Federalismo e o Poder Judiciário

Publicado por: redação
24/11/2013 02:53 AM
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João Luís Fischer Dias - Juiz de Direito, mestre em direito pela Universidade de Brasília (UnB)

O princípio do federalismo foi erigido pela Constituição Federal como elemento essencial da própria gênese do Estado Brasileiro, definido logo no início da Constituição, art. 1º (e no preâmbulo) como República Federativa do Brasil. Por essa razão fora expressamente proibida qualquer emenda (cláusula pétrea) tendente a aboli-la (art. 60, §4º). O terceiro poder, portanto, não estaria concentrado na esfera federativa da União Federal, pois os estados federados são competentes para organizar sua Justiça, segundo o disposto no art. 125 da Constituição Federal.

Não seria crível admitir-se que a União possa dispor e gerir vultosos recursos pertencentes a outro ente federativo, da ordem de dezenas de bilhões de reais, que não foram por ela arrecadados e aplicados nos TJs.

Não obstante, a partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 45 de 2004 houve mudança substancial e radical na atuação do Judiciário Federal com amplos poderes conferidos pelo texto constitucional ao CNJ, que não obedece a um contexto federativo, eis que as premissas do federalismo são afastadas. Considera-se o Judiciário estadual e da União em um mesmo plano nacional. Ou seja, a administração pública do estado federado, que dá suporte ao TJs, é considerada como ente nacional. Em artigo recentemente publicado, o eminente Juiz de Direito da Justiça do Rio de Janeiro e Conselheiro do CNJ, dr. José Guilherme Vasi Werner expressa-se nos seguintes termos: "(...) E se há realmente um projeto orientado para construção de um aparato de dominação da União sobre o Poder Judiciário do estados, o Conselho Nacional de Justiça tem nele um papel fundamental e indispensável, pois representa, mais do que qualquer outra organização, a construção de um novo aparato de dominação - ou, ao menos, de um aparato modificado de dominação - a serviço da União".

O STF já se pronunciou sobre a matéria na ADI 3367/2004 em voto da lavra do eminente ministro Celso Peluso, que assim se expressou: "O pacto federativo não se desenha nem expressa, em relação ao Poder Judiciário, de forma normativa idêntica à que atua sobre os demais Poderes da República. Porque a Jurisdição, enquanto manifestação da unidade do poder soberano do Estado, tampouco pode deixar de ser una e indivisível, é doutrina assente que o Poder Judiciário tem caráter nacional, não existindo senão por metáfora e metonímias, "judiciários estaduais" ao lado de um "Judiciário federal".

Visível se mostra, segundo o entendimento acima, que o enfraquecimento da autonomia política do estado federado, em relação à parcela da sua própria administração pública, que está afeta ao Judiciário Estadual

O STF, em outra oportunidade, abordou com clareza essa questão federativa que envolve a autonomia dos estados e atuação do CNJ, na ADI 4638, da lavra do Ministro Marco Aurélio, a qual trouxe elementos fundamentais para nossa análise, verbis: "De fato, o tratamento nacional reservado ao Poder Judiciário pela Constituição não autoriza o Conselho Nacional de Justiça a suprimir a independência dos tribunais, transformando-os em meros órgãos autômatos, desprovidos de autocontrole. (...) A atuação legítima, contudo, exige a observância da autonomia político-administrativa dos tribunais, enquanto instituições dotadas de capacidade autoadministrativa e disciplinar." "(...)No que tange aos Tribunais de Justiça, observem ainda os parâmetros da Federação, valendo lembrar que a forma federativa é um mecanismo de proteção da autonomia privada e da autonomia pública dos cidadãos, servindo a descentralização política para conter o poder e para aproximá-lo do respectivo titular, o povo. (...) Os estados organizam-se segundo os ditames maiores e, aí, surgem os Três Poderes - o Legislativo, o Executivo e o Judiciário -, que, nos moldes do artigo 2º, são independentes e harmônicos entre si.(...) (...) Por conseguinte, por força do princípio federativo, afigura-se inafastável a autonomia dos Tribunais de Justiça, no que se mostram órgãos de cúpula do Poder Judiciário local. Se, em relação aos tribunais em geral, há de se considerar o predicado da autonomia preconizado nos artigos 96, inciso I, e 99 da Constituição, quanto aos Tribunais de Justiça, cumpre atentar, em acréscimo, para o princípio federativo."

O STF, em outro momento memorável, em voto da lavra do eminente ministro Celso de Mello, no Mandado de Segurança nº 28.799/DF, destacou o princípio basilar do federalismo: "Não obstante a dimensão nacional em que se projeta o modelo Judiciário vigente em nosso país, não se pode deixar de reconhecer que os corpos judiciários locais, por qualificarem-se como coletividades autônomas institucionalizadas, possuem um núcleo de autogoverno que lhes é próprio e que, por isso mesmo, constitui expressão de legítima autonomia, que deve ser ordinariamente preservada, porque, ainda que admissível, é sempre extraordinária a possibilidade de interferência, neles, de organismos posicionados na estrutura central do Poder Judiciário nacional. (...).

Importante observar que oSTF abordou a questão em profundidade. Cumpre-nos, contudo, relembrar os princípios primevos do federalismo brasileiro, que foram insculpidos em solo nacional a partir da Carta Constitucional 1891, nos albores da República, quando a imensidão continental deste país exigia, para se entender como nação, a união das pluralidades políticas regionais em torno de um Poder Federalizado e Republicano forte (herdeiro da Monarquia em extinção), suficiente para lhes assegurar a liberdade, traduzida na autonomia política federativa.

 

 

Fonte: TJDFT

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