Por que políticos ofendem e agridem jornalistas?

Publicado por: redação
03/04/2014 07:58 AM
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Escrito por Nathália Carvalho 

Repórter da Rede TV, Manuela Borges gostaria que o acontecimento na manhã dessa terça-feira, 1° de abril, fosse apenas uma piada de mau gosto pelo Dia da Mentira. Ofendida pelo deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), a jornalista é mais uma na lista dos agredidos por políticos, como já aconteceu com Márcia Pache, da TV Centro Oeste; Felipe Recondo, do Estadão; Oscar Filho, do CQC; e outros (veja, abaixo, os detalhes de cada caso). A questão que fica é: por que isso acontece? Para entender a questão, o Comunique-se conversou com Rudolfo Lago, profissional com quase 30 anos de jornalismo e carreira na cobertura política, e Cibele Buoro, repórter e pesquisadora de jornalismo político.
Manuela Borges foi ofendida pelo deputado Jair Bolsonaro nesta semana (Imagem: Reprodução/SBT)
"O jornalista recebe procuração informal da sociedade para estar em lugares e conversar com pessoas que a maioria da população não tem acesso. Com isso, é dever do repórter representar o cidadão perguntando o que ele deseja saber e nem sempre isso é agradável", explicou Lago. Para o profissional, parte dos políticos brasileiros não entende a função da imprensa e, atualmente, o país vive momento de radicalização. "Os dois lados erram. Existe parte da imprensa que saiu do ponto adequado de distanciamento para assumir posição clara e, assim, já se coloca como adversário de determinados políticos".

A situação, porém, não é algo novo no país. Lago ressalta que sempre aconteceram conflitos entre autoridades e jornalistas. Ele, inclusive, já passou por isso. "Quando trabalhava para o Correio Braziliense, o ex-senador Luís Estevão, e em inves de responder minha pergunta, me expulsou de seu gabinete. Ele chamou seguranças que me tiraram do local durante a coletiva de imprensa. Tem que ter muito sangue frio para não revidar".


Rudolfo Lago e Cibele Buoro (Imagens: Divulgação)Cibele falou que nem todos os políticos agem dessa maneira, mas que a grande maioria não entende que o cargo não pertence a ele, mas sim ao cidadão, que confiou a ele seu voto. "Ocupar um cargo público é trabalhar pelo interesse público, com espírito público, é viver 'para a' política e não 'dá' política. Quando um jornalista o questiona está fazendo seu papel, o trabalho dele é perguntar, e o político deve sim explicações ao cidadão, deve transparência e responder por seus atos. É claro que quando um jornalista indaga um político mal intencionado, antiético e longe do espírito público, acontecem agressões, xingamentos e insultos - atitudes inadmissível que não condiz com o projeto de democracia que o Brasil vem pedindo".

Atual professora do curso de "Jornalismo Político" do Comunique-se Educação, Cibele, que já passou por Folha de S. Paulo, IstoÉ e Gazeta Mercantil, acredita que o Brasil está seguindo o caminho que rejeita atitudes como essas. "Exemplo recente foi o que aconteceu nos movimentos de junho de 2013, quando jornalistas foram gravemente feridos por uma polícia agressiva a mando de um governo intolerante. Nesta semana, fez 50 anos de ditadura e o que aconteceu em junho do ano passado não foi muito diferente se olharmos pela perspectiva da violência, da negação dos direitos e liberdade de expressão. Um amplo debate social precisa acontecer, para que jornalistas e cidadãos possam questionar autoridades que fazem uso de um cargo público".

Sobre os prejuízos, além do trauma para o profissional que passa por situações de agressão, Lago observou que a sociedade acaba ficando mal informada. "No meu caso, por exemplo, os leitores do Correio Braziliense ficaram sem a informação daquela coletiva. Quem perde é o cidadão". Cibele compartilha da mesma opinião e acrescenta que é inadmissível que o repórter passe por isso. "É imoral, é covarde, é traiçoeiro. As agressões e violência contra jornalistas, cidadãos, minorias e aos pobres desse país são sinais claros do autoritarismo herdado de governos repressores. Quando fatos como esses acontecem e nada é feito, perdemos sempre mais uma oportunidade de debater e lutar para cobrar punições".

Quando questionados sobre como o jornalista pode se proteger de agressões e insultos, ambos afirmaram que as situações são inerentes à profissão. "Faz parte do trabalho do jornalista entrevistar, estar em contato com pessoas o tempo todo, e não podemos prever as reações de um ser humano. O que precisa é fortalecer a imprensa como órgão livre, o jornalista como profissional respeitado, e punição aos agressores. A impunidade é responsável pela violência e pelas agressões, estimulando-as ainda mais", disse Cibele.

Relembre os casos
Manuela Borges
Nessa terça-feira, 1° de abril, a jornalista Manuela Borges, da Rede TV, foi chamada de idiota e de analfabeta pelo deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que defende o regime militar. No plenário, que lembrava os 50 anos do golpe, um tumulto provocado durante o discurso do parlamentar fez com que a sessão fosse encerrada.

 
 

Márcia PacheProfissional da TV Centro Oeste, afiliada ao SBT em Pontes e Lacerda (MT), em 2010, a jornalista Márcia Pache foi agredida pelo ex-vereador Lourivaldo Rodrigues de Morais (DEM), conhecido como Kirrarinha, que bateu em seu rosto. Márcia não foi defendida por ninguém que estava por perto. À época, a Direção Nacional dos Democratas prometeu expulsar o político do partido, o que não ocorreu. Mais tarde, Kirrarinha se tornou presidente municipal da legenda e secretário municipal.

 
 

 

Felipe RecondoNo ano passado, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, mandou o repórter Felipe Recondo, do Estadão, "chafurdar no lixo" e o chamou de "palhaço". Depois, divulgou nota em que pediu desculpas aos profissionais da imprensa e afirmou que respondeu de forma "ríspida" por estar com "fortes dores". Posteriormente, em entrevista ao O Globo, o ministro se referiu ao jornalista como "personagem menor".

 
 

 

Oscar FilhoNo primeiro 'Proteste Já' desta temporada do 'CQC', o repórter Oscar Filho foi agredido pelo assessor de imprensa da prefeitura de Esperantina (PI), Gil Sobreira, e registrou Boletim de Ocorrência em delegacia local. Sobreira não quis conceder entrevista e foi agressivo, tentando intimidar a equipe. “Gritou, empurrou a mim e o cinegrafista, tentou tomar meu microfone, e deu um soco na câmera. Para o azar dele, machucou o dedo neste momento. Veio na minha direção e passou o dedo dele com sangue na minha camisa, talvez para tentar me incriminar mais tarde”, relatou Filho.

 

FONTE:  Escrito por Nathália Carvalho  COMUNIQUE-SE

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