Justiça declara abusivas as cláusulas do Bradesco Saude e R$ 80 Mil por danos morais por obstar o atendimento médico

Publicado por: redação
27/07/2011 02:30 AM
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Inteiro teor da decisão:

 

 

 

 

0050911-67.2001.805.0001 - DECLARATORIA

Apensos: 1823684-5/2008

Autor(s): Jussileuza Brito De Souza

Advogado(s): Manuela Tourinho Cerqueira, Raimundo Alfredo Tourinho Cerqueira, Antonio Peres Junior Oab/Ba 1.020-A

Reu(s): Bradesco Saude Sa

Advogado(s): Betânia Rodrigues Oab/Ba 15.356

Sentença:  Vistos etc.1. RELATÓRIO.JUSSILEUZA BRITO DE SOUZA, já qualificada nos autos, propôs a presente AÇÃO DECLARATORIADE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS MORAIS E MATERIAIS, BRADESCO SAÚDE, pelas razões de fato e de direito a seguir aduzidas.
Alega que e m 26 de julho de 1994, firmou com o Réu Contrato Particular de Prestação de Serviços Médicos e Hospitalares – MULTISAÚDE – PESSOA FÍSICA, apólice: 227544119909.
Diz que em razão do contrato, comprometeu-se a parte Ré a prestar serviços de assistência Médica, hospitalar e auxiliares de diagnóstico e terapia, conforme ás cláusulas do referido contrato.
Afirma que há mais de sete anos é beneficiário dos serviços da parte Ré, que sempre cumpriu com os deveres de suas obrigações, adimplindo as mensalidades e nunca esteve em débito, apresentando os recibos de pagamentos.
Declara que em 24 de janeiro de 1999, necessitando de atendimento médico geral especializado na cidade de Maceió/AL, deu entrada na emergência da Santa Casa de Misericórdia, sendo posteriormente encaminhada à neurocirurgia, após a confirmação de ANEURISMA CEREBRAL MÉDIA À ESQUERDA, sofrendo cirurgia em 01/02/199.
Informa que em 25/03/199, foi encaminha da à UTI, porém, alguns médicos sinalizaram pela necessidade de fisioterapia respiratória e motora, sendo que a prestação dos serviços requeridos foram negados pela Ré, sob a alegação de que a Autora teria excedido o número de sessões determinados no contrato que é de até 40 (quarenta) sessões por evento (acidente).
Sinaliza que diante da negativa, foram contratados fisioterapêutas particulares por seu companheiro André Pierre Jurquet, o qual desde a internação da Auotra na UTI – Geral, em 25/03/1999, arca com todas as despesas fisioterapêuticas, e ainda, que tentou o reembolso das despesas junto a Ré, tendo o requerimento negado, sob a mesma argumentação de excesso.
Aduz que agravou o quadro de saúde, necessitando de Internação Domiciliar, sendo negado o atendimento pela Ré, mais uma vez.
Aduz ainda, que mesmo estando legalmente coberta e em dia com os pagamentos das mensalidades, foi-lhe negado a prestação do serviço, solicitado por profissional, portanto, sofreu danos morais, em relação intima e direta com a ação da Ré. Que a conduta foi injuriosa manifestada pela proibição dos serviços médicos a que estava obrigada, causando danos de natureza moral.
Requereu, por fim a Autora a procedência dos, para declarar a nulidade da referida cláusula contratual, tornando-a nula, tendo em vista que sua permanência constitui, conduta abusiva, ilegal e arbitrária, e a condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais e o ressarcimento dos danos materiais. Com os autos vieram os documentos de fls. 23/87.
Devidamente citada, a Ré apresentou contestação fls. 89/103, no prazo legal.
Argüi, no mérito que nenhuma razão assiste a Autora, que é evidente e indiscutível falta respaldo legal à pretensão da Autora pois esta firmou contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares com a Ré.
Diz que não pode arcar sem qualquer contrapartida, arcar com as despesas necessárias ao tratamento médico-hospitalar da Autora, no que se relaciona com as enfermidades decorrentes da doença que a vem afligindo.
Sustenta que a Autora requereu autorização para fisioterapia, não decorrente de acidente pessoal, visando tratamento de sua patologia, cumprindo ressaltar, que se trata, portanto, de tratamento excluído do contrato firmado entre as partes.
Aque a Autora não comprova o cumprimento de suas obrigações de conveniado.
Declara que nenhuma ofensa à honestidade da Autora está configurada nos fatos por ela narrados na inicial, que não conseguiu demonstrar, nem provar prejuízo material e que não se configura dano moral devido ao fato de não ser atendido, pela outra parte de um contrato, numa pretensão por considerada indevida.
Afirma que Autor não tinha cobertura contratual para que lhe fosse prestado, pela parte com quem firmou contrato, o serviço solicitado pelo médico.
Argumenta a inexistência de ilegalidade e de abusividade, no dispositivo contratual atacado.
Ao final requereu, que os pedidos da Autora sejam julgados como improcedentes.
A Autora apresentou réplica às fls. 228/237, combatendo as alegações do Autor e ratificando a inicial.
As fls. 241/243 foi requerida a habilitação processual de VICTÓRIA BRITO JURQUET, representada por ANDRÉ PIERRE JURQUET, em face do falecimento da Autora (fls. 244).
Audiência de conciliação as fls. 262, presentes as partes, foi requerido o cumprimento de diligência e ao final, pugnaram os Advogados dos litigantes, pelo julgamento antecipado da lide.
O Ministério Público foi intimado para intervir no processo, tendo em vista que a parte habilitada no processo em face do falecimento da Autora é menor.
As fls. 296/307, se manifestou o representante Ministerial.
Na Ação Cautelar Inominada proposta sob o nº 0036972-20.2001.805.0001, apenso a estes autos requereu o deferimento da prestação de serviços, tendo sido acolhido o requerido ás fls. 52/54 e 83/84 dos autos, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais) no descumprimento.
A sentença da Ação Cautelar foi por total procedência dos pedidos, ratificando as liminares concedidas e fixando a multa de astreintes em R$ 200,00 (duzentos reais) por dia de descumprimento.
È o relatório essencial.
Posto isto, Decido.

2. DISCUSSÃO.
Uma vez que a matéria ventilada é eminentemente de direito, comporta o julgamento antecipado da lide. Assim, dispensando o Magistrado a produção de novas provas, sinaliza o mesmo que aquelas já constantes dos autos são suficientes ao seu convencimento, como defende o artigo 330, I do CPC.
Concorrem, inquestionavelmente, no caso “sub judice”, os pressupostos processuais e as condições da ação. Adentro, pois, o “meritum causae”, com a seguinte motivação:
No caso vertente, a Autora descreveu o fato, invocou o direito e pediu a procedência dos pedidos com a declaração de nulidade das cláusulas abusivas e a condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais e materiais causados, além das custas e honorários advocatícios.
Assim sendo, a presente demanda deve ser analisada sob a égide do CDC, instituído pela Lei nº 8.078/90, que define como consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Isso pelo fato de que, por analogia, no caso presente restou caracterizada a relação de consumo travada entre os litigantes.
Urge esclarecer que o Código de Defesa do Consumidor, abrange todas as relações de consumo. Dessa sorte, quando o diploma legal específico não for aplicável à matéria, pertinente buscar a solução do conflito por intermédio da aplicação da norma geral.
Preceitua a Lei nº 8.078/90 que são nulas de pleno direito, dentre outras, as cláusulas que venham a estabelecer obrigações iníquas, colocando o consumidor em desvantagem exagerada. Considera-se obrigação abusiva imposta pelo fornecedor aquela que restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual.
No caso sob análise restou evidenciado a necessidade da Autora à submeter-se a tratamento fisioterapêutico, porém o plano recusou-se a liberar tal procedimento alegando que foi ultrapassada o limite de atendimento específico requerido que é 40 (quarenta) sessões por evento (acidente).
Pensa-se, a Autor contrata um plano de saúde, porque precisa, efetua pagamentos, e no momento que mais precisa simplesmente recebe um NÃO por parte da empresa Ré, tendo que esperar, por mais um evento para ter liberado o seu entendimento. Esta atitude da Ré soa de forma excessivamente abusiva. Resta clarividente a abusividade, da cláusula em que estabelece tal procedimento.
Deve-se observar que a cláusula que limita o tratamento em 40 (quarenta) sessões por evento, é considerada NULA pois, incluída em contrato de adesão, coloca o consumidor em desvantagem exagerada, incompatível com a sua boa-fé e equidade, como preconiza o Art. 51, IV da Legislação Consumerista, vejamos:
“Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade”.

Tem-se no caso, então, direitos sobre direitos, onde deve prevalecer a natureza do mais importante. Por isso, a cláusula referente que limita o tratamento em 40 (quarenta) sessões por evento há de ser considerada LEONINA, por infringir, em face das circunstâncias em tela;
Frise-se, ainda que a Lei de nº9.656/98 art. 35-C, dispõe que:

“Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009)
II - de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional; (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009)”

O que se observa nos autos é que a Ré não autorizou nenhum dos procedimento requeridos pelos médicos, após o suposto excesso, e que o companheiro da Autora, arcou com todas as despesas médico hospitalares não tendo contrapartida.
mencionar que, tal como posta a cláusula de limitação de tratamento, num país em que o atendimento da saúde pública está caótico, sendo de conhecimento comum o altíssimo custo de qualquer internação hospitalar, a sua abusividade é patente. Não se trata de ignorar a autonomia da vontade na realização dos contratos, mas de adequar aquela, sobretudo nos contratos de adesão, aos limites de proteção ao Código do Consumidor.
Não obstante a fundamentação acima, deve-se ressaltar, também, que o caso é de responsabilidade objetiva e entre o fato e o dano descritos na peça inicial verifica-se, devidamente demonstrado, o nexo de causalidade, apontando o Réu como responsável pelos danos e transtornos causados a Autora.
Também, é de bom alvitre citar que a parte Ré, quando em sede de contestação e em todo o desenrolar processual não trouxe ao conhecimento deste Juízo, nenhum documento, frise-se, nenhum documento que alicerce as suas exposições, tendo como base apenas alegações evasivas e genéricas da situação.
Ao tratar do onus probandi, leciona o festejado MOACYR AMARAL SANTOS, em seus Comentários ao CPC, vol. IV, Forense, 1977, pág. 36, que “são princípios fundamentais do instituto os seguintes:

1º. Compete, em regra, a cada uma das partes fornecer a prova das alegações que fizer.
2º. Compete, em regra, ao autor a prova do fato constitutivo e ao réu a prova do fato impeditivo, extintivo ou modificativo daquele”.

No mesmo diapasão a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

“Seguro. Fato impeditivo do direito do Autor. Ônus da prova. Dever do Réu. Compete ao Réu a prova do fato impeditivo do direito do autor, artº. 333, II, do CPC. (AgRg no Ag. 672865/DF, Min. CASTRO FILHO, 3ª. Turma, 15/08/2006)

“Indenização. Compete ao autor a prova do fato constitutivo do seu direito e ao réu cabe a prova quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor” (REsp 535002/RS, Min. CÉSAR ASFOR ROCHA, 4ª. Turma, 19/08/2003).

Ainda, adverte Marcus Acquaviva, em lúcido comentário ao dispositivo legal supra mencionado, que:

“quanto às regras ordinárias de experiência, vale dizer que o magistrado, ao apreciar a causa, deve apreciar e valorar as provas dos autos, mas paralelamente servir-se de sua experiência na observação dos fatos análogos do cotidiano e do que comumente acontece”. (Cf. Valdemecum do Código de Defesa do Consumidor, 1ª ed, 1998, p. 25).

O que se verifica no caderno processual é a juntada de diversos documentos pela parte Autora, para demonstrar a prova do fato constitutivo do seu direito, e nenhum documento da parte Ré, isso inclusive, é apontado em parecer do Ministério Público as fls. 298, o que ratifica o entendimento deste Juízo.
A eminente doutrinadora Maria Helena Diniz afirma que:

gA responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano moral ou patrimonial causados a terceiros, em razão de ato por ela mesmo praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”.

Esta definição demonstra que, para que haja a efetiva responsabilidade, é necessária a coexistência de três requisitos: a culpa do agente, o dano e o nexo causal entre a culpa do agente e o dano, o que está comprovado no caso em discussão. Sendo inclusive acumuláveis os pedidos de dano moral e material como preconiza a Súmula 37 do STJ: “SÃO CUMULAVEIS AS INDENIZAÇÕES POR DANO MATERIAL E DANO MORAL
ORIUNDOS DO MESMO FATO.”
A violação a honra e a imagem de outrem, afrontam diversos princípios constituionais, entre eles a dignidade da pessoa humana, e ainda, o artigo 5º, inciso X da Constituição Federal diz que: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”
Também o Código Consumerista trata do assunto em seu artigo 6º, aplicável ao caso:
São direitos básicos do consumidor:
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
Sendo assim, quando houver dano a honra, imagem, intimidade e vida privada, quem cometeu o ato ilícito deve indenizar.
O Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sua jurisprudência firmou o seguinte entendimento sobre o tema:

“Consoante jurisprudência firmada nesta Corte, o dano moral decorre do próprio ato lesivo, independentemente da prova objetiva do abalo à honra e à reputação sofrido pelo Autor, que se permite, na hipótese, facilmente presumir, gerando direito a ressarcimento”. (Resp 775498/PR, Min. Jorge Scartezzini, 4ª Turma, 16/03/06. DJ 10/04/06 p. 223).
Como já supramencionado o dano material é perfeitamente cabível no caso em discussão, com base no dano emergente.
Verifica-se em documentos juntados pela Autora, de forma robusta, que as despesas foram arcadas particularmente, não tendo contrapartida da parte.
Os recibos, todos fornecidos por profissionais de saúde, que labutaram no tratamento para melhora da parte Autora, e que expediram diversos pareceres e relatórios médicos atestando a necessidade da continuidade da prestação de serviços, como se desprende em diversas passagens dos autos (fls. 23, 47, 55, 56, 57, 58, 59).
Ainda, as fls. 57, esta cristalinamente demonstrado que a parte Ré, suspendeu o tratamento, sequer reembolsando os valores pagos pela Autora aos tratamento pagos à parte.
Diante das fartas exposições, não restam dúvidas que o dever de indenizar está caracterizado, no caso em tela.
Quanto ao valor da indenização dos danos morais será, sempre, fixado pelo juiz para abrandar o sofrimento anímico ou psíquico da vítima, decorrente da lesão ou trauma a ela infligido, com o devido cuidado para não lhe enriquecer sem causa, nem servir de estímulo à recidiva do ofensor, tudo devendo ser feito para que também represente papel pedagógico e reprimenda indelével a quem cometeu o desatino, observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
No que concerne ao dano material, serão valorados os danos emergentes, do qual a Autora teve prejuízo, devendo o causador do dano, indenizá-lo.

3. CONCLUSÃO
do exposto, JULGO PROCEDENTESos pedidos da Autora, ao tempo que declaro como abusivas as cláusulas que limitam a quantidade atendimento em 40 (quarenta) sessões por evento, e que também, obstam o atendimento médico de TRATAMENTO FISIOTERAPÊUTICO DE INTERNAÇÃO HOSPITALAR, ratificando assim a sentença cautelar.
Condeno a Ré ao pagamento de indenização por danos morais sofridos pela Autora, na quantia de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, devidamente corrigida, a partir desta data (Súmula 362 do STJ), acrescida de juros de mora de 6% (seis por cento.) ao ano, a teor do artº. 1.062/CC de 1916, a partir da data do evento danoso (25/03/1999 data da negativa do atendimento), até o advento do Novo Código Civil, quando serão calculados em 12% (doze por cento) a.a., nos termos do artº. 406 do CC/2002.
Com base em todos os recibos e notas fiscais acostados aos autos de fls. 26 a 56, condeno a Ré ao ressarcimento dos danos materiais que somados perfazem o montante de R$ 13.674,40 (treze mil, seiscentos e setenta e quatro reais e quarenta centavos), juros de mora e acrescidos de correção monetária pelo INPC, a partir das datas estipuladas nos recibos das fls. Supramencionadas.
Por fim, condeno a Ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 20% (vinte por cento) do valor da causa, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20, § 3º do CPC.
Decorrido o prazo legal sem que tenha sido interposto o recurso cabível, certifique-se e arquive-se, com baixa na Distribuição. P.R.I.