Juiza Carmem Lúcia Santos Pinheiro, da 29ª Vara Cível de Salvador, condena a CLARO S/A

Publicado por: redação
17/04/2012 04:11 AM
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Inteiro Teor da Decisão:

ADV: ELADIO LASSERRE (OAB 15906/BA), EURICELE TORRES SOUSA (OAB 22333/BA), MARCELO NEUMANN MOREIRAS PESSOA (OAB 25419/BA) - Processo 0047611-53.2008.8.05.0001 - Ação Civil Coletiva - AUTOR: Scar Academias de Ginastica Ltda - RÉU: Bcp Sa - (...)É o relatório. Posto isso, decido. Inicialmente, defiro o pedido de inversão do ônus da prova em favor da parte Autora. A Constituição Federal de 1988 determinou a proteção do consumidor e a elevou a categoria de direito fundamental e princípio a ser obedecido no referente à estabilidade da ordem econômica, cabendo ao Estado promover a defesa do consumidor (arts. 5º, inciso XXXII e 170, inciso V da CF). A inversão do ônus da prova fica a critério do juiz. O Código de Defesa do Consumidor, através do seu artigo 6º, estabelece direitos básicos do consumidor, dentre os quais, destaque-se aqui: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências. Certo é que os dois polos da relação de consumo (consumidor/fornecedor) são compostos por partes desiguais em ordem técnica e econômica. No caso dos autos, a vulnerabilidade da parte Autora é patente. Ressalte-se que a inversão do ônus da prova como um direito básico do consumidor, e as demais normas que o protege, não ofendem a isonomia das partes, ao contrário, é um instrumento processual com vistas a impedir o desequilíbrio da relação jurídica. A inversão do ônus da prova é um direito conferido ao consumidor para viabilizar sua defesa no processo civil e somente neste. Sendo assim, verifico a verossimilhança das alegações da inicial, haja vista ter o Autor apresentado documentos que comprovam o aumento repentino dos valores tarifários cobrados pela empresa Ré. Verifico, ainda, a preponderância da Ré em face da parte Autora, visto que a mesma possui a técnica da produção, que vai de acordo com seus interesses, e poder econômico superior a Autora. Em se tratando do mérito, a empresa Ré desenvolve a sua tese de defesa numa suposta legalidade das cobranças, afirmando que o reajuste fora feito nos exatos termos da cláusula 3.4. do contrato e em acordo ao que determina a resolução nº 438/06 da ANATEL, além de ter sido, ainda, autorizado também pela ANATEL. Invertido o ônus da prova, a empresa Ré poderia haver facilmente justificado a sua conduta, contudo, não desincumbiu-se em arrolar aos autos nem o contrato, nem a resolução, nem a suposta autorização da ANATEL. Restam, com isso, desamparadas as suas alegações. A Ré afirma, ainda, que o valor da tarifa não pode ser fixo/estático, mas não observa, entretanto, que o conhecimento prévio de toda e qualquer alteração nas condições de prestação do serviço é um direito do usuário de serviço de telecomunicação. Pelo que se vê dos autos, a empresa Ré, aumentou as tarifas cobradas, de um mês para o outro, em mais de 100% sem, contudo, notificar a Autora. Nesta senda, o Código de Defesa do Consumidor estabelece, em seu artigo 6º, inciso III, como direito básico do consumidor ser devidamente informado sobre os serviços e seus preços, assim como os riscos que apresentam, senão vejamos: III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem. Verifica-se que, no caso em tela, houve de fato a regular prestação do serviço, o que não justifica, porém, a legalidade da cobrança e o exercício regular do direito, visto que as partes assinaram um contrato que foi repentina e unilateralmente alterado pela Ré, que em verdade cometeu o abuso de direito. Neste sentido, estabelece o Código Civil como ato ilícito, exceder os limites de um direito do qual se é titular, senão vejamos: Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Ademais, a possibilidade de excludente de responsabilidade baseada no engano justificável suscitada pela Ré, esbarra na falta de comprovação de que a mesma agiu com legalidade, respeitando o que supostamente fora resolvido pela ANATEL. Note-se que dentro do sistema de proteção ao consumidor foi consagrada como regra a responsabilidade objetiva do fornecedor, desse modo, a expressão engano justificável deve ser interpretada como fator que exclua o nexo de causalidade entre a conduta do fornecedor e o dano causado, o que, invariavelmente, só será demonstrado no caso fortuito, na força maior e no fato do príncipe. Tanto a má-fé quanto a culpa - imprudência, negligência e imperícia - dão causa à repetição do indébito. Quanto a isso, o Código de Defesa do Consumidor determina, em seu artigo 42, parágrafo único, que: "Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável" Verifica-se que a parte Autora efetuou o pagamento a maior nos meses de agosto, setembro e outubro de 2007, referentes aos planos telefônicos que, de acordo com o que foi anteriormente avençado, custariam menos da metade dos valores então cobrados. A empresa Ré, entretanto, não logrou êxito em demonstrar que a falha decorreu de fato alheio à sua ação, ou seja, não desincumbiu-se em fundamentar devidamente os motivos de tal aumento, razão pela qual a Autora merece ser restituída em dobro nos valores indevidamente cobrados pela Ré, distantes daquilo firmado em contrato. A cobrança indevida consubstancia violação ao dever anexo de cuidado e, portanto, destoa do parâmetro de conduta determinado pelo princípio da boa-fé objetiva. Coerente com este critério, a repetição de indébito em dobro prevista pelo parágrafo único, do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor representa hipótese legal de punitive damage (indenização com finalidade de sanção) em função da violação ao dever intransponível do fornecedor de agir de acordo com o parâmetro de qualidade. Negar a indenização nesse caso seria imputar a parte Autora o ônus de suportar os danos decorrentes do equívoco da Ré, o que não se coaduna com os princípios vetores do Código de Defesa do Consumidor, dentre os quais se destacam os princípios da vulnerabilidade e o da confiança. Ademais, se determinada a devolução simples, a artimanha terá valido a pena, podendo até ser estimulada, vez que na pior das hipóteses, representará para a empresa Ré o equivalente a um empréstimo compulsório a juros baixos. Assim sendo, a repetição do indébito em dobro tem função pedagógica e inibidora de condutas lesivas ao consumidor, tendo em vista, em maior grau, o interesse social no controle das imperfeições do mercado do que propriamente o interesse particular do consumidor individualmente considerado. Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a presente ação para condenar a CLARO S/A, com fulcro no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, a ressarcir em dobro os valores que cobrou indevidamente da SCAR ACADEMIAS DE GINÁSTICA LTDA., referente à diferença entre os valores originais do plano contratado e da assinatura das linhas e o que foi injustificadamente cobrado a maior nas faturas vencidas nos meses de agosto, setembro e outubro de 2007, monetariamente os valores desde a data do ajuizamento da ação até o efetivo pagamento, com juros de 1% ao mês. Condeno-a, ainda, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da condenação atualizada, levando-se em conta do grau de zelo profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20 § 3º do CPC. Salvador, 12 de maio de 2012. CARMEM LÚCIA SANTOS PINHEIRO Juíza de Direito

Fonte: DJE BA

Mais: www.direitolegal.org

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