Anulada decisão do juíz Argemiro de Azevedo Dutra da 1ª Vara Cível de Salvador

Publicado por: redação
30/01/2012 09:58 AM
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Inteiro teor da decisão:

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
José Cícero Landin Neto
PUBLICAÇÃO DE DESPACHOS E DECISÕES MONOCRÁTICAS
0004675-08.2011.8.05.0001Apelação
Apelante : Luciano de Jesus Fonseca
Advogado : Eduardo Lima Conceição (OAB: 30378/BA)
Apelado : Bv Financeira S/A Crédito Financiamento e Investimento
Advogado : Celso de Faria Monteiro (OAB: 138436/SP)
Advogado : Nilson Valois Coutinho Neto (OAB: 15126/BA)
A presente Apelação Cível foi interposta por LUCIANO DE JESUS FONSECA contra decisão do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara dos Feitos relativos às Relações de Consumo, Cíveis e Comerciais desta Comarca do Salvador que, nos autos da Ação Revisional de Contrato Bancário, ajuizada contra BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, ora apelado, julgou improcedente prima facie o pedido, com supedâneo no art. 285-A do CPC, ao fundamento de que inexiste abusividade nas cláusulas contratuais. Em suas razões recursais, o recorrente alegou preliminarmente que a matéria debatida não é unicamente de direito, motivo porque não poderia ter sido aplicada a sistemática do art. 285-A do CPC. Sustentou ainda: (a) a abusividade das taxas de juros contratuais, porque superiores a 12% ao ano; (b) a existência da mora creditoris por existência de onerosidade excessiva; (c) a ilegalidade da capitalização dos juros; (d) ilegalidade da correção monetária e de cumulada cobrança de comissão de permanência e correção monetária. Apoiado em tais razões, requereu fosse cassada a Sentença por impossibilidade de aplicação do referido art. 285-A do CPC com a posterior remessa dos autos ao juízo de origem para prosseguimento do feito. Em contrarrazões de fls. 28/86, o banco apelado, por sua vez, refutou todos os argumentos do recorrente, pugnando pela manutenção integral da Sentença. A Sentença hostilizada contém nulidade insanável que a vulnera absolutamente. Isto porque a utilização do regramento do art. 285-A do CPC exige o cumprimento de requisitos que afetam a validade do ato judicial e que culminam na nulidade absoluta do referido ato se não observados. Eis o teor do caput do citado artigo: "Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada" (negritou-se). Tal artigo trata daquilo que se convencionou designar de "julgamento de processos repetitivos", em que se conferiu ao juiz autorização para julgar improcedente prima facie (portanto, resolvendo o mérito) o pedido do autor, mediante a simples leitura da petição inicial e antes mesmo de citar a parte ré, desde que já tenha julgado anteriormente e no mesmo sentido "casos idênticos". É facilmente percebida a importância dos precedentes judiciais que servirão de paradigma e modelo para processos futuros em que se discutam as mesmas "teses jurídicas" enfrentadas nas ações anteriormente julgadas de forma idêntica. Alguns requisitos despontam, portanto, como necessários para que se tenha a aplicação do julgamento de mérito lastreado em "casos repetitivos". O primeiro requisito é que a matéria alegada na petição inicial seja unicamente de direito. Como enfatiza Fredie Didier Jr. (in Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento, vol. 1, Editora Juspodivm, 7ª edição, 2007, p.420), "trata-se de causa cuja matéria fática possa ser comprovada pela prova documental. É hipótese excepcional de julgamento antecipado da lide (art. 330, CPC), que passa a ser autorizado, também, antes da citação do réu, se a conclusão do magistrado é pela improcedência". Os professores Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (in Curso de Processo Civil: processo de conhecimento, vol. 2, Editora RT, 6ª edição, 2007, pp. 98/99) lembram que a aplicação deste artigo "somente é possível quando a matéria controvertida for unicamente de direito. Isto porque, envolvendo questão de fato, as particularidades do caso concreto poderão impor soluções diferentes, de modo que a conclusão lançada em um processo pode não servir para o outro". O segundo requisito é a exigência de que a "tese jurídica" ventilada na ação em curso tenha sido exatamente a mesma de outra ação em que se tenha julgado improcedente o pedido. O que se exige é que os "casos" sejam idênticos. E que sejam idênticos quanto ao direito, pois os fatos, em tal situação, não influenciarão o julgamento final, posto que irrelevantes para a convicção do julgador. Em outras palavras: ainda que os fatos tenham ocorrido da forma narrada pelo autor, o convencimento do juiz já estará devidamente formado quanto às "consequências jurídicas" dos mesmos. É preciso pormenorizar os casos utilizados como precedentes, não bastando afirmar que eles existem. Como lembra Jean Carlos Dias, citado por Fredie Didier Jr. (in Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento, vol. 1, Editora Juspodivm, 7ª edição, 2007, p.421), "o dispositivo não autoriza a simples juntada de uma cópia da sentença-tipo, ou seja uma cópia reprográfica da sentença já proferida, mas sim que seu teor, seu conteúdo, seja reaproveitado para solucionar a nova demanda". É preciso demonstrar que a ratio decidendi das sentenças-paradigmas sirvam à solução do caso em concreto posto em julgamento. A repetição dos paradigmas no bojo da própria Sentença, indicando o caso e a solução, além de se reproduzir o teor daquelas Sentenças antes prolatadas é indispensável para a validade do novo decisum. O autor, em eventual Recurso de Apelação, tem o direito de argumentar que o seu caso concreto não se amolde nas decisões tomadas como parâmetros, mas para isso precisa que tais precedentes estejam minuciosamente registrados na Sentença hostilizada. Ora, em decorrência da força conferida aos precedentes, é indispensável que eles estejam consignados na própria Sentença de improcedência prima facie, sob pena de nulidade absoluta. O douto Magistrado afirmou ter se utilizado da sistemática do art. 285-A do CPC, mas não apresentou os precedentes efetivamente julgados pelo juízo. Furtou-se de apontar os paradigmas descrevendo o caso e a solução, além de reproduzir o teor daquelas Sentenças antes prolatadas. Da leitura da Sentença hostilizada, não se pode extrair quais foram os casos precedentes que serviram de modelo para a sua prolação. À evidência está demonstrada a primeira mácula da Sentença hostilizada, pois os precedentes não foram consignados no decisum ora analisado. Como terceiro requisito, necessário para que se possa aplicar a regra do art. 285-A, está a necessidade de que não apenas um, mas pelo menos dois "casos idênticos" tenham sido julgados anteriormente, sendo certo que tais processos servirão como paradigma para a ação que será julgada a posteriori. Este requisito é um corolário lógico da expressão "outros casos idênticos" na redação do estudado artigo e seu cumprimento está intrinsecamente ligado ao cumprimento do requisito antecedente que, na hipótese vertente não foi observado no momento da prolação da Sentença. O quarto requisito que apenas será registrado aqui obter dictum: a Sentença do julgador, para permitir a extinção liminar com julgamento do mérito, precisará ser de improcedência e jamais de procedência. E tal improcedência precisa ser total, de modo que a eventual improcedência parcial não permite a solução da ação sem que se tenha a citação do réu. E isso se dá por uma razão muito simples: a "improcedência parcial" significa, em verdade, a "procedência parcial", o que, para acontecer, exige, por evidente, tenha o réu sido citado para apresentar a sua resposta ao pedido autoral. Ressalte-se ademais que os julgamentos paradigmas não necessariamente precisam ter sido de improcedência absoluta. O que importa é que a parte deles que eventualmente tenha julgado improcedente o pedido seja o único ponto agora discutido na ação posta para julgamento. Por tudo o quanto exposto, vislumbro que o douto Juiz de 1º grau, ao prolatar a Sentença de improcedência prima facie ora hostilizada, não obedeceu aos requisitos de validade indispensáveis insculpidos no art. 285-A do CPC, razão pela qual fica evidenciada a nulidade absoluta do referido ato judicial. Em sendo assim, decreto, de ofício, a nulidade da Sentença hostilizada, devolvendo os autos ao juízo de origem para o prosseguimento da ação originária, seja com a prolação de nova Sentença, desde que obedecidos os requisitos do art. 285-A do CPC, seja para intimar o réu para responder a demanda, sob as penalidades da lei, com o seguimento normal do processo. Publique-se para efeitos de intimação. Salvador, 23 de janeiro de 2012. JUIZ JATAHY FONSECA JÚNIOR - SUBSTITUINDO Relator

Salvador, 24 de janeiro de 2012

José Cícero Landin Neto
Relator