Juiza condena Sul America Aetna Seguro Saude em R$ 5 Mil por danos morais

Publicado por: redação
03/08/2011 05:30 AM
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Inteiro teor da decisão:

 

 

 

0048787-38.2006.805.0001 - Ação Civil Coletiva

Autor(s): Eliana Maria Falcao De Mesquita

Advogado(s): Maria Auxiliadora S. B. Texeira

Reu(s): Sul America Aetna Seguro Saude Sa

Advogado(s): Maria Auxiliadora Garcia Durán Alvarez

Sentença: SENTENÇA
Vistos etc,
ELIANA MARIA FALCÃO DE MESQUITA, devidamente qualificada nos autos, por advogado legalmente habilitado, ajuizou a presente AÇÃO ORDINÁRIA C/C DANOS MORAIS COM PEDIDO LIMINAR E COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA PARA A HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO, contra SUL AMÉRICA SEGURO SAÚDE S/A, também já qualificado, aduzindo em síntese que celebrou com a ré em 08/03/1995 contrato de prestação de serviços médicos, efetuando regularmente o pagamento das prestações, no importe de R$ 172,99 (cento e setenta e dois reais e noventa e nove centavos) quando, em 18/12/2006 foi surpreendida com a notícia de rescisão unilateral do contrato de plano de saúde pela demandada. Afirma que, deixou de quitar a parcela do mês de Dezembro, pois ao se dirigir a rede bancária efetuou o pagamento de janeiro. Alega, ainda, estar passando por sérios constrangimentos de ordem material e moral, pois está impedida de usar o plano, além de todo o processo de reativação administrativamente que tem enfrentado e, pede a antecipação de tutela para compelir a requerida a reativar o contrato, mediante o pagamento pela autora das parcelas em atraso dos meses de dezembro (2005), fevereiro e março (2006). Requer, ao final, que seja mantida a tutela liminar, bem como condenação da ré por danos morais no valor de 100 (cem) salários mínimos, além das verbas de sucumbência.
Juntou os documentos de fls. 14 a 23.
Liminar deferida às fls. 25 a 26.
Citada, a Ré apresentou contestação às fls. 30 a 43, argüindo que o contrato deve ser regido pelo Código Civil de 1916, sendo ato formal e considerado perfeito desde o momento em que o segurador remeteu a apólice ao segurado, afirmando que o contrato que foi assinado pela Demandante e que prevê na cláusula 18, item 18.1 d, o cancelamento do seguro, tendo a parte autora a ciência de todas as cláusulas. Ressalta a validade do princípio da autonomia da vontade privada e que a parte autora foi notificada do cancelamento do seguro, haja vista encontrar-se há 118 (cento e dezoito) dias em atraso a parcela referente a 08/12/2005. Juntou documentos de fls. 44 a 72.
Em réplica às fls. 93 a 100, a autora arguiu preliminarmente a ausência da procuração do advogado da ré, rebatendo as argumentações trazidas na contestação e reiterando os pedidos formulados na exordial.
Da decisão liminar que concedeu a tutela de urgência, a ré interpôs o Recurso de Agravo de Instrumento, juntando cópia aos autos às fls. 74 a 88.
Audiência às fls. 109/110, realizada no dia 09 de Maio de 2009, presente as partes, foi proposta a conciliação, porém a mesma não logrou êxito. O advogado da parte demandante aduziu que diante da inexistência de comprovação dos depósitos regulares mensais e considerando que o posto do Banco do Brasil alocado no Centro de Convenções (local da realização da audiência em testilho), em decorrência de erro no sistema não conseguiu apurar o quanto depositado pela autora, requereu a expedição de ofício para que a instituição financeira mencionada possa trazer aos autos a retificação de adimplência com a liminar deferida pela parte autora. Alternativamente, se não fosse de concordância do MM. Juízo, pugnou pela concessão de prazo para juntada dos comprovantes de depósito. Reiterou o pedido de produção de provas para os fins de direito. O advogado da demandada informou não ter mais provas a serem produzidas.
Outra audiência às fls. 124 a 125, realizada no dia 12 de Novembro de 2009, presente as partes, foi proposta conciliação, porém não foi possível qualquer acordo. O advogado da parte ré aduziu que os comprovantes de pagamento colacionados aos autos pela autora não se mostraram suficientes para atestar o adimplemento total do débito constante no contrato objeto desta lide. Isto porque, a autora somente comprovou o depósito em juízo dos prêmios vencidos a partir de julho de 2006, restando em aberto, portanto, as mensalidades vencidas em dezembro de 2005, janeiro, fevereiro, março, abril, maio e junho de 2006, além de não fazer prova do pagamento em juízo das parcelas referentes aos meses de novembro e dezembro de 2007, bem como do mês de maio de 2008. Ressaltou, ainda, que os valores consignados pela demandante se encontravam desatualizados. Arguiu ainda que, tendo em vista o ofício emitido via internet pelo Banco do Brasil, juntado aos presentes autos na audiência em epígrafe, que demonstra o depósito de 43 (quarenta e três) parcelas, todas no mesmo valor de R$ 172, 99 (cento e setenta e dois reais e noventa e nove centavos), sem todavia demonstrar a correspondência com o mês de pagamento, diante da juntada, pela parte adversa de comprovantes de pagamento que não alcançaram o número de 43 (quarenta e três) depósitos, requereu que fosse oficiada a referida instituição financeira para que a mesma enviasse a este MM. Juízo todos os comprovantes de pagamento dos valores depositados pela autora, com o fito de averiguar a existência de parcelas em aberto e a que meses se referiam tais débitos. A defensora da autora disse que o comprovante de depósito judicial via extrato comprova de forma inequívoca o depósito em juízo de todas as mensalidades desde a data do deferimento da liminar. Afirmou, ainda, que a ausência dos reajustes autorizados pela ANS se justificou pelo desconhecimento da requerente, bem como que a ré não emitiu qualquer notificação para chamar a atenção quanto à necessidade da inclusão dos reajustes, requerendo a aplicação dos reajustes legais, vez que não houve má-fé da demandante, bem como que fosse notificado o Banco do Brasil para informar de forma detalhada o pagamento da mensalidade do plano desde Julho de 2006 até a data da audiência em comento.
Extrato às fls. 126 a 127, comprovando a existência de 43 (quarenta e três) depósitos judiciais efetuados pela autora.
A autora carreou aos autos comprovantes de depósitos judiciais às fls. 131; 133; 134; 135; 136; 137; 138; 139; 140; 141; 142; 143; 144; 145; 146; 147; 148; 149; 150; 151; 152; 153; 154; 155; 158; 159.

Relatado, decido.

A Demandante pretende ver reconhecido o seu direito de manutenção do seguro saúde, pois o Plano de Saúde Demandado rescindiu o contrato unilateralmente, sob o argumento de que tinha respaldo contratual para tal. Afirma a validade do princípio da autonomia da vontade privada e a aplicação do Código Civil de 1916 ao caso.
O CDC prescreve que é direito do consumidor ter acesso a produtos e serviços eficientes e seguros, devendo ser informado adequadamente acerca do conteúdo dos contratos por ele firmado para aquisição desses produtos e serviços, principalmente no que se referem àquelas cláusulas que limitem os direitos do consumidor, como as que autorizam o cancelamento unilateral de contratos.
Nota-se, que a empresa fornecedora, pretende, pelos argumentos insertos em sua contestação, fazer válida cláusula contratual que autoriza a rescisão unilateral do contrato ao confessar que rescindiu o contrato por inadimplemento da autora de 1 (uma) parcela do mesmo, e por expressa previsão contratual de cancelamento do seguro quando da ocorrência de inadimplência por período superior a 60 (sessenta) dias.
No entanto, com sua contestação a seguradora trouxe aos autos o contrato de seguro que não apresenta qualquer destaque na cláusula limitativa de direito do consumidor. Mesmo porque, é dever do fornecedor, nos termos do artigo 6º, III, da lei consumerista, transmitir as informações necessárias ao consumidor de forma clara, precisa e adequada, com base nos princípios da boa fé e da transparência e seus deveres anexos de informação, cooperação e cuidado, abrangendo o justo motivo do cancelamento do contrato e não apenas enviando mera correspondência, o que, sem sombra de dúvidas caracteriza a abusividade da prática comercial da empresa quanto a aplicabilidade da cláusula em discussão.
Isso porque o artigo 54 do CDC assim prescreve:

“Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.”

E na seu § 4º é taxativo:

“as cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão”.

Assim, analisando a recusa da seguradora quanto à manutenção do contrato se verifica que não houve qualquer atitude da autora/segurada para justificá-la, mesmo porque, ainda que o fosse, era da seguradora o ônus de provar os motivos da negativa da continuidade do contrato, e ter adotado todas as cautelas, podendo ter buscado renegociar o valor do contrato e elaborar laudo demonstrativo do desequilíbrio atu , o que não o fez, mesmo tendo a obrigação de aferir as reais necessidades do estado do consumidor e dos recursos necessários para preservação de sua saúde, uma vez que este é a parte hipossuficiente na relação de consumo.
Portanto, não está justificado o motivo do cancelamento do contrato, nem ao menos se oportunizou à autora o direito a qualquer defesa, diante das exigências de clareza e ampla publicidade que deve nortear os contratos consumeristas, ressaltando a autora tentou efetivar o pagamento dos boletos em atraso, que não foram emitidos pela ré, mas não obteve êxito.
Além disso, o CDC ao acolher a teoria da onerosidade excessiva e flexibilizar os princípios da teoria clássica do contrato, quanto à autonomia da vontade, liberdade de contratar e pactum sunt servanda, adotou os princípios da boa fé objetiva, transparência, equidade e valorizando a função social dos contratos visando a garantia do seu equilíbrio e manutenção e autorizou que o consumidor pudesse questionar tais avenças antes, durante e depois de sua existência. Assim, embora não seja certo se falar em renovação de contrato de longa duração, porque este não tem prazo determinado, em sendo a continuidade do contrato ameaçada, existe a possibilidade da discussão da permanência da validade do contrato celebrado, mesmo porque o consumidor possui garantias legais de ser informado de forma clara, precisa e transparente, de todas as cláusulas e condições do contrato sob pena de nulidade dessas cláusulas, se for verificada alguma forma de submissão que apresente excessiva vantagem para o fornecedor, mormente nos contratos de adesão, como é a hipótese destes autos.
A Lei 9.656/98 em seu artigo art. 13, proibiu a denúncia unilateral do contrato, admitindo-a apenas quando houver fraude ou inadimplência desde que haja regular notificação prévia das partes. Fato que não configura o caso em tela, pois apenas em função da livre disposição da autora em quitar o débito e que a mesma teve ciência do cancelamento do seguro, o que demonstra que a notificação, a qual a ré alega ter feito, não foi devidamente realizada, porque sequer juntou aos autos prova de que fez a obrigatória notificação antes de cancelar o contrato.
Em que pese seja a requerida uma instituição privada, que tem nos lucros a sua finalidade precípua, não pode esquecer que os contratos de planos de saúde é um contrato de trato sucessivo, de longa duração, que visa proteger um bem jurídico que é a vida humana e, possui uma enorme importância social e individual, devendo as seguradoras ter consciência que acima da busca de lucros em seu ramo de atividades, está a integridade física e a vida do consumidor.
Assim, não se pode deixar de reconhecer a abusividade da negativa injusta pela empresa ré, pratica que fere os princípios da equidade e provoca o desequilíbrio contratual e conseqüente ilegalidade por abusividade, nos termos do artigo 51 do CDC.
O Superior Tribunal de Justiça tem decidido pela proibição de rescisão unilateral por parte da seguradora, conforme transcrevo abaixo:

“RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
RECORRENTE : DNMS FACTORING LTDA
ADVOGADO : MARCO ANTÔNIO BIRNFELD E OUTROS
RECORRIDO : SUL AMÉRICA AETNA SEGUROS E PREVIDÊNCIA S/A
ADVOGADO : MARCO AURÉLIO M MOREIRA E OUTROS

CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. CLÁUSULA ABUSIVA. NULIDADE. RESCISÃO UNILATERAL DO CONTRATO PELA SEGURADORA. LEI 9.656/98.
É nula, por expressa previsão legal, e em razão de sua abusividade, a cláusula inserida em contrato de plano de saúde que permite a sua rescisão unilateral pela seguradora, sob simples alegação de inviabilidade de manutenção da avença.
Recurso provido.” (Recurso Especial nº 602.397–RS, Rel. Min. Castro Filho, j. 21.06. 2005, pub. DJU 01.08.2005 p. 443 ).

Não esquecendo que a nova concepção do contrato, sem desprezar totalmente a liberdade de contratar, prestigia a dignidade da pessoa humana ao proclamar que seu conteúdo deve observar os limites da função social dos contratos.
Da mesma forma, constata-se que a empresa ré agiu de forma abusiva, demonstrando falta de compromisso com os princípios básicos que devem nortear os contratos, como boa fé, transparência, dever de informação e confiança.
Quanto ao pedido de danos morais, podemos constatar que o ordenamento jurídico aplicável ao consumidor, visa amparar o cidadão para evitar injustiças e violação de princípios relevantes, principalmente quando o contrato se caracteriza como de adesão, porque, nestes é flagrante a vulnerabilidade do consumidor, em vista da discrepância de conhecimentos técnicos e econômicos entre as partes.
Não esquecendo que a nova concepção do contrato, sem desprezar totalmente a liberdade de contratar, prestigia a dignidade da pessoa humana ao proclamar que seu conteúdo deve observar os limites da função social dos contratos.
No caso em exame, não resta dúvida, que a requerente sofreu constrangimentos, desassossego, transtornos, aborrecimentos e desconforto, ao ter sua cobertura contratual de seguro saúde rescindida, por conta da conduta da empresa seguradora que agiu de forma iníqua, tendo a mesma sido surpreendida com esse fato, ficando sem guarida do plano de saúde.
Não se pode aceitar que práticas abusivas identificadas e condenadas na legislação consumerista continuem a ser exercitadas sem qualquer tipo de censura, o que vem ensejando os Tribunais a coibir tais atitudes com o reconhecimento do direito de indenização pelos danos morais suportados pelos usuários quanto aos serviços defeituosos fornecidos.
Quanto ao montante a ser fixado a título de danos morais é certo afirmar que o quantum da indenização pelo dano moral é fixado por critérios subjetivos aferidos pelo juiz.
O princípio da razoabilidade apenas recomenda que se observem certos parâmetros com fins de se evitar o enriquecimento ilícito.
Nesse sentido:
“O valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça, sendo certo que a indenização a esse título deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. Ademais, deve procurar desestimular o ofensor a repetir o ato.” (STJ, Quarta Turma, RESP 24727/SE, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 05/06/2000, p 174).
Assim, por tudo que acima foi exposto, e pelo que dos autos consta, julgo PROCEDENTE a ação para declarar a nulidade da cláusula 18, item 18.1 d, constante nas Condições Gerais do Seguro de Assistência Médica e/ou Hospitalar firmado entre a autora e SUL AMÉRICA SEGURO SAÚDE S/A, mantendo a obrigação da ré em prestar os serviços contratados pela autora, mediante a emissão dos boletos de pagamento do seguro de saúde da autora e declarando extinto o presente processo com análise de mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC. Arbitro ainda, a título de indenização por danos morais, em face da intensidade dos dissabores suportados pela autora a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente pelo INPC a partir do ajuizamento da ação e acrescido de juros de mora de 1% ao mês.
Condeno, ainda, a ré ao pagamento nas custas processuais e nos honorários advocatícios, que arbitro em 15% (quinze por cento) do valor da condenação atualizada, levando-se em conta do grau de zelo do profissional, o tempo exigido para o seu serviço e a complexidade da causa, nos termos do artigo 20 § 3º do CPC.
Autorizo o levantamento pela parte ré dos valores depositados, devendo apresentar os cálculos das diferenças das mensalidades do período dos depósitos para que a parte autora possa complementar os valores do reajuste na forma determinada pela ANS.
P.R.I.
Salvador, 13 de Julho de 2011.
MARIELZA BRANDÃO FRANCO
Juíza Titular

 

 

Fonte: DJE BA