MEDIAL SAÚDE CONDENADA - Juíza Marielza Brandão Franco da 29ª Vara Cível de Salvador, condena Medial Saúde

Publicado por: redação
29/03/2011 05:30 AM
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MEDIAL SAÚDE CONDENADA - Juíza Marielza Brandão Franco da 29ª Vara Cível de Salvador, condena Medial Saúde

Inteiro teor da decisão:

0170593-06.2007.805.0001 - ORDINARIA

Autor(s): Rosana Santos Lopes

Advogado(s): Suzelma Araújo de Santana

Reu(s): Medial Saude Sa

Advogado(s): Cristiane Nolasco Monteiro do Rego, Ianna Carla Câmara Gomes

Sentença: Vistos, etc.,

ROSANA SANTOS LOPES, devidamente qualificada nos autos em epígrafe, por advogado legalmente habilitado, ajuizou a presente AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA contra MEDIAL SAÚDE S/A, também já qualificada, aduzindo, em síntese, que é associada ao plano de saúde Réu que recusou-se, injustificadamente, a autorizar a realização de cirurgia necessária ao tratamento de saúde da Autora, portadora de Obesidade Mórbida, cujo excesso de peso desencadeou outras enfermidades. Requer em sede de liminar a autorização para determinar que a Ré interne a Autora no hospital Santo Amaro, em Salvador, com equipe especializa e durante o tempo necessário, até a alta, bem como o custeio de exames, terapias e todos os procedimentos médicos necessários, em especial a cirurgia de Septação Gástrica por videolaparoscopia pela técnica de Fobi-Capella. Ao final, pleiteia a procedência da ação, mantendo a decisão liminar, determinando a internação até a alta definitiva da Autora. Juntada de documentos às fls. 23/38.
Liminar concedida às fls. 40/41
Devidamente citada, a parte Ré apresentou contestação às fls. 44/59, argüindo em preliminar revogação da concessão do pedido de assistência judiciária gratuita. No mérito, que a cirurgia reflete apenas um tratamento de cunho estético e que o procedimento está expressamente excluído da cobertura contratual. Requer, a improcedência dos pedidos, para que se declare a total ausência de obrigação da empresa Ré em arcar com o tratamento, face à inconteste exclusão contratual para procedimentos dessa espécie. Documentos juntados conforme às fls. 60/221.
Anuncio o julgamento antecipado da lide, uma vez que a matéria ventilada é eminentemente de direito. Tal entendimento não pode ser caracterizado como cerceamento de defesa, até mesmo por conta de que a prova objetiva munir o julgador de elementos necessários à formação de seu convencimento. Assim, dispensando o Magistrado a produção de novas provas, sinaliza o mesmo que as provas já constantes dos autos são suficientes ao seu convencimento.

É o Relatório.
Posto isso. Decido.

A demandante pretende ver reconhecido o seu direito ao procedimento solicitado de tratamento de enfermidade denominada de Obesidade Mórbida, qual seja, cirurgia de Septação Gástrica por videolaparoscopia pela técnica de Fobi-Capella, pois o seu Plano de Saúde recusou-se a autorizar o procedimento sob o argumento de que não tinha cobertura contratual.
A preliminar em que a Ré pleiteia revogação da concessão do pedido de assistência judiciária gratuita não merce acolhimento. A Ré alega ausência de provas que demonstrem a impossibilidade da Autora em arcar com as custas processuais e honorários advocatícios sem prejuízo do sustento próprio e da sua família.
Contudo, conforme determina a lei 1060/50, para obtenção da assistência, basta declaração feita pelo próprio interessado de que sua situação econômica não permite vir a Juízo sem prejuízo da sua manutenção ou de sua família. Essa norma infraconstitucional põe-se, ademais, dentro do espírito da Constituição, que deseja que seja facilitado o acesso de todos à Justiça. Vale ressaltar que a presunção de necessidade do benefício é juris tantum, comportando assim prova em contrário, o que não foi feito pela parte Ré, pelo que resta rejeitada a preliminar.
O CDC prescreve que é direito do consumidor ter acesso a produtos e serviços eficientes e seguros, devendo ser informado adequadamente acerca do conteúdo dos contratos por ele firmado para aquisição de produtos e serviços, principalmente no que se refere aquelas cláusulas que limitem os direitos do consumidor, como aquelas que regulem a autorização para procedimentos cirúrgicos.
Nota-se, que a empresa fornecedora, pretende, pelos argumentos insertos em sua contestação, fazer crer que a autora não tinha direito a cobertura do tratamento, posto que há expressa vedação contratual para esse tipo de procedimento.
No entanto, verifica-se que o demandante trouxe aos autos provas contundentes do seu estado clínico, demonstrando através de relatórios médicos que precisa de tratamento de urgência. Dessa forma, não se trata de emagrecimento com a finalidade estética, e sim, trata-se de quadro emergencial ligado a saúde do autor, que demonstrou ter respondido claramente a referida declaração .
Assim, não há justificativa apresentada para fundamentar a sua recusa em prestar os serviços requeridos pela autora, serviços esses previstos em contrato celebrado entre as partes. Portanto, entende-se que a negativa de autorização para tratamento de enfermidade é abusiva, o que por si só demonstra a falta de clareza no contrato, frustrando assim, a legítima expectativa do consumidor. Mesmo porque, é dever do fornecedor, nos termos do artigo 6º, III, da lei consumerista, transmitir as informações necessárias ao consumidor de forma clara e precisa, com base nos princípios da boa fé e da transparência e seus deveres anexos de informação, cooperação e cuidado.
Também, é bom que se diga que quem tem a obrigação de aferir as reais necessidades do estado do consumidor e dos recursos necessários para preservação de sua saúde é o médico, responsável pelo tratamento do paciente, que inclusive responde civilmente pelos danos causados ao mesmo em caso de erro ou negligência médica e, se a seguradora tinha fontes científicas reais para negar a cobertura de procedimento urgente e necessário em um tratamento desta natureza, deveria provar o fato impeditivo do direito da autora, uma vez que o consumidor é a parte hipossuficiente na relação de consumo. Ao contrário, os relatórios médicos apontam a urgência do tratamento para deter a obesidade mórbida e tantas outras co-morbidades que acometem a parte autora, bem como que o procedimento foi o mais indicado.

A jurisprudência vem a favor do autor:

“SEGURO SAÚDE. OBESIDADE MORBIDA. CIRURGIA. RECUSA DE COBERTURA. DESCUMPRIMENTO DO CONTRATO. Ação ordinária de obrigação de fazer c/c pedido de indenização. Recusa da empresa administradora do plano de saúde em autorizar cirurgia. Obesidade morbida. Decisão judicial determinando a prestação do serviço. A obesidade morbida esta catalogada desde 1996 na Associação Médica Brasileira, incorporando-se às enfermidades cobertas, obrigatoriamente, pelo seguro. Logo, a partir do momento em que a moléstia e, oficialmente, reconhecida pela entidade que congrega a sociedade médica, passa a ter regular cobertura, sem que se altere o contrato original. A recusa da Seguradora de Plano de Saúde a autorizar internação para procedimento cirúrgico a hospital a ela credenciado, de paciente que necessitava de intervenção cirúrgica, constitui descumprimento abusivo do contrato. A ser de outro modo, o Capítulo - Do Objeto e a cláusula 18.0, "18.0.9" do contrato, que permite cirurgias em geral, ficariam prejudicados, uma vez que não adiantaria o atendimento pelo profissional que não pudesse realizar o seu trabalho para salvar a vida. Inocorrência de defeito na prestação do serviço ou de ilícito a ensejar a reparação por dano moral. (TJRJ; AC 3620/2005; Rio de Janeiro; Décima Quarta Camara Cível; Rel. Des. Walter Felippe D''agostino; Julg. 21/06/2005)”
“TJBA - APELAÇÃO: APL 803312009 BA 8033-1/2009
Relator(a): MARIA DA PURIFICACAO DA SILVA
Julgamento: 25/11/2009
Órgão Julgador: PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL
Ementa

APELAÇAO CÍVEL. AÇAO DE OBRIGAÇAO DE FAZER. AUTORIZAÇAO PARA INTERNAMENTO EM CLÍNICA DE EMAGRECIMENTO, OU SPA. PRESCRIÇAO MÉDICA. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA QUE EXCLUI DA COBERTURA A POSSIBILIDADE DO TRATAMENTO EM SPA. APELO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. HAVENDO INDICAÇAO MÉDICA PARA TRATAMENTO DE OBESIDADE MÓRBIDA ATRAVÉS DE INTERNAMENTO EM CLÍNICA DE EMAGRECIMENTO, OU SPA, NAO CABE À SEGURADORA NEGAR A COBERTURA SOB O ARGUMENTO DE QUE O TRATAMENTO NAO SERIA ADEQUADO AO PACIENTE, POIS JÁ TERIA SE SUBMETIDO A CIRURGIAS DE SEPTAÇAO GÁSTRICA.”

Em que pese seja a requerida uma instituição privada, que tem nos lucros a sua finalidade precípua, não pode esquecer que os contratos de planos de saúde é um contrato de trato sucessivo, de longa duração, que visa proteger um bem jurídico que é a vida humana e, possui uma enorme importância social e individual, devendo as seguradoras ter consciência que acima da busca de lucros em seu ramo de atividades, está à integridade física e a vida do consumidor.
Assim, não se pode deixar de reconhecer a abusividade da negativa injusta pela empresa ré, prática que fere os princípios da equidade e provoca o desequilíbrio contratual e põe em risco a vida e a saúde dos seus segurados, desnaturando o contrato de seguro saúde.
Não esquecendo que a nova concepção do contrato, sem desprezar totalmente a liberdade de contratar, prestigia a dignidade da pessoa humana ao proclamar que seu conteúdo deve observar os limites da função social dos contratos.
Da mesma forma, constata-se que a empresa ré agiu de forma abusiva, demonstrando falta de compromisso com os princípios básicos que devem nortear os contratos, como boa fé, transparência, dever de informação e confiança.
Não se pode aceitar que práticas abusivas identificadas e condenadas na legislação consumerista continuem a ser exercitadas sem qualquer tipo de censura, o que vem ensejando os Tribunais a coibir tais atitudes com o reconhecimento do direito dos usuários quanto aos serviços defeituosos fornecidos.
A obesidade mórbida, diagnosticada na autora é doença catalogada na Associação Brasileira de Médicos (AMB) desde 1996, e doenças a essa associadas, não podendo a ré negar autorização para a realização de procedimento de internação para tratamento especializado, porque recomendado pelos médicos que a acompanham em seu tratamento e essencial à sua sobrevivência e bem estar.
Portanto, reconheço a obrigação da operadora de saúde de prestar a cobertura do tratamento reclamado que não deve ser limitada por previsão contratual contida em contrato de adesão, unilateralmente redigido e contendo cláusulas abusivas e restritivas e que se contrapõe a legislação que regula a atividade e o próprio CDC.
Assim, por tudo que acima foi exposto, e pelo que dos autos consta, julgo procedente a ação para reconhecer a injustiça da negativa de autorização do tratamento da autora de cirurgia de Septação Gástrica por videolaparoscopia pela técnica de Fobi-Capella, no Hospital Santo Amaro, confirmando a tutela antecipada que determinou a internação até o restabelecimento da sua massa corpórea ideal, ou seja, até a sua alta definitiva.
Condeno, ainda, a réu nas custas processuais e nos honorários advocatícios, que arbitro em 20% (vinte por cento) do valor da condenação atualizada, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20 § 3º do CPC.

P.R.I.

Salvador, 28 de fevereiro de 2011
MARIELZA BRANDÃO FRANCO
Juíza de Direito

Fonte: DPJ BA 28/03/2011

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