou de sentença concessiva de outra ação mandamental, mas, sim, o instituto denominado "suspensão de segurança", previsto no artigo 4º, da Lei 4.348/64, cujo caput dispõe que: "Quando, a requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o Presidente do Tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso (VETADO) suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar, e da sentença, dessa decisão caberá agravo, sem efeito suspensivo no prazo de (10) dez dias, contados da publicação do ato".

[…] 6. Recurso ordinário desprovido, mantendo-se a extinção do mandado de segurança, por força do disposto no artigo 267, I, do CPC, c/c o artigo 8º, da Lei 1.533/51.

(RMS 20.986/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/12/2008, DJe 18/02/2009).

3. No caso concreto, porém, o mandado de segurança há de ser conhecido porque é impetrado por um terceiro, logo, excepcionalmente, mesmo sendo cabível agravo de instrumento, não há incidência da regra geral, direcionada às partes de uma demanda, mas, sim, há incidência da Súmula 202, do STJ, que diz que “a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso”.

4. Com efeito, por força do inciso III do art. 7°, da Lei n° 12.016/2009, a medida liminar, em mandado de segurança, deve ser deferida quando houver fundamento relevante, e quando do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida.

Vejamos, in verbis, neste sentido, parte do art. 7°, inciso III, da Lei 12.016/2009, que apenas repetiu posicionamento anterior, da revogada Lei 1.533, de 31 de dezembro de 1951:

“Art. 7o Ao despachar a inicial, o juiz ordenará: (…) III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida”(...)”

Igualmente, CELSO BASTOS, com muita precisão, explica que “a medida liminar é uma providência cautelar destinada a preservar a possibilidade de satisfação pela sentença do direito do impetrante. Em outras palavras, visa a impedir que o retardamento da decisão final venha a torná-la inócua, em razão da irreparabilidade do dano sofrido”. (Comentários à Constituição do Brasil, 2º volume, São Paulo, Ed. Saraiva).

Este, também, é o posicionamento do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

“A concessão de medida liminar em Mandado de Segurança requer a presença concomitante de dois pressupostos autorizadores: (a) a relevância dos argumentos da impetração e (b) que do ato impugnado possa resultar a ineficácia da ordem judicial, caso concedida a final”. TERCEIRA SEÇÃO.Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO. AgRg no AgRg no MS 14336/DF, DJe 10/09/2009).

4. No caso dos presentes autos, mostram-se relevantes as alegações do impetrante, no sentido de que a prova contida, no Mandado de Segurança 0007710-56.2011.805.0039, qual seja, uma simples nota de fiscal de cobrança de energia elétrica, não tinha o condão de autorizar o deferimento da medida liminar requerida, fato este reconhecido pelo próprio juiz a quo, que, expressamente, salienta que a prova produzida seria precária.

Ora, tratando-se de mandado de segurança, a prova produzida há de ser preconstituída, não só para o deferimento de medida liminar, mas para permitir o próprio conhecimento do mandado de segurança, não se podendo perder de vista que, tratando-se de discussão acerca da posse de imóvel, a produção de prova, nesse sentido, deve ser promovida, pelas partes, em ação possessória própria.

De forma brilhante, sobre a necessidade de produção de prova preconstituída, em mandado de segurança, explica Hely Lopes Meirelles que“direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da sua impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua condição impetrante. Se a sua existência for duvidosa, se a sua extensão ainda não estiver determinada; se o seu exercício depender de situações e fatos não esclarecidos nos autos, não rende ensejo à segurança” (Mandado de Segurança e Ação Popular, Ed. RT, pág. 12).

Neste sentido, o entendimento do STF, quando do julgamento do RMS 7.725/SP, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, assim fundamentado o Acórdão:

“O mandado de segurança é ação de rito especialíssimo, de índole documental, que exige prova pré constituída, inadmitindo dilação probatória. Não se presta, portanto, como apanágio para postulação de quaisquer direitos, mas constitui meio adequado para proteção do direito líquido e certo, demonstrado de plano, mediante prova indiscutível, contra ato abusivo ou ilegal de autoridade pública. O conceito de direito líquido e certo é tipicamente processual e só pode ser reconhecido se os fatos em que se funda puderem ser provados de forma incontestável, pois, a ação mandamental só é cabível quando não haja incerteza sobre os fatos”.

“É princípio basilar, constitucional, que o mandado de segurança será concedido para proteger direito líquido e certo, tendo-se como direito líquido e certo aquele que resulta de fato certo, e fato certo é aquele capaz de ser comprovado de plano, por documento inequívoco, sendo necessário que o pedido seja apoiado em fatos incontroversos, e não em fatos complexos, que reclama produção e cotejo de provas” (RTJ 124/948).

5. Por outro lado, forçoso, também, o reconhecimento de que do ato impugnado pode resultar ineficaz a medida, caso seja, apenas, finalmente deferida, uma vez que já foi expedida a ordem de reintegração de posse em desfavor da impetrante.

6. Diante do exposto, defiro o pedido de concessão de liminar, para cassar a ordem de reintegração de posse, deferida, pela autoridade coatora, em desfavor da impetrante.

Notifique-se a autoridade coatora, via fax, com a devida urgência, dos termos da presente decisão, para imediato cumprimento, sob as penas da lei, e, para que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações que entender necessária.

Publique-se.

Intime-se.

Salvador, de 2011

Desa. Sara Silva de Brito
Relatora

Fonte: DJE BA