SUL AMÉRICA CONDENADA - Juíza Marielza Brandão Franco da 29ª Vara Cível de Salvador, condenou Sul América Saúde

Publicado por: redação
31/03/2011 01:30 AM
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SUL AMÉRICA CONDENADA - Juíza Marielza Brandão Franco da 29ª Vara Cível de Salvador, condenou Sul América Saúde

AÇÃO ORDINÁRIA

 


Inteiro teor da decisão:

0033875-02.2007.805.0001 - ORDINARIA

Autor(s): Claudionora Santos Pessoa

Advogado(s): João Gustavo dos Santos Caldas

Reu(s): Sulamerica Saude

Advogado(s): Maria Auxiliadora Garcia Durán Alvarez

Sentença: Vistos etc.,
CLAUDIONORA SANTOS PESSOA, devidamente qualificada nos autos, por advogado legalmente habilitado, ajuizou a presente AÇÃO ORDINÁRIA CONTRA SULAMERICA SEGURO SAÚDE, também já qualificada, aduzindo em síntese que celebrou contrato de seguro de saúde com a Ré e que sendo acometida de artrose generalizada precisou realizar cirurgia inclusive com utilização de prótese, mas não foi autorizada a cobertura das despesas. Alega que a negativa do procedimento pode levar ao agravamento do estado de saúde da autora e pede a antecipação de tutela para obter autorização para o procedimento sem qualquer ônus a mesma. Juntou os documentos de fls. 07/24.
Liminar concedida às fls. 26/27.
Citada, a ré apresentou contestação às fls. 31/38 e sustenta que a negativa ocorreu somente por falta de cobertura do contrato para o procedimento solicitado e que o contrato foi assinado pelo Demandante, tendo este declarado a ciência de todas as cláusulas. Alega, ainda, que o contrato deve ser regido pelo Código Civil de 1916, sendo ato formal e considerado perfeito desde o momento em que o segurador remeteu a apólice ao segurado. Pede a improcedência do pedido, juntando os documentos de fls. 39/66.
Réplica às fls. 85/87.
Em audiência de fls. 103, impossibilitada restou a tentativa de conciliação, sendo s autos remetidos para análise final.

Relatado, decido.

A Demandante pretende ver reconhecido o seu direito de cobertura do procedimento solicitado para realização de cirurgia de artrose generalizada com inclusão de materiais exigidos para o ato cirúrgico, pois, o seu Plano de Saúde recusou-se a cobrir tal procedimento sob o argumento de que não existia cobertura contratual para o procedimento.
O CDC prescreve que é direito do consumidor ter acesso a produtos e serviços eficientes e seguros, devendo ser informado adequadamente acerca do conteúdo dos contratos por ele firmado para aquisição de produtos e serviços, principalmente no que se refere aquelas cláusulas que limitem os direitos do consumidor, como aquelas que regulem a autorização para procedimentos cirúrgicos.
Nota-se, que a empresa fornecedora, pretende, pelos argumentos insertos em sua contestação, justificar a injusta negativa do material cirúrgico pela falta de cobertura do procedimento, uma vez que o contrato exclui expressamente a realização de cirurgia com inserção de próteses.
Vale observar que a lei 9656/98 regula os planos de saúde e, no seu artigo 10, determinou que só pode haver exclusão de cobertura para este tipo de procedimento se este não estiver ligado ao ato cirúrgico.
Assim, ainda que o contrato tenha sido assinado antes da lei citada, caracteriza como abusiva a cláusula contratual que excluía da cobertura qualquer negativa de autorização de materiais necessários ao ato cirúrgico, como é a hipótese dos presentes autos, pois o procedimento solicitado estava ligado ao ato cirúrgico.
Assim, a justificativa apresentada é pálida e desprovida de fundamento, porque a cláusula limitativa aludida pelo fornecedor para justificar a negativa de autorização para uso dos materiais cirúrgicos é abusiva, o que por si só já demonstra a falta de clareza no contrato e restrinja tratamento necessário, frustrando a legítima expectativa do consumidor, pois existia justificativa clínica que demonstrou a sua efetiva necessidade de utilização no procedimento cirúrgico solicitado, conforme solicitação em caráter emergencial de fls. 19. Mesmo por que é dever do fornecedor, nos termos do artigo 6º, III, da lei consumerista, transmitir as informações necessárias ao consumidor de forma clara e precisa, com base nos princípios da boa fé e da transparência e seus deveres anexos de informação, cooperação e cuidado.
Analisando a recusa da seguradora quanto à alegada pertinência dos matérias cirúrgicos necessários para o procedimento cirúrgico e não havendo qualquer indício de má-fé da autora/segurada, são nulas de pleno direito qualquer cláusula que contrarie os princípios supra mencionadas, principalmente o principio da lealdade nas relações contratuais que deve nortear qualquer contrato.
Isso porque quem tem a obrigação de aferir as reais necessidades do estado do consumidor e dos recursos necessários para preservação de sua saúde é o médico responsável pela cirurgia, que inclusive responde civilmente pelos danos causados ao seu paciente em caso de erro ou negligência médica e a seguradora não pode negar a cobertura de procedimento urgente e necessário em uma cirurgia desta natureza, uma vez que o consumidor é a parte hipossuficiente na relação de consumo.

A jurisprudência vem a favor do autor:
“Plano de saúde – Recorrente nega-se a pagar prótese necessária à cirurgia cardíaca efetuada, sob a alegação de que a prótese está excluída da cobertura – Nulidade de cláusula abusiva, pois coloca o recorrido em desvantagem excessiva – Ofensa ao princípio da boa fé. – Limitação ao princípio da autonomia da vontade – Recurso improvido. Sentença mantida na íntegra. Condenação do recorrente em custas e honorários.” (Proc. 57654-9/2002 - 2ª - TRJE-Ba – Relatora Rosita Falcão de Almeida Maia)
Em que pese seja a requerida uma instituição privada, que tem nos lucros a sua finalidade precípua, não pode esquecer que os contratos de planos de saúde é um contrato de trato sucessivo, de longa duração, que visa proteger um bem jurídico que é a vida humana e, possui uma enorme importância social e individual, devendo as seguradoras ter consciência que acima da busca de lucros em seu ramo de atividades, está à integridade física e a vida do consumidor.
Assim, não se pode deixar de reconhecer a abusividade da negativa injusta pela empresa ré, prática que fere os princípios da equidade e provoca o desequilíbrio contratual e põe em risco a vida e a saúde dos seus segurados, desnaturando o contrato de seguro saúde.
Não esquecendo que a nova concepção do contrato, sem desprezar totalmente a liberdade de contratar, prestigia a dignidade da pessoa humana ao proclamar que seu conteúdo deve observar os limites da função social dos contratos.
Da mesma forma, constata-se que a empresa ré agiu de forma abusiva, demonstrando falta de compromisso com os princípios básicos que devem nortear os contratos, como boa fé, transparência, dever de informação e confiança.
Não se pode aceitar que práticas abusivas identificadas e condenadas na legislação consumerista continuem a ser exercitadas sem qualquer tipo de censura, o que vem ensejando os Tribunais a coibir tais atitudes com o reconhecimento do direito de indenização pelos danos morais suportados pelos usuários quanto aos serviços defeituosos fornecidos.
Assim, por tudo que acima foi exposto, e pelo que dos autos consta, julgo PROCEDENTE a ação para reconhecer a injustiça da negativa de autorização da cirurgia da autora com utilização dos materiais cirúrgicos descriminados à fls. 19, confirmado a tutela antecipada deferida e determinar que a empresa ré arque com o valor do procedimento, declarado abusiva qualquer cláusula que veda a utilização do procedimento cirúrgico utilizado.

Condeno, ainda, a réu nas custas processuais e nos honorários advocatícios, que arbitro em 20% (vinte por cento) do valor da condenação atualizada, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20 § 3º do CPC.

P.R.I.

Salvador, 28 de Fevereiro de 2011.

MARIELZA BRANDÃO FRANCO
Juíza Titular da 29ª Vara de Relação de Consumo

 

Fonte: Diário de Justiça da Bahia

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