Rolês da Copa

Publicado por: redação
05/02/2014 12:12 AM
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“Rolês” da Copa

LUIZ FLÁVIO GOMES, jurista e diretor-presidente do Instituto Avante Brasil.

Alguns dizem que os manifestantes não passam de uns vagabundos desocupados, uns vândalos mentecaptos, que querem só destruir tudo! Outros apoiam os protestos contra a Copa do Mundo no Brasil, que já teria gasto mais dinheiro que toda verba da educação. Na verdade, depois de 514 anos, a conta está chegando! Quem só vê a superfície, não enxergará nunca a profundidade do problema, nem entenderá o complexo Brasil contemporâneo, onde o PIB representa, conforme o sociólogo Jessé Souza, quase 70% em ganhos de capital (lucros e juros), que beneficiam meia dúzia de grandes banqueiros e gigantes industriais, restando pouco mais de 30% (da renda total) para a massa salarial dos outros quase 200 milhões de brasileiros!

Nos países que praticam o elogiável capitalismo financeiro evoluído e distributivo (Dinamarca, Suécia, Coreia do Sul, Japão, Canadá, Holanda, Suíça, Finlândia etc.) a situação é invertida, visto que a grande maioria dos assalariados leva a maior parte da renda nacional. Há mais impostos, mas existe educação de qualidade para todos, saúde, transporte público etc. Nada disso acontece nos países cujas elites burguesas dominantes e seus instrumentos (agentes do Estado, mercado, democracia, manipulação da lei e da sociedade civil) seguem o capitalismo selvagem, extrativista e parasitário, moralmente degenerado e fundado no ignorantismo (3/4 dos brasileiros não sabem ler ou escrever ou não entendem o que lê ou não sabem operações matemáticas mínimas – Inaf). Nos segundos, os protestos não cessam (caso do Brasil); nos primeiros, essa etapa já virou história.

Nem com a pujante e trabalhadora classe C a desigualdade crônica no Brasil diminuiu consideravelmente. Com 0,519 pontos no Coeficiente Gini (2012), que mede a desigualdade na distribuição da renda familiar, o Brasil continua sendo um dos mais desiguais do planeta; nos últimos dez anos a melhora foi de apenas 10%. Essa desigualdade guarda simetria com nosso escabroso IDH (o Brasil está 85ª posição), que revela o índice de desenvolvimento humano com base na expectativa de vida, a educação e o PIB per capita. O Brasil, 0,73 em 2012, é um dos países de precário desenvolvimento; seu PIB per capita (em dólares, 11.303, em 2012) cresce muito devagar.

Caíram na bobagem (violência simbólica de Bourdieu) de dizer que a classe C, com renda per capita familiar de R$ 291 a R$ 1.019, seria uma nova classe média. Agora, com o consumismo se definhando, a classe C começou a entender que de classe média não tem nada, porque os capitais diferenciadores de cada uma delas são completamente desproporcionais (capital econômico, salarial, cultural, social, emocional, moral/ético, familiar etc.). Os melhores salários ou mesmo os mais cobiçados cargos públicos nunca vão para a classe C (que, diferentemente da verdadeira classe média, prioriza o trabalho em detrimento do estudo). No exame do Enem a vantagem das classes superiores é abissal.

A compensação para essa enorme frustração viria com serviços públicos de qualidade (educação, saúde, transportes etc.). Mas nesse item o Brasil é enormemente deficitário. Resultado: frustração, desesperança, ódio, sensação de impotência e indignação, que são os ingredientes necessários para desmoronar qualquer país decadente e socialmente retrocessivo, sobretudo depois da democratização do acesso às redes sociais. O Brasil se tornou extremamente complexo, porque socialmente muito doente (desigual) e moralmente parasitário (degenerado). É uma bomba-relógio de efeito não retardado! Suas crises de febre já são e serão mais ainda muito frequentes. A conta está chegando!

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