Cometa Calçados inseriu o nome de cliente no SPC indevidamente, foi condenada em R$5.450,00 por danos morais

Publicado por: redação
07/09/2011 10:00 PM
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Inteiro teor da decisão:

 

 

 

 

0067985-61.2006.805.0001 - INDENIZATORIA (REPARACAO DE DANOS)

Autor(s): Jilsandra Fonseca Souto

Advogado(s): Luiz Mesquita Souza Filho

Reu(s): Cometa Calçados

Advogado(s): Isaac Matienzo Oab/Ba 22.214

Sentença:  Vistos, etc.

JILSANDRA FONSECA SOUTO, nos autos qualificada, ingressou com AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS com pedido liminar contra COMETA CALÇADOS LTDA., alegando, em síntese, que foi surpreendida pela informação fornecida pelo SPC de que seu nome se encontrava em seu cadastro de restrição de crédito, por ordem da Ré, desde o dia 17/05/2002, por conta de uma suposta dívida de R$-127,80=. Salienta que nunca fez nenhum tipo de transação comercial ou financeira junto a Ré. Destaca que esse ato ilícito da Demandada tem lhe causado transtornos de monta, constrangimentos e humilhações, impedindo-a de exercer suas atividades comerciais e bancárias. Pugna, ao final, pela procedência da ação, com a condenação da Ré pelo pagamento de danos morais no patamar de R$-500.000,00=, (fls. 02/03). Instruem a exordial os documentos de fls. 04/06.
Deferiu-se em parte o pedido liminar almejado, determinando-se a imediata exclusão do nome da Autora do cadastro restritivo de crédito SPC, Serasa e outros, deferindo-se ainda o pedido de assistência judiciária gratuita (fls.08/09).
Procedida à citação (fl.12), a Demandada ofereceu contestação (fls. 13/20), bem como procuração e documentos (fls. 21/25).
Em sua resposta, a Ré afirmou que a Autora realizou compras no seu estabelecimento, assinando inclusive 04 notas promissórias, todas nos valores de R$-31,95=, demonstrando assim sua boa-fé e lisura. Levanta voz acerca da exorbitância do valor pleiteado a título indenizatório, inadmitindo sua possibilidade. Pede, a final, seja julgada a ação totalmente improcedente.
Réplica apresentada regularmente (fls.27/29).
A Audiência de conciliação restou frustrada, em decorrência da ausência da Demandante(fls. 35).
É o relatório. D E C I D O.
O caso é de julgamento antecipado da lide, com base no artº. 330, I, do CPC, porquanto desnecessária a produção de prova em audiência acerca da matéria fática, a qual encontra-se suficientemente demonstrada nos documentos insertos nos autos.
O cerne da questão, no caso sub judice, consiste em aferir se ocorreu a inscrição sem justa causa do nome da Autora nos órgãos restritivos de crédito, especificamente no SPC.
Cumpre, portanto, aferir se ocorreu defeito na prestação dos serviços da Demandada, decorrente de procedimento culposo de seus prepostos, capaz de ensejar indenização por danos morais padecidos pela Autora com a inscrição indevida do seu nome no SPC.
Ao exame da prova documental produzida nos autos, percebe-se que a Ré juntara dados cadastrais da Autora, além de notas promissórias supostamente por ela assinadas. Entretanto há qualquer documento informando efetivamente o que foi comprado, ou mesmo a nota fiscal da suposta venda foi apresentada.
Cumpre ainda salientar que as notas promissórias apresentadas não foram devidamente preenchidas, pois não há indicação dos dados do emitente e do credor. Quanto à ficha cadastral, esta traz um endereço diverso do indicado pela Autora em sua peça exordial, fatos estes que foi ressaltados na réplica apresentada pela Autora. Ocorre, entretanto, que a Ré, apesar de apresentar documentos novos na audiência de conciliação, não se manifestara sobre tais irregularidades ora mencionadas.
Devido a escassez de lastro probatório sobre as argumentações suscitadas pelá Ré, que nem ao menos esclarecera qual a origem dos débitos da Demandante, restou incontroverso que ocorreu a inserção indevida do nome da Autora no SPC, em razão da Demandada, por defeito na prestação dos seus serviços, haver atribuído à mesma débito infundado, correspondente a suposta compra.
Faltou, na situação em destaque, o denominado dever de segurança por parte da prestamista dos serviços, de que trata o §1º., artº. 14, da Lei 8078/90, pois ao inserir os dados da Acionante no rol dos devedores por um débito descabido, sem ao menos observar atentamente os documentos porventura apresentados no ato do negócio jurídico.
Como sabido, em casos que tais o prestador de serviços responde de forma objetiva pela reparação dos danos causados aos consumidores pelos defeitos relativos aos serviços prestados, nos termos do artº. 14, caput, do CDC.
A rigor, só restaria afastada, no caso vertente, a responsabilidade da Demandada pelo fato do serviço, se este tivesse provado que o mesmo decorreu de culpa exclusiva do consumidor, no caso a Autora, ou de terceiro, a teor do artº. 14, §3º, II, do CDC.
Outro não é o entendimento jurisprudencial do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, a saber:

“De toda evidência não se pode concluir pela responsabilidade exclusiva do Autor, eis que reconhecida a falha nos serviços do banco-recorrente. Não restaram, portanto, comprovadas as hipóteses elencadas no artº. 14, §3º, II, do CDC, quanto à eventual culpa exclusiva do autor-consumidor e de terceiro. Ademais, esta Corte já se pronunciou sobre constituir ato ilícito a falta de verificação da assinatura aposta em cheque furtado, ensejando irregular inscrição do nome do correntista nos cadastros de proteção ao crédito, mesmo com conta encerrada” (Resp 807132/RS, Min. JORGE SCARTEZZINI, 4ª. Turma, 21/02/2006, DJ 20/03/2006)

O fornecedor de produtos e serviços responde objetivamente pelos eventos decorrentes do fato do produto ou do serviço que provocam danos a terceiros”(REsp 480697/RJ, Min. NANCY ANDRIGHi, 3ª. Turma, 07/12/2004, DJ 04/04/2005).

Nesse sentido também a lição da douta CLÁUDIA LIMA MARQUES, nos seus Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Ed. Rev. Tribunais, 4ª Edição, 2004, in verbis:

“Basta ser vítima de um produto ou serviço para ser privilegiado com a posição de consumidor legalmente protegido pelas normas sobre responsabilidade objetiva pelo fato do produto presentes no CDC”.

Prima facie, com base nos elementos de prova constantes do caderno processual, tenho como caracterizada a responsabilidade da Demandada pelo dano moral puro infligido à Autora, decorrente de ato ilícito, suscetível de ser reparado, materializado na inscrição indevida e injusta do seu nome em cadastro restritivo de crédito.
Consagra o artº. 5º, X, da Carta Magna, a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, assegurando-lhes o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
Pontifica CARLOS ALBERTO BITTAR em sua obra Reparação Civil por Danos Morais, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1993, pág. 41, que tem-se “como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se, portanto, como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)”.
No caso vertente, o dano moral resultou da inscrição indevida e injusta do nome da Autora no SPC, por ordem da Ré.
Como já ressaltado, constitui-se em direito básico do consumidor, dentre outros, previsto no artº. 6º, VI, da Lei nº. 8078/90, a prevenção e efetiva reparação dos danos que padecer, decorrente de relação de consumo, impondo o artº. 14, caput, do CDC a responsabilidade objetiva em casos que tais, independentemente de culpa do fornecedor do serviço defeituoso, porquanto inerente ao risco da atividade que desenvolve.
O artº. 186 do Novo Código Civil reputa como ato ilícito, suscetível de ser reparado, o dano, ainda que exclusivamente moral, infligido a outrem, por negligência, imprudência ou imperícia do infrator.
Por outro lado, a inscrição indevida do nome do consumidor em órgão de proteção ao crédito, para efeito de reparação do dano causado, não demanda seja demonstrado o efetivo prejuízo sofrido pela vítima, o qual é presumido, na medida em que trata-se do denominado ilícito puro.
A jurisprudência consolidada do Egrégio Superior Tribunal de Justiça agasalha o entendimento ora expendido, senão vejamos:

“Consoante jurisprudência firmada nesta Corte, o dano moral decorre do próprio ato lesivo, independentemente da prova objetiva do abalo à honra e à reputação sofrido pelo autor, que se permite, na hipótese, facilmente presumir, gerando direito a ressarcimento” (REsp 775498/PR, Min. JORGE SCARTEZZINI, 4ª. Turma, 16/03/06, DJ 10/04/06 p. 223)

“A exigência de prova de dano moral se satisfaz com a demonstração da existência de inscrição indevida nos cadastros de inadimplentes” (AgRg no Ag 979810/SP, Min. SIDNEI BENETI, 3ª. Turma, 11/03/2008, DJ 01/04/08 p. 1)

A aflição e humilhação por que passou a Autora, por conta do registro indevido do débito, mácula essa que perdurou por quase cinco anos (fls. 05), rotulando-a como inadimplente, durante o tempo em que referida inserção permaneceu em aberto, situa-se no âmbito dos prejuízos de natureza puramente moral.
A fixação do valor da indenização dos danos morais, por sua vez, não é tarefa fácil, devendo contudo ser assentada nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, de modo a coibir a reincidência do causador do dano sem enriquecer a vítima.
Na lição dos jovens e talentosos juristas PABLO STOLZE e PAMPLONA FILHO, no Novo Curso de Direito Civil, vol. III – Responsabilidade Civil, 4ª. Edição, 2006, Ed. Saraiva, pág. 50, “a reparação, em tais casos, reside no pagamento de uma soma pecuniária, arbitrada judicialmente, com o objetivo de possibilitar ao lesado uma satisfação compensatória pelo dano sofrido, atenuando, em parte, as conseqüências da lesão”.
A jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, por seu turno, subsidia com parâmetros justos e critérios a serem observados na fixação do quantum indenizatório em casos da espécie, in verbis:

“O quantum, a título de danos morais, equivalente a até 50 (cinqüenta) salários mínimos, tem sido o parâmetro adotado para a hipótese de ressarcimento de dano moral em diversas situações assemelhadas (e.g.: inscrição ilídima em cadastros; devolução indevida de cheques; protesto incabível)” (EDcl no Ag 811523/PR, Min. MASSAMI UYEDA, 4ª. Turma, 25/03/2008, DJ 22/04/2008 p. 1)

“Considerando que a quantia indenizatória arbitrada a título de danos morais guarda proporcionalidade com a gravidade da ofensa, o grau de culpa e o porte sócio-econômico do causador do dano, não deve o valor ser alterado ao argumento de que é excessivo” (REsp 780548/MG, Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, 4ª. Turma, 25/03/2008, DJ 14/04/2008, p. 1)

Levando-se em conta as diretrizes doutrinária e jurisprudencial acima expostas, evidencia-se do in folio que a Autora é pessoa de mediana situação financeira, presumivelmente honesta e de boa reputação infere-se, ainda, a relevância da intensidade do seu sofrimento, abalada que foi em sua honra e reputação, pela permanência indevida do seu nome no Serasa e SPC, tornando notória a informação do suposto débito, porquanto ficou com o seu nome exposto no aludido órgão restritivo de crédito por quase quatro anos.
Da sua qualificação inicial denota-se ter nível de instrução média, ser comerciante, existindo ainda outros elementos que indicam fazer parte da classe social definida pelos institutos como média, fatores esses que também influenciam na fixação do valor indenizatório.
Ressalte-se que não obstante o fato de a Autora possuir atualmente vários apontamentos no cadastro do SPC (fls. 37/39), no momento em que a Ré negativara seus dados nesta instituição a Demandante não possuía restrição alguma, como pode ser constatado pelo documento de fls. 05.
Em relação à Demandada, trata-se de empresa comercial de médio porte, que reúne condições de suportar ressarcimento proporcional ao ato ilícito praticado, e cujo caráter didático seja capaz de inibir a sua reincidência, prevenindo, assim, o universo de consumidores que integram a sua clientela de virem a padecer danos morais por falhas da mesma natureza.
Assim, por todas as razões, objetivas e subjetivas, supra analisadas, em face da inscrição indevida e injusta do nome da Autora no já mencionado órgão restritivo de crédito, faço uso do arbitrium boni viri para fixar o valor indenizatório de R$-5.450,00=, equivalente a 10 (dez) salários mínimos.
Ante o exposto, com fundamento nos dispositivos legais acima invocados e no artº. 269, I, do CPC, ao tempo em que ratifico a liminar de fl. 08/09, julgo PROCEDENTE o pedido deduzido contra a Demandada, COMETA CALÇADOS TLDA., para condená-la a pagar à Autora, a título de indenização pelos danos morais que lhe causou, a importância de R$-5.450,00= (cinco mil, quatrocentos e cinquenta reais), decorrente da inscrição indevida e injusta do seu nome em órgão de proteção ao crédito (SPC), devidamente corrigida pelo INPC, a partir desta data (Súmula 362 do STJ), acrescida de juros de mora, a contar da data do evento danoso (15/05/2002), no percentual de 12% (doze pct.) a.a., nos termos do artº. 406 do Novo Código Civil, por se tratar de responsabilidade extracontratual (Súmula 54 do STJ).
Em face da sucumbência, condeno a Demandada no pagamento integral das custas processuais (artº. 20, caput, do CPC).
Arrimado no artº. 20, §3º, do CPC, arbitro honorários advocatícios em 15% (quinze pct). sobre o valor da condenação, pela Demandada.

P.R.I.