Estado da Bahia recorre para não cumprir tratamento Home Care, Desª. Ilza Maria da Anunciação, nega o pedido

Publicado por: redação
18/07/2011 02:30 AM
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Inteiro teor da decisão:

 

 

QUINTA CÂMARA CÍVEL – TJBA

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 0008030-29.2011.805.0000-0 DE SALVADOR

AGRAVANTE: ESTADO DA BAHIA

PROCURADOR: ANDRÉ ÂNGELO RAMOS COELHO MORORÓ

AGRAVADA: LUZIA MUNIZ DE AMORIN

ADVOGADOS: CAROLINE MUNIZ CAMPOS E OUTROS

RELATORA: DESA. ILZA MARIA DA ANUNCIAÇÃO

D E C I S Ã O

Trata-se de Agravo deInstrumento com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo Estado da Bahia, em face da decisão de fls. 72/75, proferida pelo MM Juiz da 02ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Senhor do Bonfim, que, nos auto da Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais c/c Obrigação de Fazer e pedido de tutela antecipada, registrada sob o n° 0003347-27.2010.805.0244, deferiu a liminar antecipatória pleiteada.

A autora, ora agravada, ingressou com uma ação indenizatória, objetivando, liminarmente, ordem judicial, para que a demandada autorizasse o serviço de internamento domiciliar (home care), ao argumento de contar com idade avançada, 60 anos, e que após submeter-se a cirurgia de revascularização do miocárdio, apresentou gravíssimas sequelas, que descreveu, nos termos do relatório médico que mencionou, como sendo: “trombose aguda da carótida esquerda, sendo re-abordada pela equipe de cirurgia vascular, evoluindo com sequela neurológica de hemiplegia direita e expressão, compatível com quadro de AVCI confirmado na TC de crânio” . Asseverou que mesmo apresentando quadro de saúde delicado e tendo os relatórios médicos indicado tratamento especializado e contínuo para a sua recuperação, o PLANSERV negou-lhe o serviço de atendimento domiciliar (home care).

Assim, prossegue a autora, além do seu estado de saúde, que reclama tratamento contínuo em um ambiente familiar, o tratamento domiciliar implica verdadeira economia ao PLANSERV, pois elimina os altos custos gerados pelo internamento hospitalar, além de minorar os riscos de um infecção. Também, representa proteção à saúde e promoção da dignidade humana. Requereu medida de urgência para que a demandada fosse compelida a fornecer o tratamento domiciliar, sob pena de multa de R$ 3.000,00 (três mil reais). No mérito, pugnou pela confirmação da liminar e procedência dos pedidos de danos morais e materiais, em face dos prejuízos sofridos em ambas as esferas.

O magistrado de primeiro grau concedeu a liminar antecipatória, determinando que a demandada autorizasse o serviço pleiteado, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Inconformado, o Estado da Bahia interpôs o presente agravo de instrumento, argumentando, inicialmente, a ilegalidade da liminar deferida, haja vista ter esgotado o objeto da demanda. No mérito, aduziu que o PLANSERV, além de não almejar lucro no exercício de sua atividade, não pode ser comparado às pessoas jurídicas prestadoras de serviço de saúde privada, pois representa, apenas, um conjunto de benefícios médicos disponibilizados aos servidores do Estado da Bahia, contribuintes do sistema, e seus dependentes. Pugnou, assim, pela concessão de efeito suspensivo e no mérito pelo provimento do recurso.

É o relatório.

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do presente agravo de instrumento e conforme a sistemática do art. 527 do CPC, passo ao exame do mérito recursal, porque presente uma das hipóteses previstas no art. 557 do mesmo diploma legal.

A regra contida no art. 1º, § 3º da Lei 8.437/92, que veda a concessão de liminar que esgoto, no todo ou em parte, o objeto da demanda, tem sido flexibilizada pela jurisprudência do STJ, quando, presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, a especificidade do caso concreto seja capaz de justifica a concessão da medida de urgência. (REsp 1053299/RS, Rel. Ministra Denise arruda, 1ª T, julgado em 10/11/2009, DJe 27/11/2009). Assim, só se pode falar em violação ao retromencionado dispositivo legal, considerando o caso concreto, e não em tese.

Nada obstante conduza o agravante a sua argumentação no sentido de que os serviços de saúde prestados pelo Estado aos correlatos servidores e seus dependentes não se confundem com os planos de saúde privados, o fato é que os mencionados serviços se submetem às disposições do CDC, conforme o enunciado nº 269 da Súmula do STJ, a qual não limitou a extensão de sua aplicabilidade, verbis:

“Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde”.

Ainda que assim não fosse, entendo que a vulnerabilidade da agravada, conjugada com o seu gravíssimo quadro de saúde, autorizam a máxima extensão dos efeitos que derivam dos postulados da boa-fé e função social do contrato, ambos previstos nos arts. 421 e 422 do CC/2002, a projetar, em bases seguras, a tutela do direito fundamental a uma vida digna.

Bem, o fato é que, ostentem os serviços prestados pelo PLANSERV natureza institucional ou privado, sejam regidos ou não pedo CDC, são eles de extração constitucional, prestados pelo próprio Estado, a quem foi cometido o dever prestacional primário de proteger, preservar e promover a saúde de todos, conforme dicção do art. 196 da CF/88, sob pena de incidir em “gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado”, conforme já decidiu o Pretório Excelso no AgReg em RE nº 393175, 2ª T, Rel. Min. Celso de Mello, Julgado em 12/12/2006 e no Pedido de Suspensão nº 4229, Ministro César Peluso.

No entanto, para que se possa desfrutar dos serviços prestados pelo PLANSEV, necessário se faz a adesão a um plano previamente estabelecido e contribuições mensais, assemelhado-se aos planos genuinamente privado, a significar a existência de autonomia quando da adesão ao plano e conhecimento das suas condições.

Assim, a priori e abstratamente não se pode ter como prevalente a pretensão de o beneficiário do plano de saúde, mantido pelo Estado, ter acesso a determinados tratamentos, quando a eles se opõem uma ordem normativa legítima, que, conjugada com os elementos fáticos do caso concreto, mostra-se capaz de obstar a concretização do pretenso direito, SEM, CONTUDO, ANIQUILAR O SEU NÚCLEO ESSENCIAL, que, na hipótese, é a garantia de proteção à saúde. Limitar é possível; o que não se admite em tema relacionado à saúde é o total afastamento de sua garantia.

In casu, os fatos aduzidos demonstram que a agravada é uma senhora de 60 (sessenta) anos, ao que tudo indica, reclusa ao leito em virtude de um acidente vascular cerebral (AVC), e que possui gravíssimos problemas de saúde, com recomendação médica de tratamento domiciliar, conforme se pode constatar da decisão concessiva da liminar atacada sem qualquer objeção, quanto a esse aspecto, por parte do Estado agravante.

Sendo a internação domiciliar o tratamento eficaz para propiciar a recuperação da agravada, evitando risco de infecção capaz de afetar a própria manutenção da sua vida, pessoa com sérios problemas de saúde, certo é que não poderá o Estado da Bahia furtar-se da cobertura do mencionado tratamento, superpondo à vida óbices de ordem patrimonial ou de conformação infraconstitucional, SALVO SE DEMONSTRAR QUE OUTRO TRATAMENTO É TÃO EFICAZ QUANTO O PRESCRITO PELO MÉDICO DA AGRAVADA. A preservação da vida em tempos de paz é a maior das garantias em um Estado Constitucional Democrático; é um valor que antecede aos demais, sem o qual nenhum outro teria sentido.

A fim de preservar, o tanto quanto possível, a autonomia da vontade dos contratantes, evitando o esvaziamento total do seu núcleo essencial, que é o respeito às limitações legítimas que fazem as partes no ato de contratar, deve a agravada, mensalmente, apresentar relatório médico circunstanciado do seu quadro e evolução clínicos, elaborados pelo seu médico, assim como permitir uma inspeção mensal por parte do PLANSERV, ora agravante, por intermédio de pessoal especializado, sob pena de se firmar a convicção da desnecessidade da permanência do internamento.

Desse modo, com fulcro no art. 557 do CPC, NEGO PROVIMENTO AO PRESENTE AGRAVO DE INSTRUMENTO, condicionando a eficácia deste provimento à obediência do quanto aqui determinado.

Publique-se.

Salvador, 14 de julho de 2011.

Desa. Ilza Maria da Anunciação

RELATORA

 

Fonte: DJE Ba

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