GOLDEN CROSS CONDENADA - Juíza Marielza Brandão Franco, da 29ª Vara Cível de Salvador, condena a Golden Cross

Publicado por: redação
11/04/2011 04:30 AM
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GOLDEN CROSS CONDENADA - Juíza Marielza Brandão Franco, da 29ª Vara Cível de Salvador, condena a Golden Cross
AÇÃO ORDINÁRIA

 

Inteiro teor da decisão:

 

0065903-91.2005.805.0001 - COMINATORIA

Autor(s): Eliana Maria Veiga Conceicao

Advogado(s): Wilker Campos Chagas

Reu(s): Golden Cross

Advogado(s): André Magno Silva Bezerra, Jaime Augusto Freire de Carvalho Marques, Luciana Muccini

Sentença: Vistos, etc.,
ELIANA MARIA VEIGA CONCEIÇÃO, devidamente qualificada nos autos em epígrafe, por advogado legalmente habilitado, ajuizou a presente AÇÃO ORDINÁRIA com pedido de TUTELA ANTECIPADA, contra GOLDEN CROSS, também já qualificada, aduzindo, em síntese, que é associada ao plano de saúde da Ré, e embora esteja em dia com o pagamento das mensalidades referentes ao plano, a Ré recusou-se a fornecer um tratamento de urgência a qual necessita a Autora, haja vista que a mesma é portadora da enfermidade Obesidade Mórbida, de grau III, sendo muito severa, cujo excesso de peso desencadeou outras enfermidades denominadas co-morbidades.
Ressalta, que está em iminente risco de vida, e que necessita, com urgência, de internação em clínica especializada, qual seja, a Clínica Médica Salute Bahia.
Ademais, requer em sede de liminar a autorização para determinar que a Ré interne a Autora na clínica endocrinológica especializada (Salute Bahia), durante o tempo necessário, até a alta, bem como o custeio de exames, terapias e procedimentos médicos. E ao final, pleiteia a procedência da ação determinando a manutenção da internação da Autora até a sua alta definitiva. Juntada de documentos às fls. 07/52.
Liminar concedida às fls. 81/82.
Devidamente citada, a parte Ré apresentou contestação às fls. 62/71, argüindo que o local em que a Autora foi recomendada a realizar o seu tratamento, Salute Bahia, não reflete cunho de clínica especializada , e sim, é um local de internamento em SPA, que tem a finalidade exclusiva de lazer, estando, portanto, expressamente excluído no contrato do seguro.
Requer, a improcedência dos pedidos, para que se declare a total ausência de obrigação da empresa Ré em arcar com o tratamento estético de internamento da Autora no SPA, face à inconteste exclusão contratual para procedimentos dessa espécie. Documentos juntados conforme às fls. 72/73.
Réplica às fls. 75/80.
Em audiência de conciliação de fls. 232, não foi possível qualquer acordo.
Anuncio o julgamento antecipado da lide, uma vez que a matéria ventilada é eminentemente de direito. Tal entendimento não pode ser caracterizado como cerceamento de defesa, até mesmo por conta de que a prova objetiva munir o julgador de elementos necessários à formação de seu convencimento. Assim, dispensando o Magistrado a produção de novas provas, sinaliza o mesmo que as provas já constantes dos autos são suficientes ao seu convencimento.
É o Relatório.
Posto isso. Decido.
A demandante pretende ver reconhecido o seu direito ao procedimento solicitado de tratamento de enfermidade, qual seja Obesidade Mórbida, cujo caráter é emergencial, pois o seu Plano de Saúde recusou-se a autorizar o procedimento sob o argumento de que não tinha cobertura contratual.
O CDC prescreve que é direito do consumidor ter acesso a produtos e serviços eficientes e seguros, devendo ser informado adequadamente acerca do conteúdo dos contratos por ele firmado para aquisição de produtos e serviços, principalmente no que se refere aquelas cláusulas que limitem os direitos do consumidor, como aquelas que regulem a autorização para procedimentos cirúrgicos.
Nota-se, que a empresa fornecedora, pretende, pelos argumentos insertos em sua contestação, fazer crer que a autora não tinha direito a cobertura do tratamento, posto que além de alegar que a clínica indicada não tem cunho de clínica especializada, afirma que a autora não juntou prova capaz de provar que sua vida estava ameaçada.
No entanto, verifica-se que a demandante trouxe aos autos provas contundentes do seu estado clínico, demonstrando através de relatórios médicos e fotos, que precisa de tratamento de urgência. Dessa forma, não se trata de emagrecimento com a finalidade estética, e sim, trata-se de quadro emergencial ligado a saúde da autora.
Assim, não há justificativa apresentada para fundamentar a sua recusa em prestar os serviços requeridos pela autora, serviços esses previstos em contrato celebrado entre as partes. Portanto, entende-se que a negativa de autorização para tratamento de enfermidade é abusiva, o que por si só demonstra a falta de clareza no contrato, frustrando assim, a legítima expectativa do consumidor. Mesmo porque, é dever do fornecedor, nos termos do artigo 6º, III, da lei consumerista, transmitir as informações necessárias ao consumidor de forma clara e precisa, com base nos princípios da boa fé e da transparência e seus deveres anexos de informação, cooperação e cuidado.
Analisando a recusa da seguradora quanto à alegação de que o local proposto de tratamento é inadequado, e não havendo qualquer indício de má-fé da autora/segurada, são nulas de pleno direito qualquer cláusula que contrarie os princípios supra mencionadas, principalmente o principio da lealdade nas relações contratuais que deve nortear qualquer contrato.
É mister salientar, que o local em que o autor já começou o seu tratamento é adequado para o seu quadro médico, uma vez que é voltado para redução alimentar, emagrecimento, e a prática de exercícios físicos, necessário para a obtenção do resultado desejado, bem como de melhoria de qualidade de vida.
Também, é bom que se diga que quem tem a obrigação de aferir as reais necessidades do estado do consumidor e dos recursos necessários para preservação de sua saúde é o médico, responsável pelo tratamento do paciente, que inclusive responde civilmente pelos danos causados ao mesmo em caso de erro ou negligência médica e, se a seguradora tinha fontes científicas reais para negar a cobertura de procedimento urgente e necessário em um tratamento desta natureza, deveria provar o fato impeditivo do direito da autora, uma vez que o consumidor é a parte hipossuficiente na relação de consumo. Ao contrário, os relatórios médicos apontam a urgência do tratamento para deter a obesidade mórbida e tantas outras co-morbidades que acometem a parte autora, bem como que o procedimento foi o mais indicado.
A jurisprudência vem a favor do autor:
“TJBA - APELAÇÃO: APL 803312009 BA 8033-1/2009
Relator(a): MARIA DA PURIFICACAO DA SILVA
Julgamento: 25/11/2009
Órgão Julgador: PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL
Ementa
APELAÇAO CÍVEL. AÇAO DE OBRIGAÇAO DE FAZER. AUTORIZAÇAO PARA INTERNAMENTO EM CLÍNICA DE EMAGRECIMENTO, OU SPA. PRESCRIÇAO MÉDICA. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA QUE EXCLUI DA COBERTURA A POSSIBILIDADE DO TRATAMENTO EM SPA. APELO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. HAVENDO INDICAÇAO MÉDICA PARA TRATAMENTO DE OBESIDADE MÓRBIDA ATRAVÉS DE INTERNAMENTO EM CLÍNICA DE EMAGRECIMENTO, OU SPA, NAO CABE À SEGURADORA NEGAR A COBERTURA SOB O ARGUMENTO DE QUE O TRATAMENTO NAO SERIA ADEQUADO AO PACIENTE, POIS JÁ TERIA SE SUBMETIDO A CIRURGIAS DE SEPTAÇAO GÁSTRICA.”

Em que pese seja a requerida uma instituição privada, que tem nos lucros a sua finalidade precípua, não pode esquecer que os contratos de planos de saúde é um contrato de trato sucessivo, de longa duração, que visa proteger um bem jurídico que é a vida humana e, possui uma enorme importância social e individual, devendo as seguradoras ter consciência que acima da busca de lucros em seu ramo de atividades, está à integridade física e a vida do consumidor.
Assim, não se pode deixar de reconhecer a abusividade da negativa injusta pela empresa ré, prática que fere os princípios da equidade e provoca o desequilíbrio contratual e põe em risco a vida e a saúde dos seus segurados, desnaturando o contrato de seguro saúde.
Não esquecendo que a nova concepção do contrato, sem desprezar totalmente a liberdade de contratar, prestigia a dignidade da pessoa humana ao proclamar que seu conteúdo deve observar os limites da função social dos contratos.
Da mesma forma, constata-se que a empresa ré agiu de forma abusiva, demonstrando falta de compromisso com os princípios básicos que devem nortear os contratos, como boa fé, transparência, dever de informação e confiança.
Não se pode aceitar que práticas abusivas identificadas e condenadas na legislação consumerista continuem a ser exercitadas sem qualquer tipo de censura, o que vem ensejando os Tribunais a coibir tais atitudes com o reconhecimento do direito dos usuários quanto aos serviços defeituosos fornecidos.
A obesidade mórbida, diagnosticada na autora é doença catalogada na Associação Brasileira de Médicos (AMB) desde 1996, e doenças a essa associadas, não podendo a ré negar autorização para a realização de procedimento de internação para tratamento especializado, porque recomendado pelos médicos que a acompanham em seu tratamento e essencial à sua sobrevivência e bem estar.
Portanto, reconheço a obrigação da operadora de saúde de prestar a cobertura do tratamento reclamado que não deve ser limitada por previsão contratual contida em contrato de adesão, unilateralmente redigido e contendo cláusulas abusivas e restritivas e que se contrapõe a legislação que regula a atividade e o próprio CDC.
Assim, por tudo que acima foi exposto, e pelo que dos autos consta, julgo procedente a ação para reconhecer a injustiça da negativa de autorização do tratamento da autora, e confirmar a tutela antecipada que determinou a internação da mesma até o restabelecimento da sua massa corpórea ideal, ou seja, até a sua alta definitiva.
Condeno, ainda, a réu nas custas processuais e nos honorários advocatícios, que arbitro em 20% (vinte por cento) do valor da condenação atualizada, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20 § 3º do CPC.
P.R.I.

Salvador, 24 de Fevereiro de 2011

MARIELZA BRANDÃO FRANCO
Juíza de Direito

 

Fonte: Diário de Justiça da Bahia

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