Des. Carlos Roberto Santos Araujo, TJBA, fulmina decisão ilegal da 3ª Vara Crime de Feira de Santana-BA

Publicado por: redação
23/12/2010 12:00 AM
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Des. Carlos Roberto Santos Araujo, TJBA, fulmina decisão ilegal da 3ª Vara Crime de Feira de Santana-BA

Salvador (17/12/2010)  A Defensoria Pública da Bahia , impetrou pedido de Habeas Corpus em favor de ADILTON DOS SANTOS PORTUGAL, apontando-se como autoridade coatora o MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Crime da Comarca de Feira de Santana-BA. Afirma a Defensoria em seus argumentos que o paciente foi internado no HCT em 02/08/2010 para realizar o exame de sanidade mental, por determinação do "a quo" (juíz de primeiro grau), estando privado de sua liberdade há quase 06 (seis) meses. O desembragador Carlos Roberto Santos Araujo nos enriquece com suas lições de Direito Processual Penal e colaciona em sua decisão, os seguintes ensinamentos:

"  Nota-se que não se trata de crime cometido mediante violência nem grave ameaça, mas sim de um delito de potencial ofensivo muito reduzido, que tem pena mínima cominada em 04 (quatro) meses de reclusão (art. 155, c/c art. 14, II, CP). A medida cautelar deve ser proporcional à pena projetada. Como admissível a substituição da pena corporal por restritiva de direitos e subsidiariamente o sursis, neste caso não se deve usar a prisão provisória. Esta há de ser proporcional ao resultado. Inadmissível seja mais onerosa que a própria pena. Questão de proporcionalidade. Enfim, se eventual condenação não leva à prisão, por que manter antecipadamente preso o acusado? A prisão processual só é possível, se ele não fizer jus, caso condenado, a uma pena alternativa ou benefícios processuais, tais como o sursis. Nestes casos, o juiz deve lançar os olhos para o futuro e projetar a hipótese da reprimenda. Isto porque a prisão provisória somente pode ser utilizada quando possível condenação por infração passível de pena privativa de liberdade. É que o gravame imposto pela medida cautelar não pode exceder o da possível condenação".

Dessa forma, resta evidenciado que o tempo pelo qual o paciente permanece preso (quase seis meses) ultrapassa a pena mínima do referido crime (quatro meses), o que evidencia a manifesta ilegalidade da prisão do paciente. Não há como negar que, de fato, houve constrangimento ilegal passível de correção pela via do habeas corpus, dada a violação ao devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). Outrossim, não se pode esquecer que a prisão é medida excepcional, que deve atender à legalidade e aos direitos individuais, sob pena de configurar constrangimento ilegal. Assim, defiro a liminar pleiteada para relaxar a prisão do paciente. Sentenciou o ilustre magistrado "ad quem" (instância superior) . Venceu a justiça, venceu o pobre coitado e vence a atuação da Defensoria Pública do Estado da Bahia.

O juiz erra sim e seu erro se verifica quando sua decisão é modificada pela instância superior como vimos acima. Não bastasse a modificação pura e simples, ela vem sempre embasada de verdadeiras aulas de direito processual, jurisprudências e doutrinas. Esse comportamento contumaz  de alguns juizes de primeiro grau remete-nos a uma pergunta: porque o Direito desses juízes são tão diferentes  das instâncias superiores? A resposta é óbvia, falta de informação  e despreparo. Mas ate quando o jurisdicionado terá que suportar esse onus? Decisões descuradas só alimentam a morosidade dos processos, causam danos as partes, abarrotam as Câmaras Cíveis e Criminais de nossos Tribunais . A boa noticia é que sempre são derrubadas, aniquiladas com rigor seja pelos tribunais de segundo ou terceiro grau e ainda pelo CNJ. Erros tão primários e tão lesivos a população, devem ser repudiados e cada vez mais serem colocados a público pela imprensa especializada para que o jurisdicionado tenha uma melhor compreensão das diferenças de julgadores.  Diz o professor Robson Zanetti, especialista em Direito Comercial pela Università degli Studi di Milano:

“O advogado quando perde uma ação tem ponto negativo com seu cliente. Se ele perde não somente uma, mas várias ações, seu cliente mudará de advogado. Porque não fazer isso com os juízes que erram? Propomos com a reforma do Poder Judiciário que seja criado um sistema de pontuação para os juízes que erram. Digamos que se sua decisão for modificada em segundo grau, ele perderá um ponto e se for na instância máxima, dois pontos. Dessa forma, quando ele atingir um determinado número de pontos, deverá ser demitido por justa causa porque o conhecimento que ele teve para passar no exame de admissão ao cargo já não está mais atualizado com a realidade. O juiz, no mínimo, deve estar atualizado.

Não é possível fazer com que a sociedade e, sobretudo os advogados tenham que agüentar tantos equívocos dos nossos juízes, erros e mais erros constantemente praticados, muitas vezes de forma abusiva, não podendo o advogado sequer questioná-los, para que não seja perseguido posteriormente. É claro que existem exceções com relação aos juízes, principalmente nas instâncias superiores, tendo em vista que esses algumas vezes têm um pouco mais de conhecimento e experiência. Os tempos mudaram, estamos no século da informação, a concorrência aumenta em todos os setores da sociedade, já não é mais possível agüentar tantos erros praticados pelos juízes, principalmente os juvenis, que pensam muitas vezes que seu poder está acima do Criador.

A partir do momento em que os juízes forem obrigados a concorrer entre si para errar menos e pensar mais nas suas decisões, na busca de melhores soluções jurídicas, essa será uma conseqüência natural da melhor aplicação do direito. “Com isso, toda a sociedade terá uma maior segurança jurídica na solução de seus casos, eliminado-se os maus julgadores do mercado concorrencial do direito”. Veja o inteiro teor da decisão do relator

DL/mn


Inteiro Teor da Decisão:

Segunda Câmara Criminal

HABEAS CORPUS Nº 0016826-43.2010.805.0000-0

IMPETRANTE: Defensoria Pública da Bahia

PACIENTE: Adilton dos Santos Portugal

IMPETRADO: JUIZ DE DIREITO DA 3ª VARA CRIME DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA

RELATOR: DES. CARLOS ROBERTO SANTOS ARAÚJO

DECISÃO

Trata-se pedido de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado pela Defensoria Pública, em favor de ADILTON DOS SANTOS PORTUGAL, apontando-se como autoridade coatora o MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Crime da Comarca de Feira de Santana-BA.

Afirma que o paciente foi preso em flagrante em 15/06/2010 e denunciado pela prática do crime previsto no art. 155 c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.

Aduz que o paciente foi internado no HCT em 02/08/2010 para realizar o exame de sanidade mental, por determinação do impetrado, estando privado de sua liberdade há quase 06 (seis) meses.

Pugnou pela concessão da medida liminar, bem como que no mérito seja julgada procedente a ordem de Habeas Corpus.

Juntou documentos de fls. 08/17.

Brevemente relatado, passo à análise do pedido de liminar.

A medida liminar consiste na obtenção prévia e antecipada daquilo que só se obteria ao final, quando da prolação da decisão definitiva. Fundada em requisitos, quais sejam, fumus boni iuris e periculum in mora, o Magistrado, antevendo a existência destes no caso concreto, antecipa os efeitos do provimento jurisdicional definitivo.

No caso em apreço, da análise dos documentos colacionados à inicial vislumbro a presença dos requisitos autorizadores da liminar.

Nota-se que não se trata de crime cometido mediante violência nem grave ameaça, mas sim de um delito de potencial ofensivo muito reduzido, que tem pena mínima cominada em 04 (quatro) meses de reclusão (art. 155, c/c art. 14, II, CP).

A medida cautelar deve ser proporcional à pena projetada. Como admissível a substituição da pena corporal por restritiva de direitos e subsidiariamente o sursis, neste caso não se deve usar a prisão provisória. Esta há de ser proporcional ao resultado. Inadmissível seja mais onerosa que a própria pena. Questão de proporcionalidade. Enfim, se eventual condenação não leva à prisão, por que manter antecipadamente preso o acusado? A prisão processual só é possível, se ele não fizer jus, caso condenado, a uma pena alternativa ou benefícios processuais, tais como o sursis. Nestes casos, o juiz deve lançar os olhos para o futuro e projetar a hipótese da reprimenda. Isto porque a prisão provisória somente pode ser utilizada quando possível condenação por infração passível de pena privativa de liberdade. É que o gravame imposto pela medida cautelar não pode exceder o da possível condenação.

Nesta linha de intelecção é o entendimento do ilustre doutrinador Luiz Antônio Câmara:

“Vê-se nitidamente que, por força deste princípio, o acusado (ou mesmo o ainda indiciado) somente pode permanecer no cárcere se houver previsão razoável de que será condenado. E mais: somente se justifica a permanência na prisão se a projeção demonstra que, prolatada contra ele decisão condenatória, será obrigado a sujeitar-se preso à execução da pena.

Destarte, conseqüência mais do que lógica da conclusão em destaque no parágrafo anterior é que, tendo o Magistrado em mãos as provas provisórias e visualizando – insista-se que essa antevisão não constitui tarefa complexa – a possibilidade (ou mesmo probabilidade) de que o acusado virá, ao final do processo, a ser absolvido, ou ainda condenado desde que se lhe possa conceder sursis ou regime aberto (ou, indo mais longe, semi-aberto) não detém a faculdade de determinar que o processado aguarde preso o julgamento do processo a que foi submetido.” (CÂMARA, Luiz Antônio. Prisão e liberdade provisória: lineamentos e princípio do processo penal cautelar. Curitiba: Juruá, 1997.)

Ademais, o paciente está preso há quase 06 (seis) meses, em razão da prática de delito sujeito a pena mínima menor que 01 (um) ano de reclusão. A admitir-se a infração, a pena não poderá afastar-se muito do mínimo legal, em razão dos referenciais do art. 59 do Código Penal, tendo em vista que, no Brasil, prevalece a “teoria da pena mínima”, vale dizer, os juízes, raramente, aplicam pena acima do piso e, quando o fazem é uma elevação ínfima, bem distante do máximo, com possibilidade de conversão em pena alternativa ou a concessão de sursis.

Tudo está a demonstrar, enfim, a desproporcionalidade entre a conduta praticada (tentativa de furto) e a segregação cautelar do paciente que, certamente, se condenado, cumprirá pena em regime bem menos grave do que a condição em que se apresenta, ou seja, o mal causado durante o curso do processo é bem maior do que aquele, possivelmente, poderia ser infligido ao acusado quando do seu término.

Ora, não se pode manter a prisão em flagrante pura e simplesmente porque o acusado foi flagrado praticando o delito. É necessário avaliar se há medida menos gravosa com igual eficácia, com menor custo sobre a pessoa do acusado.

No caso em tela, quando do julgamento do mérito deste habeas corpus, é possível que o paciente já tenha cumprido a pena, antes mesmo do provimento judicial definitivo na ação penal a que responde.

Ademais, não há notícias de que o processo seja complexo ou alguma outra informação que justifique a demora, pois se trata de crime de tentativa de furto, sem uma pluralidade de acusados.

Dessa forma, resta evidenciado que o tempo pelo qual o paciente permanece preso (quase seis meses) ultrapassa a pena mínima do referido crime (quatro meses), o que evidencia a manifesta ilegalidade da prisão do paciente.

Não há como negar que, de fato, houve constrangimento ilegal passível de correção pela via do habeas corpus, dada a violação ao devido processo legal (CF, art. 5º, LIV).

Outrossim, não se pode esquecer que a prisão é medida excepcional, que deve atender à legalidade e aos direitos individuais, sob pena de configurar constrangimento ilegal.

Assim, defiro a liminar pleiteada para relaxar a prisão do paciente.

Expeça-se alvará de soltura, se por al não estiver preso.

Requisitem-se informações ao culto Magistrado. Após, se em termos, dê-se vista destes à d. Procuradoria de Justiça.

Publique-se. Intimem-se.

Salvador, 16 de dezembro de 2010.

Des. Carlos Roberto Santos Araújo

RELATOR

Fonte: DPJ BA ( 17/12/2010)

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