Anulada decisão da 9ª Vara de Família de Salvador por confronto direto com jurisprudência dominante do STJ

Publicado por: redação
19/07/2011 12:30 AM
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Inteiro teor da decisão:

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

AGRAVO DE INSTRUMENTO N.º00012554-06.2010.805.000-0 – SALVADORORIGEM DO PROCESSO: 9º VARA  DE FAMÍLIA,  SUCESSÕES, ÓRFÃOS INTERDITOS E AUSENTES

PROCESSO DE ORIGEM: 0172208-94.2008.805.0001 – ALIMENTOS

AGRAVANTE: SERGIO DE SIQUEIRA BERTOQUE

ADVOGADO: DR. THIERS RIBEIRO CHAGAS FILHO

AGRAVADO: DAVI ANDRADE RAYMUNDO BERTOQUE REPRESENTADO POR MARIA HENRIQUETA ANDRADE RAYMUNDO

ADVOGADAS: DRA. AINAH HOHENFELD ANGELINI NETA e DRA. ANA BEATRIZ LISBOA PEREIRA

RELATOR: DES. CLÉSIO RÔMULO CARRILHO ROSA

EMENTA:

ALIMENTOS PROVISÓRIOS. MODIFICAÇÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO RELEVANTE. DESOBEDIÊNCIA DO ART. 93, IX, DA CF.  RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

01. A fixação de alimentos provisórios deve ser feita com a devida acuidade, porquanto operada em fase em que a deficiência de informações sobre a real situação econômica das partes impera.

02. Recurso conhecido e provido.

DECISÃO

SÉRGIO DE SIQUEIRA BERTOQUE interpôs recurso de Agravo de Instrumento, atacando decisão proferida no Juízo de Direito da 9ª Vara de Família, Sucessões, Órfãos e Interditos, da Comarca de Salvador, que, em sede de Ação de Alimentos – Proc. n. 0172208-94.2008.805.0001, fixou os alimentos provisórios em dois salários mínimos, nos seguintes termos:

“1 – Cumpra-se com urgência o despacho de fls. 65v, observando-se o endereço fornecido às fls. 67;

2 –  Arbitro os alimentos provisórios em 02 salários mínimos a ser descontados dos vencimentos do requerido.

3 - Oficie-se(sic – fl. 04)

Irresignado com a decisão proferida, o Recorrente argúi a nulidade da decisão ora vergastada por ausência de fundamentação.

Alega ainda que não fora observado, in casu, o binômio regedor do dever de prestar alimentos, qual seja, necessidade.

Ao final, requer que seja atribuído efeito suspensivo ao presente recurso e, no mérito, que lhe seja dado provimento.

Recurso distribuído para Segunda Câmara Cível, cabendo-me, por sorteio, a função de relator.

Em decisão monocrática (fls. 83/84),  fora atribuído o efeito suspensivo requerido.

Apresentados Embargos de Declaração contra essa decisão, foram os mesmos rejeitados na decisão de fls.139/140.

Posteriormente, às fls. 99/103, foi apresentada pelo agravado e distribuída por dependência, a impugnação ao pedido de assistência judiciária formulado pelo agravante.

O agravado ofereceu contrarrazões, argumentado que o caráter precário  da decisão que concede alimentos provisórios, torna incabível a alegação de nulidade.

Alega ainda que a atribuição do efeito suspensivo ao decisum de primeiro grau se mostra desarrazoada por deixar um menor desassistido de seus direitos básicos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, podendo ser sucinta, não havendo necessidade de profunda fundamentação.

Afirma ademais que o agravante exerce o cargo de chefe da APA (Área de Proteção Ambiental) que lhe proporciona uma renda mensal aproximada de R$ 9.500,00 (nove mil reais) e que não é verídica  a alegação da qual o agravante teria dois filhos sob sua dependência econômica, uma vez que um deles é maior de idade e que ambos estudam em instituições públicas federais.

Argumenta ainda que as despesas do agravado chegam a um total mensal aproximado de R$ 2.333,97 (dois mil, trezentos e trinta e três reais e noventa e sete centavos) e que a despeito da representante do agravado perceber um salário de aproximadamente R$ 4.500,00 (quatro mil e quinhentos reais), arca sozinha com todas despesas de seus dois filhos, sendo um deles portador de deficiência neurológica desde o nascimento, dependendo de cuidados diários.

Por tais razões, requer a manutenção do decisum.

A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo conhecimento do recurso intesposto.

É O RELATÓRIO.

VOTO

Presentes os pressupostosextrínsecos e intrínsecos de admissibilidade recursal, impõe-se conhecimento do recurso.

Deveras, na decisão agravada, o juízo a quo não mencionou os fundamentos de fato e de direito em que se baseou.

A decisão de conceder ou revogar uma liminar, como antecipação da tutela, se funda em critérios próprios e pessoais de discricionariedade do Juiz que, atento ao disposto em lei, profere a decisão que entende cabível na espécie, somente sendo lícito ao Tribunal modificá-la em caso de evidente ilegalidade ou abusividade.

No caso sub judice a decisão que determinou o pagamento de alimentos provisórios em favor de autor de Ação de Alimentos  é nula por se tratar de julgado sem fundamentação. Afirma-se isto porque o pronunciamento judicial limitou-se a deferir a tutela perseguida, sem apresentar qualquer justificativa acerca dos motivos determinantes da conclusão apresentada. Neste sentido, veja-se o teor da decisão:

[…] Arbitro os alimentos provisórios em 02 salários mínimo a ser descontado dos vencimentos do requerido. Oficie-se. […] (trecho da decisão agravada constante da fl. 24)

Da leitura da decisão, não é possível identificar os fatos e fundamentos que convenceram o magistrado acerca da plausibilidade das alegações oferecidas pela parte autora .

A motivação das decisões judiciais é manifestação do próprio Estado Democrático de Direito.

Em verdade, o agente social do direito, como representante de parcela da autoridade desse estado, deve compreender que o ato processual por ele emanado com base no princípio do livre convencimento motivado também se submete ao estado de direito.

O artigo 93, IX, da Constituição Federal, exige que todas as decisões proferidas pelos órgãos do Poder Judiciário sejam fundamentadas, sob pena de nulidade :

A fundamentação das decisões do Poder Judiciário, tal como resulta da norma inserta no inciso IX do artigo 93 da Constituição, é condição absoluta de sua validade e, portanto, pressuposto da sua eficácia. Decisão que defere pedido liminar sem qualquer exposição sobre os motivos de tal convencimento é pronunciamento carente de fundamentação, razão pela qual deve ser anulada, por violar a garantia constitucional da fundamentação das decisões judiciais. Neste sentido, o STJ

Art. 93. […]

IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

[…].

A fundamentação das decisões do Poder Judiciário, tal como resulta da norma inserta no inciso IX do artigo 93 da Constituição, é condição absoluta de sua validade e, portanto, pressuposto da sua eficácia. Decisão que defere pedido liminar sem qualquer exposição sobre os motivos de tal convencimento é pronunciamento carente de fundamentação, razão pela qual deve ser anulada, por violar a garantia constitucional da fundamentação das decisões judiciais. Neste sentido, o STJ:

PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. TERCEIRO PREJUDICADO. CABIMENTO. SÚMULA 202/STJ. PROCESSO EXTINTO SEM O JULGAMENTO DO MÉRITO. ART. 515, § 3º, DO CPC. APLICAÇÃO POR ANALOGIA. LIMINAR. DEFERIMENTO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE DA DECISÃO. – De acordo com a Súmula nº 202 do STJ, “a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso”. – Aplica-se, por analogia, o art. 515, § 3º, do CPC, ao recurso ordinário em mandado de segurança, viabilizando, por conseguinte, a apreciação do mérito do writ, desde que este não tenha sido instruído com complexo conjunto de provas, a exigir detalhado exame. – Não obstante o art. 165 do CPC admita a motivação sucinta, tal concisão não se confunde com a ausência de fundamentação, inviabilizadora do amplo exercício do direito de defesa. – É nula a decisão concessiva de liminar que se limita a dizer estarem presentes os requisitos autorizadores da concessão, sem, no entanto, discorrer em que consiste o fumus boni iuris e qual o periculum in mora. Recurso provido. (STJ. RMS 25462 / RJ. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2007/0247038-2. 3ª – T. Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI. DJe 20/10/2008) (grifos não constantes do original)

PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE DO ACÓRDÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ARTS. 130 E 535 DO CPC. VIOLAÇÃO. OCORRÊNCIA. 1. É nulo o acórdão que, sem esclarecer os fundamentos jurídicos da solução adotada, se limita a confirmar a sentença recorrida. Violação dos arts. 130 e 535 do Código de Processo Civil. 2. Na sessão do último dia 20.09.2007, no julgamento do AgRg no AgRg no Ag 749.394/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, a Segunda Turma consignou que as decisões que simplesmente façam remissão aos fundamentos de outra ou de parecer do Ministério Público sem, ao menos, transcrevê-los, devem ser declaradas nulas, determinando-se o retorno dos autos para que novo julgamento seja proferido. 3. Necessário determinar-se o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que seja proferida nova decisão. Prejudicado o exame do mérito. 4. Recurso especial provido. (STJ. REsp 841823 / MS. RECURSO ESPECIAL. 2006/0071176-1. 2ª – T. Relator Ministro CASTRO MEIRA. DJ 09/11/2007 p. 240 )

DO EXPOSTO,

Assim, com fundamento no §1º-A do art. 557, do CPC, conheço e DOU PROVIMENTO AO RECURSO por estar a decisão agravada em confronto com jurisprudência dominante do STJ.

É como Voto.

Salvador, 18 de julho de 2011.

DES. CLÉSIO RÔMULO CARRILHO ROSA

RELATOR

 

Fonte: DJE Ba