Conciliação: pedra angular dos Juizados Especiais

Publicado por: redação
24/01/2011 10:00 AM
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Conciliação: pedra angular dos Juizados Especiais - Juíza Oriana Piske

O papel desempenhado pela conciliação dentro do sistema processual tradicional sempre foi muito tímido, talvez pela grande influência da cultura do litígio. Nesse sentido é o entendimento de Elena Highton:

"Hay una cultura del litigio enraizada en la sociedad actual, que debe ser revertida si deseamos una justicia mejor y una sociedad também mejor, y lo que permite clasificar a una cultura como litigiosa no es, propiamente, el numero de conflictos que presenta, sino la tendencia a resolver esos conflictos bajo la forma adversarial del litigio". (1)

A conciliação no processo civil, por exemplo, se resumia, quando muito, a um mero e às vezes inaudível questionário do magistrado antes do início das audiências.

Ante a permanência dos vínculos das relações que geram os conflitos, desde a Lei de Pequenas Causas vem se tentando reabilitar formas de composição de conflito mais adequadas ao que se denomina de Justiça coexistencial, ou conciliativa, que "(...) deve ser perseguida quando esta possa revelar-se, também no plano qualitativo, não já um second best, mas também melhor do que a Justiça ordinária contenciosa". (2)

Na conciliação as partes têm uma posição mais proeminente, devido a participarem da solução do conflito. Na verdade, a decisão é um compromisso cujos termos, com estímulo do conciliador, são produzidos pelos envolvidos. Trata-se de um método não adversarial, na medida em que as partes atuam juntas e de forma cooperativa.

A conciliação objetiva que as partes possam reconhecer os limites do conflito e encontrar uma solução conjunta. Pode ocorrer o atendimento pleno direito do autor, parcial, ou mesmo não haver atendimento do direito deste. A necessidade da superação do ranço de uma mentalidade conservadora na apreciação dos novos instrumentos de realização e efetivação de cidadania se afigura um grande desafio.

Não perceber as novas potencialidades dos Juizados Especiais constitui uma verdadeira contramarcha ao processo de universalização do acesso adequado à Justiça. Portanto, a conciliação representa estratégia de atuação que leva as próprias partes a encontrarem a melhor solução para o litígio, cabendo ao juiz, togado ou não, e ao conciliador informarem às partes a importância e as vantagens positivas desse instituto.

Com efeito, a Lei no 9.099/95 valoriza a conciliação (art. 21/26 e 57), não desejando uma tentativa pálida de acordo com a simples indagação às partes sobre a sua possibilidade. Muito mais do que isso, pretende uma interação entre as partes com o conciliador ou juiz, desarmando os espíritos, apresentando caminhos e sugestões para o deslinde da controvérsia, numa participação efetiva em busca da pacificação social.

Deve, pois, não só o conciliador mas também o juiz, atentar sempre para o espírito de conciliação imposto pela lei. Na conciliação, não há uma solução ditatorialmente imposta, as partes, em consenso, encontram um caminho para a resolução do conflito.

Trata-se de uma mudança não só de comportamento, mas também de mentalidade. O órgão que representa a Justiça sai de sua posição inerte e, mantendo evidentemente a igualdade das partes, formula hipóteses, sugere formas de composição do litígio, adverte para os riscos em caso de prosseguimento do pleito, enfim, exerce atuação preponderante no caminho para o entendimento das partes.

Oriana Piske é Juíza de Direito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT).
Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Pós-graduação em: Teoria da Constituição; Direito do Trabalho; e Direito Civil pelo CESAP - UniCEUB.
Doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino (UMSA).

(1) HIGHTON, Elena I.; ALVAREZ, Gladys S. Mediación para resolver conflictos. Buenos Aires: Ad Hoc, 1995. p. 24.
(2) CAPPELLETTI, Mauro. O acesso à Justiça e a função do jurista em nossa época. In: CONFERÊNCIA NACIONAL DA OAB, 13, Anais. Belo Horizonte: OAB, 1990. p. 115-130.

REFERÊNCIAS

CAPPELLETTI, Mauro. O acesso à Justiça e a função do jurista em nossa época. In: CONFERÊNCIA NACIONAL DA OAB, 13, Anais. Belo Horizonte: OAB, 1990. p. 115-130.

CARDOSO, Antônio Pessoa. Justiça alternativa: Juizados Especiais. Belo Horizonte: Nova Alvorada, 1996. p. 95.

COSTA E FONSECA, Ana Carolina da. Considerações sobre Juizados Especiais. Revista dos Juizados Especiais, Doutrina - Jurisprudência, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n. 28-29, abr./ago., 2000, p. 32.

GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Juizados Especiais Criminais: comentários à Lei no 9.099, de 26.09.1995. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996. p. 62.

HIGHTON, Elena I.; ALVAREZ, Gladys S. Mediación para resolver conflictos. Buenos Aires: Ad Hoc, 1995. p. 24.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Juizados Especiais Criminais: comentários, jurisprudência, legislação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p.27.

SALOMÃO, Luis Felipe. Roteiro dos Juizados Especiais Cíveis. Rio de Janeiro: Destaque, 1997. p. 42.

Autor: Oriana Piske

Fonte: TJDFT

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