MINAS BRASIL SEGUROS CONDENADA - Juíza Marielza Brandão Franco da 29ª Vara Cível de Salvador, condenou a Minas Brasil Seguros

Publicado por: redação
31/03/2011 10:30 PM
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MINAS BRASIL SEGUROS CONDENADA - Juíza Marielza Brandão Franco da 29ª Vara Cível de Salvador, condenou a Minas Brasil Seguros

0172644-87.2007.805.0001 - COBRANCA

Autor(s): Ana Francisca Da Silva
Representante(s): Ana Lucia Silva De Abreu

Advogado(s): Camila Angélica Canário, Eduardo Feldhaus, Maria Auxiliadora S. B. Texeira

Reu(s): Minas Brasil Seguros

Advogado(s): Eduardo Fraga

Sentença: Vistos etc.,
ANA FRANCISCA DA SILVA, representada por sua curadora ANA LÚCIA SILVA DE ABREU, devidamente qualificadas nos autos, ingressou com a presente ação contra MINAS BRASIL SEGUROS, referente a seguro coletivo de vida e incapacidade firmado em 01 de outubro de 1972, tendo como Estipulante a Prefeitura de Salvador/BA. Alega que sofreu um acidente Vascular Cerebral (AVC), sendo internada em 29 de dezembro de 2000. Contudo, ao pleitear o pagamento do valor segurado, bem como do sinistro, não obteve qualquer resposta da seguradora Ré. Afirma que passou por constrangimentos e humilhações ao necessitar do serviço que pagou regularmente durante vários anos e não ser atendida. Requer o pagamento o valor atualizado estipulado no contrato de seguro, bem como indenização por danos morais na importância de 50 (cinquenta) salários mínimos. Pediu, ainda, a concessão de assistência judiciária gratuita. Juntou os documentos de fls. 08/49.
Benefício da assistência judiciária gratuita deferido às fls.51.
Citada, a Ré apresentou contestação às fls. 65/83, argüindo em preliminar carência de ação e prescrição. No mérito, aduz que o pedido da Autora não pode prosperar porque não houve negativa de pagamento por parte da Ré. Alega que valor do prêmio não foi liberado porque a autora não apresentou os documentos necessários à comprovação dos fatos, bem como que a seguradora considera como data da invalidez a relativa à concessão da aposentadoria pelo Instituto Nacional de Seguro Social, no caso, novembro de 1994, pelo que estaria prescrito o direito de ação. Sustenta que não se configura o dever de indenizar sem a comprovação dos fatos alegados. Pede a improcedência da ação, juntando os documentos de fls. 84/119.
Réplica às fls. 122/139
Designada audiência de conciliação, não houve acordo (fls. 147), abrindo-se prazo para que as partes especifiquem as provas que desejam produzir.
No despacho saneador proferido às fls. 152/153 foram afastadas as preliminares aventadas, sendo designada audiência de instrução e julgamento. Nesta foram colhidos o depoimento da parte ré, sendo ainda inquirida uma testemunha arrolada pela autora. Após, foi realizado o debate oral e, verificando que a autora é curatelada, chamado à ordem o representante do Ministério Público (fls. 162).
Memoriais apresentados às fls. 169/176 e 178/181.
Em parecer costado às fls. 183/189, o representante do Ministério Público manifesta-se no sentido de conceder à autora a indenização pleiteada, condenando a seguradora ao cumprimento das obrigações contratuais.

É o relatório. Decido.

Inicialmente é bom esclarecer que o CDC, instituído pela Lei nº 8.078/90, contem matéria de ordem pública e interesse social e passa a regular todos os contratos consumeristas e, em seu artigo 2º, estabeleceu como sendo consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Na hipótese em discussão restou caracterizada a relação de consumo, pois contratos desta natureza se enquadram no conceito previsto na legislação especial.
No mérito, verifica-se que a Ré sustenta que, em verdade, não houve negativa de pagamento do sinistro porque a requerente não teria apresentado os documentos necessários à verificação de existência do direito pleiteado.
O CDC tem como princípios basilares e gerais a boa-fé e o equilíbrio nas relações de consumo, previstos no seu art. 4º que estabelece que “as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”.
Tais normas promoveram verdadeira revolução nos contratos consumeristas e permitem ao Juiz a interpretação que transcende à literalidade das cláusulas contratuais, buscando uma visão interpretativa mais favorável ao consumidor contratante de boa-fé, que nem sempre é informado do real conteúdo e sentido dessas cláusulas.
A professora e estudiosa dos contratos à luz do CDC CLÁUDIA LIMA MARQUES defende:

"O primeiro instrumento para assegurar a equidade, a justiça contratual, mesmo em face dos métodos unilaterais de contratação em massa, é a interpretação judicial do contrato em seu favor. Inspirado no art. 1.370 do Código Civil Italiano de 1942, o CDC, em seu art. 47, institui como princípio geral a interpretação pró-consumidor das cláusulas contratuais.” (Contratos no Código de Defesa do Consumidor, Ed. Revista dos Tribunais, 2ª ed., pág.283)

Essa tendência interpretativa ocorre principalmente quando o vínculo de consumo se forma através da adesão do consumidor a um contrato padrão elaborado unilateralmente pelo fornecedor, como ocorre no caso ora em análise.
As novas normas que regem os contratos, que foram trazidas por concepção contida do CDC, optam por proteger não só a vontade das partes, mas principalmente os legítimos interesses e expectativas dos consumidores.
Por conta disso, a interpretação do contrato objeto do litígio deve ser feita de forma mais favorável ao acionante, mesmo porque, a requerida traz a lume método interpretativo flagrantemente prejudicial ao consumidor, que, no caso, não foi devidamente informado quanto às regras contratuais impostas.
O CDC prescreve que é direito do consumidor ter acesso a produtos e serviços eficientes e seguros, devendo ser informado adequadamente acerca do conteúdo dos contratos por ele firmado para aquisição de produtos e serviços, principalmente no que se refere aquelas cláusulas que limitem os direitos do consumidor, como as que restringem o direito de cobertura indenizatória, requerida pelo Autor.
Ocorre que, no caso, a Seguradora Ré agiu de forma a descumprir o contrato por ela própria formulado, pois não prestou de forma eficiente o serviço que lhe foi atribuído.
Observe que sequer estabeleceu a seguradora uma comunicação eficaz com a segurada, tendo em vista que não se manifestou a respeito do pedido de pagamento do prêmio previsto na apólice de seguro, deixando como única alternativa à autora buscar a tutela jurisdicional.
Não se pode deixar de ressaltar que a invalidez reclamada, foi reconhecida pelo INSS quando da concessão da aposentadoria da autora – fls.94, pelo que se torna desprovida de qualquer fundamento a resistência da seguradora em pagar o benefício segurado.
Além disso, a invalidez permanente também está devidamente comprovada uma vez que a autora foi interditada através de prévio processo judicial conforme fls. 97/98, por não possuir condições de gerir a sua vida e negócios, muito menos exercer atos da vida civil ou exercer atividades profissionais.
Assim, constata-se, que a Empresa Ré agiu de forma abusiva, demonstrando falta de compromisso com os princípios básicos que devem nortear os contratos, como boa fé, transparência, dever de informação e confiança, causando a autora o conseqüente constrangimento de ter que ficar sem receber os valores efetivamente devidos pelo seguro que contratou.
Quanto ao pedido de danos morais, podemos constatar que o ordenamento jurídico aplicável ao consumidor visa amparar o cidadão para evitar injustiças e violação de princípios relevantes, principalmente quando o contrato se caracteriza como de adesão, porque, nestes é flagrante a vulnerabilidade do consumidor, em vista da discrepância de conhecimentos técnicos e econômicos entre as partes.
No caso em exame, não resta dúvida, que a requerente sofreu constrangimentos, desassossego, transtornos, aborrecimentos e desconforto, ao permanecer por vários meses tentando solucionar o seu problema de saúde, por conta da conduta da empresa seguradora ao não autorizar a liberação do prêmio estabelecido no contrato.
Não se pode aceitar que práticas abusivas identificadas e condenadas na legislação consumerista continuem a ser exercitadas sem qualquer tipo de censura, o que vem ensejando os Tribunais a coibir tais atitudes com o reconhecimento do direito de indenização pelos danos morais suportados pelos usuários quanto aos serviços defeituosos fornecidos.
Quanto ao montante a ser fixado a título de danos morais é certo afirmar que o quantum da indenização pelo dano moral é fixado por critérios subjetivos aferidos pelo juiz.
O princípio da razoabilidade apenas recomenda que se observem certos parâmetros com fins de se evitar o enriquecimento ilícito.
Nesse sentido:

“O valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça, sendo certo que a indenização a esse título deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. Ademais, deve procurar desestimular o ofensor a repetir o ato.” (STJ, Quarta Turma, RESP 24727/SE, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 05/06/2000, p 174).

Diante do exposto, e do mais que dos autos consta, julgo PROCEDENTE a presente ação para condenar a Ré no pagamento ao Autor da quantia indenizatória estabelecida na apólice de seguro de vida, devidamente corrigida a partir da data da aposentadoria e acrescida de juros moratórios de 1% ao mês pelo INPC desta a data da citação, devendo o quantum ser avaliado em fase de liquidação nos termos do art. 475-A e ss. do CPC, e arbitrar a título de indenização por danos morais, em face da intensidade dos dissabores suportados pela autora, a quantia de R$15.000,00 (quinze mil reais), corrigidos monetariamente a partir do ajuizamento da ação.
Condeno, ainda, a Ré ao pagamento nas custas processuais e nos honorários advocatícios, que arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação atualizada, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20 § 3º do CPC.

P.R.I.

Salvador, 22 de Março de 2011.

MARIELZA BRANDÃO FRANCO
Juíza de Direito Titular

Fonte: Diário de Justiça da Bahia

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