Justiça determina que a Sul América arque com o valor de procedimento cirúrgico

Publicado por: redação
13/07/2011 11:30 PM
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Inteiro tero da decisão:

 

 

 

0100604-49.2003.805.0001 - Ação Civil Coletiva

Autor(s): Jose Alberto Gesteira Fonseca

Advogado(s): Cristina Maria Ruas Gaspar de Almeida

Reu(s): Sul America Saude

Advogado(s): Antônio Cláudio de Lima Costa, Jenner Augusto da Silveira Kruschewsky, Maria Vitoria Tourinho Dantas

Sentença: SENTENÇA

Vistos etc.,
JOSÉ ALBERTO GESTEIRA FONSECA, devidamente qualificado nos autos, por advogado legalmente habilitado, ajuizou a presente AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE LIMINAR CONTRA SUL AMÉRICA SEGURO SAÚDE S/A, também já qualificada, aduzindo em síntese que celebrou contrato de seguro de saúde com a Ré no plano empresa prod. 417, código identificador nº. 26969 2696 9004 0023, pagando sempre em dia suas mensalidades, quando no dia 25/07/2003, o autor, portador de problemas neurológicos graves, tentou suicídio, subsistindo a necessidade de internação urgente e tratamento adequado, consoante relatório médico de fls. 05 dos autos. Contudo, não foi autorizada a cobertura do procedimento sob o fundamento de que a seguradora ré não mantém convênio com clínica da especialidade indicada para o tratamento do demandante. Ao final, pede a antecipação de tutela para obter autorização para o tratamento até a alta hospitalar, pleiteando a procedência da ação. Juntou os documentos de fls. 04 a 07.
Deferido o pedido dos benefícios da assistência judiciária gratuita às fls. 09.
Emendada a inicial às fls. 10 a 11, com a juntada de documentos de fls. 12 a 13.
O MM. Juiz às fls. 15, reservou-se a apreciar o pleito liminar após resposta da ré, interpondo o autor, da retromencionada decisão, o Recurso de Agravo de Instrumento, juntando cópia aos autos às fls. 19 a 26.
Citada, a ré apresentou contestação às fls. 34 a 45, argüindo em preliminar a inépcia da inicial, aduzindo no mérito que o contrato não foi celebrado sob a égide da lei nº. 9.656/98 e por isso não tem as coberturas exigidas por esta lei e que nada mais fez do que cumprir as cláusulas do contrato celebrado, citando tais cláusulas e que se negou a autorizar a realização do procedimento médico porque a autora deve respeitar os limites estabelecidos na apólice contratada. Alega, ainda, que o contrato deve ser regido pelo Código Civil de 1916, sendo ato formal e considerado perfeito desde o momento em que o segurador remeteu a apólice ao segurado, afirmando que o contrato foi assinado pelo demandante, tendo este declarado a ciência de todas as cláusulas. Pede a improcedência do pedido. Juntou os documentos de fls. 46 a 71.
O autor em réplica às fls. 74 a 76, rebateu as argumentações trazidas na contestação e reiterou os pedidos formulados na exordial, pleiteando, ainda, a condenação da ré em custas e honorários advocatícios. Juntou os documentos de fls. 77 a 80.
Audiência às fls. 81, realizada no dia 09 de Maio do ano de 2009, presente as partes, foi proposta a conciliação, porém a mesma não logrou êxito. As partes informaram não ter mais provas a serem produzidas.
Outra audiência às fls. 88, realizada no dia 12 de Novembro de 2009, presente as partes, foi proposta a conciliação, porém não foi possível qualquer acordo. As partes requereram o julgamento antecipado da lide.
Relatado, decido.

O Demandante pretende ver reconhecido o seu direito de cobertura do procedimento solicitado para realização de tratamento de eletroconvulsiva, ministrado na clínica Holos Saúde Desenvolvimento Pessoal, pois, o seu Plano de Saúde recusou-se a cobrir tal procedimento sob o argumento de que não tem clínica credenciada para o tratamento na especialidade apontada, qual seja, psiquiátrica.
A preliminar levantada pelo réu não merece acolhimento, pois, da análise da petição inicial da ação se verifica que não existe o defeito apontado. O autor pretende a autorização para tratamento neurológico indicado pelo médico, conforme relatório do profissional habilitado anexado aos autos, estando claramente evidenciados na ação o pedido, a causa de pedir e os seus fundamentos. Assim, rejeito esta preliminar.
No mérito, o CDC prescreve que é direito do consumidor ter acesso a produtos e serviços eficientes e seguros, devendo ser informado adequadamente acerca do conteúdo dos contratos por ele firmado para aquisição de produtos e serviços, principalmente no que se refere aquelas cláusulas que limitem os direitos do consumidor, como aquelas que regulem a autorização para procedimentos referentes ao tratamento de doenças graves.
Insta salientar que, ainda que o contrato tenha sido assinado antes do nascedouro da Lei nº. 9.656/98, caracteriza como abusiva a cláusula contratual que exclui da cobertura a autorização de realizar tratamento necessário a preservação da saúde física e mental do autor, como é a hipótese dos presentes autos.
Nota-se, que a empresa fornecedora, pretende, pelos argumentos insertos em sua contestação, fazer crer que o autor não tem direito ao tratamento médico indicado para o controle da sua doença.
No entanto, a seguradora não impugnou os documentos apresentados pelo autor de que o tratamento a que necessita ser submetido é necessário devido ao seu quadro clínico e que não teve oportunidade de escolher outro tratamento médico porque já se submeteu aqueles convencionais, tendo inicialmente sido internado no Hospital Aliança e não obteve êxito, em decorrência do procedimento prescrito para o mesmo só ser ministrado na clínica Holos. Também não trouxe aos autos qualquer documento e outro meio que provasse que existem outros tratamentos mais eficazes para conter a doença sofrida pelo autor. Mesmo porque, é dever do fornecedor, nos termos do artigo 6º, III, da lei consumerista, transmitir as informações necessárias ao consumidor de forma clara e precisa, com base nos princípios da boa fé e da transparência e seus deveres anexos de informação, cooperação e cuidado.
Analisando a recusa da seguradora quanto à alegada pertinência da negativa de internação hospital prescrito pelo médico que assiste o autor, nota-se que as cláusulas contratuais indicadas para a cobertura não se enquadram de forma clara no objeto do pedido, nem há qualquer indício de má-fé do autor/segurado, mesmo porque, ainda que o fosse, era da seguradora o ônus de provar o fato impeditivo do direito do autor e ter adotado todas as cautelas, podendo ter exigido outros exames médicos e elaborar laudo demonstrativo da inexistência da necessidade do procedimento, sem que lhe fosse causado risco de morte. Ao contrário, o relatório médico de fls. 05 aponta a necessidade do tratamento solicitado e que o procedimento foi o mais indicado devido a gravidade do quadro clínico do paciente.
Isso demonstra que quem tem a capacidade de aferir as reais necessidades do estado do consumidor e dos recursos necessários para preservação de sua saúde é o médico responsável pelo tratamento, que inclusive responde civilmente pelos danos causados ao seu paciente em caso de erro ou negligência médica e se a seguradora tinha fontes científicas reais para negar a existência da emergência médica para cobertura integral do valor pago pelo procedimento deveria manter contato com o médico responsável para verificar a situação clínica e médica do consumidor, uma vez que este é a parte hipossuficiente na relação de consumo.
No caso sub exame, diante da análise dos documentos carreados pelo Réu pode se inferir a existência de situação de gravidade da enfermidade do autor que autoriza a realização dos procedimentos solicitados pelo médico que acompanha seu tratamento.
Isso porque as situações de doenças graves são tratadas de forma diferenciada como vem entendendo a jurisprudência pátria, conforme dispõe a decisão abaixo transcrita do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
Processo:
AC 5900694800 SP
Relator(a):
Francisco Loureiro
Julgamento:
18/12/2008
Órgão Julgador:
4ª Câmara de Direito Privado
Publicação:
12/01/2009
Ementa
PLANO DE SAÚDE:
Tratamento decorrente de distúrbios psiquiátricos - Negativa de cobrir o tratamento da co-autora, sob o fundamento de que o hospital escolhido não é credenciado da seguradora e o referido tratamento não é coberto pela ré - Preliminares afastadas - Típica relação de consumo - Atividade regida pelo Código de Defesa do Consumidor - Irrelevância da natureza jurídica pela qual se constituiu a prestadora de serviços - Autora se valeu de inúmeros tratamento, sem nenhum resultado positivo - Chance do tratamento ser eficaz - Negativa de cobertura manifestadamente ilegal - Cobertura de moléstia que obriga a operadora a manter a devida terapia, ou a proporcionar o tratamento em estabelecimentos não conveniados - Descumprimento da tutela antecipada não verificado - Verba honorária fixada sobre o valor da condenação - Recursos improvidos.

Portanto, a utilização dos serviços nos casos de tratamento de doenças graves não pode ser tratada da mesma forma param os demais casos.
Injusto, como pretendido pelo réu, não autorizar a realização dos procedimentos necessários à preservação da saúde do autor.
Em que pese seja a requerida uma instituição privada, que tem nos lucros a sua finalidade precípua, não pode esquecer que os contratos de planos de saúde é um contrato de trato sucessivo, de longa duração, que visa proteger um bem jurídico que é a vida humana e, possui uma enorme importância social e individual, devendo as seguradoras ter consciência que acima da busca de lucros em seu ramo de atividades, está a integridade física e a vida do consumidor.
Assim, não se pode deixar de reconhecer a abusividade da negativa injusta pela empresa ré, pratica que fere os princípios da equidade e provoca o desequilíbrio contratual.
Não esquecendo que a nova concepção do contrato, sem desprezar totalmente a liberdade de contratar, prestigia a dignidade da pessoa humana ao proclamar que seu conteúdo deve observar os limites da função social dos contratos.
Constata-se que a empresa ré agiu de forma abusiva, demonstrando falta de compromisso com os princípios básicos que devem nortear os contratos, como boa fé, transparência, dever de informação e confiança, causando ao autor o conseqüente constrangimento de ter negada autorização para a realização do tratamento médico, o que não ocorreria caso esta fosse mais diligente com os seus clientes.
Assim, por tudo que acima foi exposto, e pelo que dos autos consta, julgo procedente a ação para reconhecer a injustiça da negativa de autorização, e determinar que a SUL AMÉRICA SEGURO SAÚDE S/A arque com o valor do procedimento, restituindo os valores já pagos pelo autor, conforme demonstrado no documento de fls. 16, acrescidos de juros legais de 1% ao mês e correção monetária desde o pagamento até o efetivo reembolso.

P.R.I.

Salvador, 27 de Junho de 2011.

MARIELZA BRANDÃO FRANCO
Juíza Titular da 29ª Vara de Relações de Consumo