Direito de Arena x Direito de Imagem

Publicado por: redação
26/01/2010 09:43 AM
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Entenda melhor o direito de arena
Muito se tem lido nos veículos de comunicação acerca do direito de arena dos atletas profissionais de futebol. Entretanto, pouco se sabe sobre o tema. O vocábulo “arena”, que advém do latim, significa areia, e é utilizado no âmbito desportivo desde a antiguidade, como local coberto de areia em que os gladiadores combatiam.

O Direito de Arena foi introduzido no ordenamento jurídico pátrio com o advento da Lei n°. 5.988/73, que regula os direitos autorais. Antes de sua criação, os clubes nada recebiam pelas imagens geradas em razão do espetáculo esportivo, que eram transmitidos pelos meios de comunicação

Com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, ficou assegurada em seu artigo 5º, inciso XXVIII, alínea “a”: “a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução de imagem e voz humana, inclusive nas atividades desportivas”.
Todavia, no âmbito do direito desportivo propriamente dito, o Direito de Arena passou a ser tutelado somente com a criação da Lei nº. 8.672/93 (Lei Zico). Com a revogação desta pela Lei Pelé (Lei nº 9.615/98), o Direito de Arena, aplicado ao Direito Desportivo, passou a ser regido pelo artigo 42 da mesma lei, segundo o qual: “às entidades de prática desportiva pertence o direito de negociar, autorizar e proibir a fixação, a transmissão ou retransmissão de imagem de espetáculo ou eventos desportivos de que participem – § 1. Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço total da autorização, como mínimo, será distribuído, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo ou evento”.
Denota-se, do texto legal, que o Direito de Arena é um direito conferido às Entidades de Prática Desportiva (Clubes) de negociar a transmissão ou retransmissão da imagem, com a exceção dos flagrantes para fins jornalísticos, cabendo ao atleta, apenas, o direito a um percentual, previsto em lei, sobre o valor total negociado.
Isso se dá por uma simples razão. O atleta acaba sendo o protagonista maior do evento desportivo, aquele que possibilita a negociação em valores elevados pela entidade de prática desportiva – haja vista a repercussão do próprio Ronaldo no Corinthians, sendo que a legislação tomou o cuidado de assegurar ao atleta parte desse valor, ou seja, o mínimo de 20%.

É importante esclarecer a diferença entre Direito de Arena e Direito de Imagem.O Direito de Imagem é o nome doutrinariamente atribuído ao direito exclusivo do indivíduo permitir a utilização de sua imagem, esta compreendida como forma física exterior do corpo, inteiro ou parte dele. Já o Direito de Arena refere-se ao direito autoral, ou seja, o autor da imagem, como por exemplo, uma partida de futebol (obra coletiva).
Aliás, no direito de arena, a titularidade é da entidade de prática desportiva, devidos em razão da efetiva participação no espetáculo desportivo, ao passo que nos contratos de licença de uso de imagem a titularidade pertence ao atleta, devido por conta da utilização da sua imagem agregada a determinado produto, veiculando e explorando em merchandising comerciais, a fim de conferir valor agregado a bens de consumo.

Esclarecido isso, suponhamos que um determinado clube receba R$ 700 mil para a disputa de determinado campeonato, disputado em dez rodadas, ou seja, cada clube fará apenas dez partidas. Os 20% estipulados em lei que deverão ser repassados aos atletas correspondem a R$ 140 mil. Para saber quanto cada jogador receberá por jogo, devemos dividir esse valor pelo número de jogos e depois pelo número de atletas que efetivamente participaram da partida (consideraremos aqui o que clube realizou as três substituições em todos os jogos, assim 14 jogadores participaram efetivamente da partida).
Chegaremos ao valor de R$ 1 mil, ou seja, cada jogador que tenha participado do jogo receberá esse valor, por partida. Para chegar a quantia que o atleta faz jus no campeonato, basta multiplicar esse valor pelo número de jogos que o atleta participou.
Mesmo existindo previsão legal desde 1993, conforme exposto, garantindo aos atletas participantes do evento desportivo um mínimo de 20% sobre o valor total negociado entre a Entidade de Prática Desportiva e as Redes Emissoras, referida obrigação quase nunca foi cumprida pelos Clubes, e, consequentemente, os atletas deixaram de receber os valores, em evidente desrespeito a lei e aos direitos dos atletas.
Visando resguardar os direitos da sua categoria profissional, alguns Sindicatos de Atletas Profissionais (São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Porto Alegre), ingressaram com uma medida judicial, em 1997 (antes da edição da Lei Pelé), pleiteando o pagamento de 20% sobre os valores negociados pelos clubes com a rede emissora, a título de Direito de Arena.
 
Após muita discussão e passados quase três anos de litígio, em 1999, foi concedida judicialmente a tutela antecipada, na referida ação, determinando a retenção de 20% do total negociado, em todos os campeonatos, para o fim de garantir aos atletas profissionais o recebimento de seus direitos. Todavia, em razão da suspensão da decisão, por conta da interposição de inúmeros recursos judiciais, em 2000 foi firmado acordo entre as partes envolvidas, garantindo aos atletas o repasse de, apenas, 5%.
Destaque-se que referido acordo conferiu quitação apenas até o limite do valor recebido, facultando ao atleta a possibilidade de pleitear a diferença que entender cabível. Entretanto, os clubes, em virtude do acordo e a revelia da lei, iniciaram um repasse de apenas 5% (cinco por cento) do valor total negociado com as emissoras de televisão, o que gerou todo o imbróglio jurídico que atualmente veio a tona.
É óbvio que se deve enaltecer o feito conquistado pelo Sindicato de Classe. Todavia, referido acordo não confere quitação sobre o total do valor devido de, no mínimo, 20%. E mais, também é prudente esclarecer que não existe letra morta na lei, ou seja, toda expressão, frase ou palavra contida em um texto legal tem uma razão para estar lá. Portanto, a expressão “como mínimo” tem uma função na lei, qual seja, permitir a transação apenas para percentuais superiores ao estipulado, jamais inferiores.
*João Henrique Chiminazzo é especialista em direito desportivo e sócio do escritório Pereira Neto & Chiminazzo advogados.

Fonte:
João Henrique Cren Chiminazzo formou-se em direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (SP), em 2003, sendo admitido pela OAB/SP no ano seguinte. Advogado atuante e especialista em direito desportivo, palestrante e responsável por ministrar diversos cursos sobre o tema, é também membro do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo - IBDD, membro efetivo da Comissão de Direito Desportivo da OAB - Seção de São Paulo, membro da Comissão de Direito Desportivo da OAB/SP - 3ª Subseção de Campinas, membro Convidado Honorário da Comissão de Direito Desportivo da OAB/SP - 21ª Subseção de Bauru, membro e parecista do Centro de Estudos Virtuais de Legislação Desportivo e membro do Grupo de Estudo de Direito Desportivo do Rio Grande do Sul. João Henrique é um dos sócios do escritório Pereira Neto & Chiminazzo advogados.

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