Juiza Marielza Brandão Franco, da 29ª Vara Cível de Salvador, condena a Embratel em 20 Mil por danos morais

Publicado por: redação
03/05/2011 11:30 PM
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Inteiro teor da decisão:

 

 

0171440-42.2006.805.0001 - Consignação em Pagamento

Autor(s): Spartac Seguranca Ltda

Advogado(s): Bruna Christiane Dantas Campos

Reu(s): Empresa Brasileira De Telecomunicacoes Embratel

Advogado(s): Everaldo Asevedo Mattos, Juliane Pereira

Sentença: Vistos, etc.,

SPARTAC SEGURANÇA LTDA, qualificado nos autos em epígrafe, através de advogado legalmente constituído, propôs AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO COM PEDIDO LIMINAR CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS contra a EMPRESA BRASILEIRA DE TELECOMUNICAÇÕES EMBRATEL, também já qualificada nos termos da exordial, alegando, em síntese, que em Maio de 2006 firmou contrato de serviços telefônicos e internet (Vipline e Vipphone) com a empresa ré, que após conversas com os diretores da acionante (empresa consumidora dos serviços), parte autora desta demanda, iria pagar apenas o total de pulsos telefônicos utilizados, e, para que isso fosse possível, a mesma deveria modificar o sistema telefônico interno instalando um novo sistema de PABX o que custou aproximadamente R$ 5.900,00 (cinco mil e novecentos reais), além de ter informado que os números telefônicos iam mudar.

Aduz que, a empresa ré disponibilizaria os serviços de acesso livre de internet (banda larga), o qual jamais foi fornecido, prejudicando, dessa maneira, o contato da demandante com os seus clientes. Ao firmar o contrato com a demandada, o objetivo principal da contratação dos serviços oferecidos era baixar os custos de telefonia, o que não ocorreu. Consta ainda que a ré descumpriu o que foi firmado cobrando uma alta taxa de assinatura no valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais), a qual não estava prevista no contrato.

O demandante pediu ao final pela procedência da ação com o cabimento dos danos morais e condenações de praxe. Com a inicial foram juntados os documentos de fls. 26/178

Liminar deferida às fls. 187.

A parte ré, devidamente citada, apresentou contestação às fls.213/220, alegando preliminarmente a ausência de relação de consumo culminando com a extinção do processo. No mérito aduz que, a parte autora contratou com a acionada os serviços VIPLINE e VIPPHONE e que a empresa ré não trabalha com pulsos telefônicos e sim com o sistema de minutagem, pelo qual o cliente paga o minuto das ligações em que realiza em seu terminal telefônico, e, no momento em que a parte autora contratou os serviços com a ré estava ciente das características do plano, inclusive que o serviço tem como característica principal a necessidade de que haja um comprometimento mínimo de ligações.

Alega ainda que, existe uma diferença entre o valor consumido e o comprometimento mínimo, designado como “Complemento de Tráfego”, se não atinge o valor do comprometimento mínimo incide o “Complemento de Tráfego” para completar o comprometimento mínimo do cliente, e que, o valor mínimo não foi informado pela parte autora em suas alegações. Desta forma, a acionada efetuou as cobranças de modo correto, pois a acionante deixou de pagar as faturas sem os valores devidos.

Assim, concluiu a sua contestação, pedindo a improcedência da ação e o não reconhecimento dos alegados danos morais, com as consequentes cominações legais e junta os documentos de fls. 221/266.

A parte autora apresentou réplica às fls.293/307.

Audiência preliminar às fls. 350.

É o Relatório.
Posto isso. Decido.

Trata-se de matéria que não enseja produção de provas pelo que será proferido julgamento antecipado da lide.

Trata-se de ação ordinária ao fundamento de violação das normas do Código de Defesa do Consumidor, diante da alegação de descumprimento pela parte ré do quanto estabelecido no contrato, bem como alegação de danos morais sofridos pela parte autora em razão das cobranças abusivas e do lançamento do seu nome nos cadastros do SPC e SERASA.

A preliminar levantada de ausência de relação de consumo culminando com a extinção do processo não pode prosperar, já que a presente demanda deve ser analisada sobre a égide do CDC, instituído pela Lei nº 8.078/90, que em seu artigo 2º, estabeleceu como sendo consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, pois, na hipótese em discussão, restou caracterizada a relação de consumo, uma vez que os contratos desta natureza se enquadram no conceito previsto na legislação especial, além do que a acionante adquiriu os serviços de linhas telefônicas para o seu uso com o fito de atingir a finalidade pretendida de ter o uso das linhas telefônicas dentro de suas necessidades básicas empresariais e, porque é flagrante a relação de hipossuficiência do consumidor em relação a demandada. Resta caracterizado que a empresa (acionante) é uma consumidora final, já que utiliza os serviços da acionada para viabilizar sua atividade produtiva e não como parte de sua cadeia de produção. Pelo que fica de logo afastada a preliminar.

No que tange ao contrato ora em analise, é bom relembrar que a boa-fé objetiva, que se traduz no dever do fornecedor prestar informações claras e precisas para garantir o equilíbrio entre as partes, deve permear todos os contratos consumeristas, de modo que, a sua ausência no âmbito de uma relação de tal natureza, acaba por viciar todo o conteúdo das obrigações estabelecidas, impondo a necessidade da intervenção estatal.

Cláudia Lima Marques, defende três basilares funções para a boa fé objetiva - criar deveres anexos durante o vínculo contratual, limitar o exercício dos direitos subjetivos abusivos e garantir a concretização e interpretação dos contratos. 1

A primeira função, criadora de deveres anexos de conduta, orienta quanto a necessidade de se observar o dever de informação, de forma clara e precisa, sobre as características e qualidades dos produtos e serviços; o dever de cooperação, obrigação que tem ambas as partes de colaborar, de agir com lealdade e não obstruir ou impedir a execução do contrato e o dever de cuidado, que visa preservar a integridade pessoal e patrimonial do contratante, devendo o fornecedor agir em consonância com esses deveres, de modo que não prejudique o consumidor impondo-lhe cláusulas abusivas e que frustrem suas legítimas expectativas. Quanto à segunda função da boa fé objetiva, diz respeito ao poder de impor limites a determinadas práticas comerciais abusivas exercidas pelo fornecedor, invalidando, quando necessário, as cláusulas reconhecidas como abusivas. A última função e a mais importante delas, é a interpretadora, por meio da qual o CDC permite ao Poder Judiciário um controle do conteúdo, da justeza e do equilíbrio dos contratos, permitido ao juiz exercer uma proteção intervencionista no controle das cláusulas abusivas e protegendo, por via de conseqüência, o consumidor dessas cláusulas abusivas, em sua maioria, presentes em contratos de adesão, quando destituídas de retidão e de coerência com a realidade, precisamente nos casos enumerados no artigo 51 do CDC. (Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2004.)

O CDC protege o consumidor, de forma que inibe a veiculação de propaganda enganosa, como consta dos artigos 36 a 38 do código de defesa do consumidor.
Art. 36. A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal.
Parágrafo único. O fornecedor, na publicidade de seus produtos ou serviços, manterá, em seu poder, para informação dos legítimos interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem.

Pelo que consta dos documentos acostados aos autos às fls. 39/40 o serviço Vipline oferecido pela ré isenta a cobrança de taxa de assinatura, o que proporciona ao cliente uma redução inicial dos custos com a telefonia fixa local. Não consta em nenhum documento da peça vestibular e do contrato fornecido à parte autora que será cobrado “Complemento de Tráfego” que é a diferença entre o valor consumido e o comprometimento mínimo pelo serviço Vipline, e nem mesmo em suas faturas com a devida cobrança consta a descrição do mesmo, fazendo com que a cobrança seja indevida, já que as informações não foram passadas de forma clara e precisa ao consumidor.

O artigo 186 do Novo Código Civil prescreve que aquele que por ação ou omissão voluntária violar direito ou causar prejuízo a outrem fica obrigado a reparar o dano e no direito brasileiro a responsabilidade objetiva está regulada pelo Código de Defesa do Consumidor – artigo 3º, § 2º e, precisamente no art. 14, ao determinar que o fornecedor de produtos e serviços responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos a qualidade e segurança dos seus serviços.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, em sua obra Direito Administrativo, 13ª ed, às fls. 517 e 518, descreve os pressupostos da responsabilidade objetiva que são: 1º) agente do dano seja pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, que prestem serviço público; 2º) dano causado a terceiro em decorrência da prestação do serviço público, sendo aqui caracterizada relação de causa e efeito; 3º) que este dano seja causado pelo agente das aludidas pessoas jurídicas e que ajam nessa qualidade. Dessa forma, a responsabilidade é objetiva, ou seja, independe de culpa.

Provada a existência da conduta lesiva, deve o agente ressarcir os danos a este (demandante) causados, impondo-se que a compensação pecuniária represente valor adequado à reparação do ato lesivo e punição ao seu causador.

Verifica-se, pois, que o autor fez provas nos autos dos fatos que dão sustentação a sua pretensão. Diante disso, o descumprimento do quanto veiculado no contrato que nada diz do “Complemento de Tráfego” e no memorial descritivo dão ensejo ao pleito indenizatório pleiteado pelo demandante em sua exordial, tendo em vista que a demandada desobedeceu aos princípios da boa-fé, consagrados no CDC, bem como ao direito básico do consumidor à informação correta e adequada.

Embora certo que a indenização por danos morais não pode representar fator de enriquecimento sem causa e sim um desestimulador contra a prática de condutas ilegais e eivadas de negligência por parte das empresas fornecedoras de serviços, o certo é que o autor sofreu prejuízos com a conduta lesiva da ré.

De acordo com o que preleciona o art. 38 do CDC: “o ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina”

A ação proposta visa não só extinguirá a sua obrigação em face do credor porque este se recusar a receber o pagamento, mas também ressarcimento pelos prejuízos sofridos. Assevera a parte autora que efetuou os pagamentos que eram devidos perante a empresa ré, requerendo o deposito judicial desses valores pela dívida contraída nos meses de Outubro e Novembro de 2006, pelo que veio reconhecer o direito da acionante em sede de liminar e condenar a acionada na indenização pelos danos devidos, conforme consta do documento de fls. 190 em que a acionante efetuou o depósito judicial. Com isso, dar-se-à por quitada a dívida do contrato realizado com a acionada.

Assim, por tudo que acima foi exposto, e pelo que dos autos consta, julgo procedente a presente ação para declarar a quitação do contrato pelo valor depositado e reconhecer a má prestação do serviço e conseqüente existência dos danos alegados pelo serviço cobrado indevidamente, pela falta de informação clara ao consumidor (acionante) que não previa no contrato determinados encargos que a empresa ré cobrou ao acionado, bem como, pela falta de prestação de serviço com relação à internet em que o autor comprovou que seu acesso a rede vem sendo negado conforme consta do documento às fls. 325, e condenar a ré a pagar a autora a título de indenização pelos danos morais a quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), acrescidos de juros de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC, a partir da data da citação valida até o efetivo pagamento.

Condenar, ainda, o réu ao pagamento nas custas processuais e nos honorários advocatícios, que arbitro em 15% (quinze por cento) do valor da condenação atualizada, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20 § 3º do CPC. Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Salvador, 27 de abril de 2011.

MARIELZA BRANDÃO FRANCO
Juíza Titular da 29ª Vara de Relações de Consumo

 

Fonte: DJE BA

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