O STF no país das maravilhas

Publicado por: redação
29/03/2012 09:55 AM
Exibições: 52

Em março, o Brasil teve a comprovação de que não pode mais confiar em sua Suprema Corte! Com o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4029, no dia 08, veio a certeza de que se pode falar qualquer coisa sobre qualquer tema perante o Judiciário brasileiro, pois o Supremo Tribunal Federal afirmou que uma das maiores inconstitucionalidades da história do Brasil é constitucional, única e exclusivamente fundado em argumento pragmático.

Pouco importa aqui o objeto específico da ação nem suas partes, mas um dos argumentos utilizados é de extrema relevância: o fato de que a lei que se atacava como sendo inconstitucional teria derivado de uma Medida Provisória que não poderia ter sido convertida em Lei, uma vez que não cumpriu o que posto no artigo 62, § 9º da Constituição.

Explico: as Medidas Provisórias, como indica a própria denominação, possuem caráter transitório, uma vez que caso não haja sua conversão em lei após o período máximo de 120 dias, perdem completamente sua validade, via de regra. Isso ocorre, pois as MP são editadas pelo Presidente da República, pertencente ao Poder Executivo, como se fossem lei, ao passo que o Poder ordinariamente responsável pela produção é o Legislativo, ou seja, o Presidente assume, extraordinariamente, a função de governante absoluto durante o período de vigência da MP.

Após seu período constitucional de vigência, para que a validade da MP perdure, esta deverá ser votada pelo Legislativo, visando sua conversão em Lei, de modo que haja uma chancela democrática ao Ato Normativo editado pelo Poder Executivo, quando deve(ria) haver o exame dessas por parte da Comissão Mista de Deputados e Senadores, conforme posto no artigo 62, § 9º da Constituição.

O problema todo é que tal comissão jamais existiu!

Assim sendo, desde a inserção na Constituição da exigência de que as MPs passem por tal Comissão em 2001, por meio da Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro daquele ano (a data já preludiava a tragédia que se avizinharia também para nós), todas são INCONSTITUCIONAIS, entre elas as que criaram o Bolsa Família e o PROUNI.

A “justificativa” utilizada pelo STF para transformar uma inconstitucionalidade em constitucionalidade foi a de que todas estas MPs não poderiam ser tiradas do Ordenamento de uma hora para outra, sob pena de estabelecer-se um caos no país. Ora o caos aí já está!

Para que serve um Tribunal que deveria defender a Constituição e apenas a vilipendia, para que serve um Legislativo que deveria servir para controlar os desmandos do Poder Executivo, e para que necessitamos de presidentes que editam 560 Medidas Provisórias em pouco mais de 11 anos?!

Diante de todo esse cenário devemos nos sentir como a Alice, aquela do País das Maravilhas, afinal tudo pode, até mesmo dar o significado que bem se entender às palavras.

Basta o STF querer que inconstitucional signifique constitucional, da mesma forma que autoritarismo passe a significar democracia, e cidadãos viram “Alices”.

É evidente a ausência de divisão de poderes quando quem deveria administrar manda, quem deveria mandar e fiscalizar nada faz, quem deveria julgar e defender a Constituição apenas a destrói e, por fim, quem deveria promover a democracia, apenas promove seu próprio império.

Isso lembra outra passagem da fantástica obra de Lewis Carrol: “Alice nunca havia estado numa corte de justiça antes, mas já tinha lido a respeito em livros, e ficou bem satisfeita ao descobrir que sabia o nome de quase tudo. ’Aquele é o juiz’, disse para si mesma, ‘por causa da grande peruca’. O juiz, por sinal, era o Rei e, como ele trazia a coroa sobre a peruca (...) não parecia nem um pouco confortável, e o arranjo certamente não lhe ficava bem”.

Também devemos dizer ao STF o mesmo que Alice disse aos juízes e jurados, no fim de seu depoimento, no julgamento do roubo das tortas: “Quem se importa com vocês? (...) vocês não passam de um baralho de cartas!”.

A lástima é que não somos nós, cidadãos, que damos as cartas no Brasil.

Tomara que a “Rainha de Copas” não nos queira cortar as cabeças!

Mas mesmo se quiser, isso tem que mudar!

Luis Henrique Braga Madalena é advogado especialista em Direito Constitucional do escritório Marins Bertoldi Advogados Associados, de Curitiba, Paraná.

Vídeos da notícia

Imagens da notícia

Categorias:
Tags: