Estado e Município devem fornecer o medicamento ENOXAPARINA, sentença do Juiz Mário Augusto Albiani Alves Junior, da 5ª Vara da Fazenda Pública de Salvador

Publicado por: redação
29/06/2011 02:00 AM
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Inteiro teor da decisão:

 

0058250-28.2011.805.0001 - Procedimento Ordinário

Autor(s): Erika Monteiro Dias Da Cruz

Advogado(s): Ricardo Claudio Carillo de Sa

Reu(s): Estado Da Bahia, Municipio De Salvador

Decisão: Fls. "ERIKA MONTEIRO DIAS DA CRUZ, qualificada nos autos, ajuizou Ação Ordinária com pedido de tutela antecipada, em face do MUNICÍPIO DE SALVADOR e do ESTADO DA BAHIA, objetivando que seja determinado aos réus que disponibilizem o medicamento ENOXAPARINA 80mg, durante o período restante da sua gestação e mais os medicamentos que se tornarem necessários para sua completa recuperação.
A autora sustenta que em março do presente ano sentiu fortes dores na perna direita, inchaço, dificuldade de deambular, tendo procurado médico que lhe prescreveu ENOXAPARINA 80mg diárias, via subcutânea, durante dez dias consecutivos.
Afirma que por questões financeiras não pode arcar com os custos da medicação, que custa R$ 80,00 (oitenta reais) cada ampola, tendo sido encaminhada para a Secretaria Estadual de Saúde, que a encaminhou para a Secretaria Municipal de Saúde, que teria a atribuição de fornecer o medicamento e lá estando, a autora protocolou solicitação do fornecimento do medicamento, sendo informada de que deveria retornar no prazo de três meses.
Pondera que é portadora de TVP extensa em segmento poplíteo e panturrilha direita, CID I 870, tendo sido relatada extensa trombose venosa profunda íleo-femoral à esquerda, com necessidade de uso contínuo de ENOXAPARINA (versa ou clexane) 80mg subcutânea, uma vez ao dia, durante todo o período gestacional, com observação de que o não uso do medicamento eleva o risco de morte por progressão da trombose e embolia pulmonar, nos termos dos relatórios médicos de fls. 13/14.
Salienta que, na condição de estudante, fica patente a inviabilidade de aquisição do medicamento, que tem um custo mensal de R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais).
Requer a antecipação dos da tutela para determinar aos réus forneçam à autora 30 ampolas ao mês de ENOXAPARINA 80mg, durante todo o período gestacional, e mais todos os tratamentos que se mostrem necessários para a sua comleta recuperação.
A obrigação imposta liminarmente importará na antecipação dos efeitos da tutela, porém não se confunde com a própria tutela, sendo, na realidade, um adiantamento da tutela específica, conforme o § 3º, do art. 461, do CPC, que possui natureza cautelar, já que exige, apenas, os pressupostos que a autorizam.
A Autora almeja impor ao Réu a tutela específica da obrigação de fazer, pelo que basta o exame dos pressupostos do § 3º, do art. 461, do CPC, o risco de dano irreparável ou de difícil reparação e a relevância dos fundamentos da tutela pretendida.
Nessa linha, a meu sentir, é evidente a natureza cautelar da medida, pois busca tutelar a própria vida e saúde da Acionante, objetivando a plena eficácia da tutela meritória perseguida, cumprindo destacar que a providência assegurada consiste em uma imposição de um fazer cujo objetivo é próprio das cautelares, ou seja, de assegurar o resultado útil do feito ou a plena eficácia da tutela meritória, exigindo-se, para a sua concessão, menos do que se exige para a concessão da tutela antecipada.
O real objetivo da dita antecipação requerida é assegurar a plena eficácia da tutela meritória perseguida e não a antecipação do direito pleiteado, já que a imposição do fazer, liminarmente, apenas por via oblíqua, faz antecipar a própria tutela.
A esse respeito, bem pondera Nery Jr:

Adiantamento da tutela. A tutela específica pode ser adiantada, por força do CPC 461 §3º, desde que seja relevante o fundamento da demanda (fumus boni iuris) e haja justificado receio de ineficácia do provimento final (periculum in mora). É interessante nortar que, para o adiantamento da tutela de mérito, na ação condenatória em obrigação de fazer ou não fazer, a lei exige menos do que para a mesma providência na ação de conhecimento tour court (CPC 273). É suficiente a mera probabilidade, isto é, a relevância do fundamento da demanda, para a concessão da tutela antecipatória da obrigação de fazer ou não fazer, ao passo que o CPC 272 exige, para as demais antecipações de mérito: a) Prova inequívoca; b) o convencimento do juiz acerca da verossimilhança da alegação; c) o periculum in mora (art. 273 I) ou o abuso do direito de defesa do réu (CPC 273, II)1

Ao magistrado, em hipóteses tais, não pode se eximir de conceder as medidas acautelatórias necessárias a salvaguardar o provável direito da parte, no dizer de CALAMANDREI, citado por OVÍDIO A. BATISTA DA SILVA, “em defesa da própria jurisdição” (in Curso de Processo Civil, vol. III, 2ª edição, RT, p. 95), exercitando poderes efetivos de direção e administração da relação processual, no resguardo de interesses confiados por lei à sua autoridade.
Ademais, autoriza-se a concessão da cautela, principalmente porque o prejuízo que dela pode advir é consideravelmente inferior ao que decorreria da sua não concessão. Em respeito ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional nenhuma lesão ou ameaça de lesão pode ser subtraída da apreciação do judiciário e a não concessão da tutela cautelar almejada tornaria ineficaz a tutela meritória perseguida, em flagrante prejuízo à vida e à saúde da Autora e da sua própria dignidade.
Dessa forma, com o intuito de evitar prejuízos a Autora e com o escopo de garantir os plenos efeitos da possível decisão a seu favor, preservando o resultado útil do processo, faz-se mister o adiantamento da tutela específica, nos termos dos arts. 797 e 798, do CPC.
É entendimento unânime dos Tribunais, no que tange a promoção do direito à saúde, pautado no artigo 196 da Constituição Federal, que a União, Estados e Municípios são solidariamente responsáveis pelo fornecimento gratuito de medicamentos, caracterizando-se como mandamento constitucional, em virtude do referido artigo prescrever a saúde como dever do Estado, sem especificar sobre qual ente da federação recairia este dever, logo, dever de todos.
Nesse contexto, a atribuição dos entes federativos se faz de forma igualitária, abrangendo o fornecimento de serviços e medicamentos, devido ao caráter subjetivo do mandamento constitucional.
A Autora, destarte, tem o direito à realização do tratamento em comento, sob pena de ter agravada sua situação de saúde, como é verificado na documentação acostada aos autos, fls. 13/14.
Entendo, pois, satisfeitas as exigências que caracterizam o direito da autora de beneficiar-se do procedimento solicitado na forma descrita na inicial, tendo em vista que a medicação descrita na exordial é fundamental a continuidade do tratamento da autora e, uma vez cerceado este direito imediato, poderá importar no reconhecimento de um direito que não mais esteja em condições de exercê-lo, em razão do seu estado de saúde.
Nesse diapasão, entendo presente a relevância dos fundamentos da demanda no fato de a Autora estar em situação grave, a qual requer, pelo que se vislumbra no relatório médico acostado aos autos, a realização do referido tratamento, através de um dos medicamentos descritos na inicial. Ainda, há justificado receio de ineficácia do provimento final, em decorrência do caráter de urgência que se configura nos autos, sendo a realização do tratamento quimioterápico, imprescindível à recuperação da autora, consoante relatório médico, fls. 13/14.

Ex positis, ADIANTO A TUTELA, ex vi da regra do Código de Processo Civil Pátrio, em seu art. 461, caput e §3°, para o fim de determinar aos réus que adotem as providências necessárias ao fornecimento da medicação ENOXAPARINA 80mg/dia, durante todo o período gestacional da autora, até ulterior deliberação ou decisão definitiva a respeito, no prazo de cinco dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), para a hipótese de descumprimento.

DEFIRO A GRATUIDADE DA JUSTIÇA, na forma requerida.

Vale a presente Decisão, nos termos do art. 466-A, do CPC, como declaração de vontade não emitida pelo Réu, de modo que o órgão ou funcionário responsável pelo fornecimento do medicamento fica obrigado a cumpri-la nos termos do relatório médico de fls, 13/14, sob pena de desobediência e multa diária, na pessoa do funcionário ou servidor, de 20% do valor atribuído à causa, a teor do parágrafo único, do art. 14, do CPC.
Serve a cópia da presente decisão como mandado.
Proceda-se a intimação dos réus para que tomem conhecimento do teor da presente decisão, cumprindo-a imediatamente.
Citem-se os réus para oferecer resposta, no prazo legal.
Publique-se. Intime-se.
Salvador, 28 de junho de 2011.

Mário Augusto Albiani Alves Junior
Juiz em Exercício"

 

Fonte: DJE BA

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