Juiza Marielza Brandão Franco, da 29ª Vara Cível de Salvador, condena o Banco Itaú S/A Crédito Imobiliário

Publicado por: redação
04/05/2011 06:30 AM
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Inteiro Teor da Decisão:

 

0051741-96.2002.805.0001 - EMBARGOS DO DEVEDOR

Embargante(s): Maria Dos Reis Santos Gomes

Advogado(s): André Luiz Pinto Dantas, Marilda Fátima de Andrade Viana de Melo

Embargado(s): Banco Itau Sa

Advogado(s): Airton de Souza Lima

Sentença: Vistos, etc.,
MARIA DOS REIS SANTOS GOMES, por si e representando o ESPÓLIO DE JOSÉ GOMES, qualificada nos autos em epígrafe, através de advogado legalmente constituído, propôs EMBARGOS DO DEVEDOR contra BANCO ITAÚ S/A CRÉDITO IMOBILIÁRIO, também já qualificada nos termos da exordial, alegando, em síntese, que celebrou com a embargada Contrato de Compra e Venda de Imóvel com Pacto Adjeto de Hipoteca e Outras Avenças, tendo por objeto um imóvel, cujo valor do financiamento seria regido de acordo com o Sistema Financeiro de Habitação (SFH).
Em ação principal de nº 0019637-56.1999.805.0001, alegou que em decorrência do óbito de seu cônjuge, comunicou o fato ao agente financeiro-embargado e requereu o reconhecimento de quitação do imóvel, como previsto na apólice de seguro. Contudo, a cobertura da indenização foi negada, sob alegação de que os mutuários já possuíam dois imóveis pelo SFH.

Alega, ainda, que devido aos reajustes exorbitantes praticados pelo embargado porque o reajuste das prestações não se assemelhava aos índices utilizados para as cadernetas de poupança, desobedecendo a relação prestação-salário estabelecida pelo Plano de Equivalência Sal por Categoria Profissional (PES/CP), o valor das prestações tornou-se elevado para a embargante, que conta apenas com a pensão paga pelo Instituto Nacional de Seguridade Social, em decorrência do óbito de seu cônjuge, prestação que compromete mais de cem por cento dos ganhos por ela percebidos.
Assim, requer a suspensão da ação de execução proposta pelo embargado, para que o mesmo não proceda com a penhora do imóvel, que seja condenado a promover a baixa da hipoteca no devido cartório de registro. Pleiteia, ainda, repetição do indébito e que o embargado se abstenha de inserir o nome da embargante nos órgãos restritivos de crédito. Apresentou documentos às fls. 24/106.

É o relatório.
Passo a decidir.

A natureza da presente ação consiste em garantir à embargante seu direito de permanecer na posse do imóvel enquanto se discute as cláusulas do contrato que gerou sua aquisição, decorrente da interposição de ação executiva hipotecária pelo embargado, com vistas à penhora do bem.
Inicialmente, vale esclarecer que os demais pedidos elencados na peça inicial devem ser analisados em ação própria, qual seja, a ação de conhecimento, posto que o exame dos embargos à execução deve corresponder logicamente ao pleito apresentado na ação de execução. Logo, refere-se ao pedido de quitação das parcelas do financiamento, sob pena de ter o imóvel penhorado.
No caso, tendo em vista a discussão da validade das cláusulas contratuais em ação principal, onde se questiona a inexistência de divida pela quitação decorrente da morte do mutuário e também o valor das prestações e do saldo devedor, principalmente quando suscitada a prática de atualização monetária realizada por índice e sistema diversos dos determinados por lei, verifica-se a necessidade de suspensão do procedimento de execução hipotecária em tela.
Verifica-se que, uma vez estando o mutuário supostamente em atraso, duas hipóteses se abrem para o agente financeiro: executar a dívida extrajudicialmente pelo DL 70/66 ou executar a dívida judicialmente pela Lei 5.741/71, como no caso em análise.
É sabido que a hipoteca garante o credor porque atribui a ele o direito de seqüela inerente ao crédito, podendo o mesmo proceder o pagamento a si próprio com a venda judicial do bem hipotecado, preferindo-a como crédito aos demais que eventualmente o devedor/hipotecário possa ter, como pode-se observar no entendimento doutrinário abaixo:

"Hipoteca, incluída no Código Civil como direito real de garantia (art. 1.419), não é contrato de direito substancial autônomo em si mesmo, capaz de gerar crédito ou obrigação; é ajuste associado a obrigação de pagar dinheiro, que melhor se qualifica como modo de assegurar ao credor a responsabilidade patrimonial de certos bens, ou de assegurar a disponibilidade destes para futura penhora e expropriação em processo executivo." (DINAMARCO, Cândido Rangel, in 'Instituições de Direito Processual Civil', vol. IV, Malheiros:São Paulo, 2004, p. 281).

Assim, executar o bem que corresponde ao fato gerador da demanda seria equivalente a liquidação do quantum devido, o que se perfaz totalmente descabido ante o debate debruçado sobre o próprio valor da dívida ou mesmo da inexistência de dívida.
Isso por que, havendo processo judicial discutindo o contrato e suas cláusulas ilegais ou abusivas, além das irregularidades cometidas pelo agente econômico, não há como considerar o débito líquido, certo e exigível, devendo a execução ser suspensa até que seja julgada a ação principal e a dívida seja recalculada pelo Poder Judiciário.
A jurisprudência vem a favor da embargante:

Processo
REsp 508944 / DF
RECURSO ESPECIAL
2003/0018463-1
Relator(a)
Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO (280)
Órgão Julgador
T3 - TERCEIRA TURMA
Data do Julgamento
10/06/2003
Data da Publicação/Fonte
DJ 28/10/2003 p. 287
Ementa
Processual civil. Execução hipotecária. Ações declaratória e
consignatória ajuizadas anteriormente. Embargos de devedor. Efeito
suspensivo.
I. - O ajuizamento de ação de conhecimento buscando a discussão do
valor do débito referente ao financiamento hipotecário não afasta o
direito do credor hipotecário de mover a execução pertinente.
Entretanto, se aquela ação e a ação consignatória pertinente são
ajuizadas antes da execução hipotecária, admite-se a suspensão
desta.
II. - Recurso especial não conhecido.

Processo
REsp 401931 / MG
RECURSO ESPECIAL
2001/0163923-2
Relator(a)
Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA (1088)
Órgão Julgador
T4 - QUARTA TURMA
Data do Julgamento
02/05/2002
Data da Publicação/Fonte
DJ 12/08/2002 p. 221
Ementa
PROCESSO CIVIL. AÇÃO REVISIONAL. SFH. SALDO DEVEDOR. EXECUÇÃO.
SUSPENSÃO. ORIENTAÇÃO DO TRIBUNAL. JULGAMENTO DA REVISIONAL.
PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO. RECURSO DESACOLHIDO.
I - A jurisprudência deste Tribunal tem entendimento no sentido de
que, enquanto em curso ação ordinária que debata o valor do débito,
recomendável a suspensão de execução judicial do débito hipotecário
concernente ao SFH.
II - No entanto, julgada a ação revisional, inclusive com trânsito
em julgado, não mais persiste razão para a suspensão da execução.

A própria Lei Processual Civil, em seu art. 745, inciso V, preocupou-se em fornecer ao executado a possibilidade de embargar a ação de execução quando esta versar sobre “qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento”.
Dessa forma, não há sentido em dar seguimento a procedimento executório de um bem objeto de discussão judicial se a existência de questionamento da causa que enseja a exigibilidade do crédito gera, inclusive, suspensão da execução extrajudicial.
Pelo exposto, hei por bem julgar PROCEDENTE o pedido formulado, para o fim de determinar suspensão da execução, mantendo a executada na posse do imóvel. Condeno, ainda, a Embargada nas custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da condenação atualizada, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20 § 3º do CPC.

P. R. I.

Salvador, 15 de Março de 2011.

MARIELZA BRANDÃO FRANCO
Juíza Titular da 29ª Vara de Relações de Consumo

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