O voto contraponto

Publicado por: redação
09/10/2012 06:40 AM
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Luiz Holanda

O ministro Ricardo Lewandowski, revisor da ação penal 470, mais conhecida como o processo do mensalão, não se cansa de agradecer a Lula sua indicação para o Supremo Tribunal Federal-STF. Mesmo dando a impressão de estar cumprindo uma função que lhe teria sido imposta para inocentar os integrantes do chamado núcleo político da República de São Bernardo, confessa que houve compra de votos, mas que “há provas para todos os gostos”. Para uns, a imagem que ele passa é de um pagador de promessa. Para outros, sua atuação traduz simplesmente lealdade aos amigos de sempre. O que não se pode nem se deve imaginar - até porque seria uma tragédia-, é que o ministro esteja sob forte pressão de quem o indicou, a exemplo do seu colega Gilmar Mendes, que reagiu à altura.

Há ainda um sentido trágico em sua atuação. O seu voto contraponto (assim denominado por ele próprio), tão logo proferido, implica numa imediata entrevista à mídia para afirmar que um juiz não deve ceder a pressões, mas sim julgar de acordo com a sua consciência. Embora não se saiba de qual consciência ele está falando, o certo é que as condenações dos réus estão sendo lavradas por um colegiado em que sete dos dez ministros foram indicados pelo PT, ou seja, pelo ex-presidente Lula e por dona Dilma Roussef. Mesmo assim, suas excelências estão demonstrando uma independência jamais vista nesses últimos quarenta anos, já que, nesse período, nenhum político foi condenado.

Não deixa de ser positivo saber que mesmo que ninguém, na prática, vá para a cadeia - já que os recursos protelatórios mandarão para as calendas qualquer decisão definitiva-, o fato é que as condenações até agora proferidas revelam alguns ganhos jurídicos e institucionais capazes de inibir, mesmo que por pouco tempo, a ação deletéria dos corruptos no Congresso Nacional, um dos poderes mais nefastos da República. Pouco importa se o ministro Lewandowski insiste em manter a impunidade em seu voto contraponto. Seus colegas decidiram dar um basta a tudo isso, tentando acabar com os crimes cujas vítimas são o povo e as próprias instituições. Para justificar suas desavenças com o relator, que ele insiste, indiretamente, em humilhar, afirmou que “cada juiz tem uma visão particular do conjunto de provas que existe no processo. Então, esse contraponto entre relator e revisor ajudará os demais ministros a decidirem o que se contém nos autos”.

Realmente, os demais ministros estão decidindo que quando uma nação consegue impedir que as instituições sejam assaltadas pelos seus dirigentes, ela avança na conquista de um elevado nível político, social, administrativo e moral para seus cidadãos. Esse é o pensamento do STF, notadamente de ministros como Celso de Mello, para quem o ato de corrupção constitui um gesto de perversão da ética do poder e da ordem jurídica, que não tolera quem corrompe nem quem se deixa corromper. Tal demonstração contribui para assegurar que nosso país possa progredir num cenário de estabilidade política, jurídica e institucional. Estamos diante de uma grande oportunidade para reverter a forma como encaramos a corrupção. Ou continuamos garantindo sua prática pela impunidade ou evitamos que nossa frágil democracia sucumba diante de nossa falta de coragem para punir os corruptos.

Por isso é importante, neste momento, que a sociedade apóie os ministros independentes do STF, cujos votos expõem ao povo a indecência e a imoralidade dos crimes cometidos pela alta cúpula do governo petista. Em contrapartida, devemos lamentar que os ministros Lewandowski e Dias Toffoli usem o artifício da digressão para agradecer os que lhes forneceram a toga. Isso é mais do que suficiente para impedir que a impunidade fomente a corrupção e a criminalidade, independentemente do voto contraponto.

Luiz Holanda é professor de Ética e de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Universidade Católica do Salvador-UCSAL.

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